Cap. I. Las Meninas

Capítulo I. Las Meninas

Las meninas, de Diego Velázquez, 1656;
óleo sobre tela; Museu do Prado,
Madrid, Espanha

I

O pintor está ligeiramente afastado do quadro. Lança um olhar em direção ao modelo; talvez se trate de acrescentar um último toque, mas é possível também que o primeiro traço não tenha ainda sido aplicado. O braço que segura o pincel está dobrado para a esquerda, na direção da palheta; permanece imóvel, por um instante, entre a tela e as cores, Essa mão hábil está pendente do olhar; e o olhar, em troca, repousa sobre o gesto suspenso. Entre a fina ponta do pincel e o gume do olhar, o espetáculo vai liberar seu volume. Não sem um sistema sutil de evasivas. 

Distanciando-se um pouco, o pintor colocou-se ao lado da obra na qual trabalha. Isso quer dizer que, para o espectador que no momento olha, ele está à direita de seu quadro, o qual ocupa toda a extremidade esquerda. A esse mesmo espectador o quadro volta as costas: dele só se pode perceber o reverso, com a imensa armação que o sustenta. 

O pintor, em contrapartida, é perfeitamente visível em toda a sua estatura; de todo modo, ele não está encoberto pela alta tela que, talvez, irá absorvê-lo logo em seguida, quando, dando um passo em sua direção, se entregará novamente a seu trabalho; sem dúvida, nesse mesmo instante, ele acaba de aparecer aos olhos do espectador, surgindo dessa espécie de grande gaiola virtual que a superfície que ele está pintando projeta para trás. 

Podemos vê-Io agora, num instante de pausa, no centro neutro dessa oscilação. Seu talhe escuro, seu rosto claro são meios-termos entre o visível e o invisível: saindo dessa tela que nos escapa, ele emerge aos nossos olhos; mas quando, dentro em pouco, der um passo para a direita, furtando-se aos nossos olhares, achar-se-á colocado bem em face da tela que está pintando; entrará nessa região onde seu quadro, negligenciado por um instante, se lhe vai tornar de novo visível, sem sombra nem reticência. 

Como se o pintor não pudesse ser ao mesmo tempo visto no quadro em que está representado e ver aquele em que se aplica a representar alguma coisa. Ele reina no limiar dessas duas visibilidades incompatíveis. O pintor olha, o rosto ligeiramente virado e a cabeça inclinada para o ombro. 

Fixa um ponto invisível, mas que nós, espectadores, podemos facilmente determinar, pois que esse ponto somos nós mesmos: nosso corpo, nosso rosto, nossos olhos. 

O espetáculo que ele observa é, portanto, duas vezes invisível: uma vez que não é representado no espaço do quadro e uma vez que se situa precisamente nesse ponto cego, nesse esconderijo essencial onde nosso olhar se furta a nós mesmos no momento em que olhamos. 

E, no entanto, como poderíamos deixar de ver essa invisibilidade, que está aí sob nossos olhos, já que ela tem no próprio quadro seu sensível equivalente, sua figura selada? 

Poder-se-ia, com efeito, adivinhar o que o pintor olha, se fosse possível lançar os olhos sobre a tela a que se aplica; desta, porém, só se distingue a textura, os esteios na horizontal e, na vertical, o oblíquo do cavalete. 

O alto retângulo monótono que ocupa toda a parte esquerda do quadro real e que figura o verso da tela representada reconstituiu, sob as espécies de uma superfície, a invisibilidade em profundidade daquilo que o artista contempla: este espaço em que nós estamos, que nós somos. 

Dos olhos do pintor até aquilo que ele olha, está traçada uma linha imperiosa que nós, os que olhamos, não poderíamos evitar: ela atravessa o quadro real e alcança, à frente da sua superfície, o lugar de onde vemos o pintor que nos observa; esse pontilhado nos atinge infalivelmente e nos liga à representação do quadro. 

Aparentemente, esse lugar é simples; constitui-se de pura reciprocidade: olhamos um quadro de onde um pintor, por sua vez, nos contempla. Nada mais que um face-a-face, olhos que se surpreendem, olhares retos que, em se cruzando, se superpõem. E, no entanto, essa tênue linha de visibilidade envolve, em troca, toda uma rede complexa de incertezas, de trocas e de evasivas. 

O pintor só dirige os olhos para nós na medida em que nos encontramos no lugar do seu motivo. Nós, espectadores, estamos em excesso. Acolhidos sob esse olhar, somos por ele expulsos, substituídos por aquilo que desde sempre se encontrava lá, antes de nós: o próprio modelo. 

Mas, inversamente, o olhar do pintor, dirigido para fora do quadro, ao vazio que lhe faz face, aceita tantos modelos quantos espectadores lhe apareçam; nesse lugar preciso mas indiferente, o que olha e o que é olhado permutam-se incessantemente. Nenhum olhar é estável, ou antes, no sulco neutro do olhar que traspassa a tela perpendicularmente, o sujeito e o objeto, o espectador e o modelo invertem seu papel ao infinito. 

E, na extremidade esquerda do quadro, a grande tela virada exerce aí sua segunda função: obstinadamente invisível, impede que seja alguma vez determinável ou definitivamente estabelecida a relação dos olhares. A fixidez opaca que ela faz reinar num lado torna para sempre instável o jogo das metamorfoses que, no centro, se estabelece entre o espectador e o modelo. 

Porque só vemos esse reverso, não sabemos quem somos nem o que fazemos. Somos vistos ou vemos? O pintor fixa atualmente um lugar que, de instante a instante, não cessa de mudar de conteúdo, de forma, de rosto, de identidade. 

