O veículo de carregamento do valor gerado:
a proposição sempre, mas a essência da linguagem com origens diferentes
“Valer, para o pensamento clássico,
é primeiramente valer alguma coisa,
poder substituir essa coisa num processo de troca.
A moeda só foi inventada, os preços só foram fixados e só se modificam
na medida em que essa troca existe.
Ora, a troca é um fenômeno simples
apenas na aparência.
Com efeito, só se troca numa permuta,
quando cada um dos dois parceiros
reconhece um valor para aquilo que o outro possui.
Num sentido, é preciso, pois,
que as coisas permutáveis,
com seu valor próprio,
existam antecipadamente nas mãos de cada um,
para que a dupla cessão e a dupla aquisição
finalmente se produzam.
Mas, por outro lado,
- o que cada um come e bebe,
aquilo de que precisa para viver não tem valor
enquanto não o cede; - e aquilo de que não tem necessidade
é igualmente desprovido de valor
enquanto não for usado para adquirir
alguma coisa de que necessite.
Em outras palavras,
para que, numa troca,
uma coisa possa representar outra,
é preciso que elas existam
já carregadas de valor;
e, contudo,
o valor só existe
no interior da representação
(atual ou possível),
isto é, no interior da troca ou da permutabilidade.
“Daí duas possibilidades simultâneas de leitura:
no pensamento clássico
antes de 1775
no pensamento moderno
depois de 1825
1 uma analisa o valor
no ato mesmo da troca,
no ponto de cruzamento
entre o dado e o recebido;
- A primeira dessas duas leituras corresponde a uma análise que coloca e encerra
toda a essência da linguagem no interior da proposição;
3 no primeiro caso, com efeito, a linguagem encontra seu lugar de possibilidade numa atribuição assegurada pelo verbo – isto é, por esse elemento da linguagem em recuo relativamente a todas as palavras mas que as reporta umas às outras; o verbo, tornando possíveis todas as palavras da linguagem a partir de seu liame proposicional, corresponde à troca que funda, como um ato mais primitivo que os outros, o valor das coisas trocadas e o preço pelo qual são cedidas;
2 outra analisa-o
como anterior à troca
e como condição primeira
para que esta possa ocorrer.
- a outra, a uma análise que descobre essa mesma essência da linguagem do lado das designações primitivas – linguagem de ação ou raiz;
4 a outra forma de análise, a linguagem está enraizada
- fora de si mesma e como que
- na natureza, ou nas
- analogias das coisas;
a raiz, o primeiro grito que dera nascimento às palavras antes mesmo que a linguagem tivesse nascido, corresponde à formação imediata do valor, antes da troca e das medidas recíprocas da necessidade.”
As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault





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