Mas a imobilidade atenta de seus olhos remete a uma outra direção, que eles já seguiram frequentes vezes e que breve, sem dúvida alguma, vão retomar: a da tela imóvel sobre a qual se traça, está talvez traçado, desde muito tempo e para sempre, um retrato que jamais se apagará.

 De sorte que o olhar soberano do pintor comanda um triângulo virtual, que define em seu percurso esse quadro de um quadro: 

  • no vértice – único ponto visível – os olhos do artista; 
  • na base, de um lado, o lugar invisível do modelo, 
  • do outro, a figura provavelmente esboçada na tela virada. 

No momento em que colocam o espectador no campo de seu olhar, os olhos do pintor captam-no, constrangem-no a entrar no quadro, designam-lhe um lugar ao mesmo tempo privilegiado e obrigatório, apropriam-se de sua luminosa e visível espécie e a projetam sobre a superfície inacessível da tela virada. 

Ele vê sua invisibilidade tornada visível ao pintor e transposta em uma imagem definitivamente invisível a ele próprio. 

Surpresa que é multiplicada e tornada ainda mais inevitável por um estratagema marginal. Na extremidade direita, o quadro recebe sua luz de uma janela representada segundo uma perspectiva muito curta; dela apenas se visualiza o vão; de sorte que o fluxo de luz que ela espalha largamente banha ao mesmo tempo, com a mesma generosidade, dois espaços vizinhos, entrecruzados, mas irredutíveis: 

  • a superfície da tela, com o volume que ela representa (isto é, o ateliê do pintor, ou a sala em que instalou seu cavalete), 
  • e, à frente dessa superfície, o volume real que o espectador ocupa (ou então o lugar irreal do modelo). 

E, percorrendo a sala da direita para a esquerda, a vasta luz dourada impele ao mesmo tempo o espectador em direção ao pintor e o modelo em direção à tela; é ela também que, iluminando o pintor, torna-o visível ao espectador e faz brilhar como linhas de ouro, aos olhos do modelo, a moldura da tela enigmática, onde sua imagem, transposta, vai se achar encerrada. 

Esta janela encantoada, parcial, apenas indicada, libera uma luz inteira e mista que serve de lugar-comum à representação. 

Ela equilibra, na outra extremidade do quadro, a tela invisível: 

  • assim como esta, virando as costas aos espectadores, se redobra contra o quadro que a representa e forma, pela superposição de seu reverso visível sobre a superfície do quadro que a contém, o lugar, para nós inacessível, onde cintila a Imagem por excelência; 
  • assim a janela, pura abertura, instaura um espaço tão manifesto quanto o outro é oculto; tão comum ao pintor, às personagens, aos modelos, aos espectadores quanto o outro é solitário (pois ninguém o olha, nem mesmo o pintor). 

Da direita, derrama-se por uma janela invisível o puro volume de uma luz que torna visível toda representação; 

à esquerda, estende-se a superfície que encobre, do outro lado de sua textura demasiado visível, a representação que ela contém. 

Inundando a cena (quero dizer, tanto a sala quanto a tela, a sala representada na tela e a sala onde a tela está colocada), a luz envolve as personagens e os espectadores, impelindo-os, sob o olhar do pintor, em direção ao lugar onde seu pincel os vai representar. 

Esse lugar, porém, nos é recusado. 

Olhamo-nos olhados pelo pintor e tornados visíveis aos seus olhos pela mesma luz que no-lo faz ver. E, no momento em que vamos nos apreender transcritos por sua mão como num espelho, deste não podemos surpreender mais que o insípido reverso. O outro lado de um reflexo. 

Ora, exatamente em face dos espectadores – de nós mesmos – sobre a parede que constitui o fundo da sala, o autor representou uma série de quadros; e eis que, entre todas essas telas suspensas, uma dentre elas brilha com um clarão singular. Sua moldura é mais larga, mais sombria que a das outras; uma fina linha branca, no entanto, a duplica interiormente, difundindo sobre toda a sua superfície uma luz dificilmente determinável; pois não vem de parte alguma senão de um espaço que lhe seria interior. 

Nessa luz estranha aparecem duas silhuetas e, acima delas, um pouco para trás, uma pesada cortina de púrpura. Os outros quadros só dão a ver algumas manchas mais pálidas no limite de uma noite sem profundeza. Esse, ao contrário, abre-se para um espaço em recuo onde formas reconhecíveis se dispõem numa claridade que só a ele pertence. 

Entre todos esses elementos destinados a oferecer representações, mas que as contestam, as recusam, as esquivam por sua posição ou sua distância, esse é o único que funciona com toda a honestidade e que dá a ver o que deve mostrar. A despeito de seu distanciamento, a despeito da sombra que o envolve. 

Mas não é um quadro: é um espelho. 

Ele oferece enfim esse encantamento do duplo, que tanto as pinturas afastadas quanto a luz do primeiro plano com a tela irônica recusavam. 

De todas as representações que o quadro representa, ele é a única visível; mas ninguém o olha. Em pé ao lado de sua tela, a atenção toda absorvida pelo seu modelo, o pintor não pode ver esse espelho que brilha suavemente atrás dele. 

As outras personagens do quadro estão, na maioria, voltadas também elas para o que se deve passar à frente – para a clara invisibilidade que margeia a tela, para esse átrio de luz, onde seus olhares têm para ver aqueles que os vêem, e não para essa cavidade sombria pela qual se fecha o quarto onde estão representadas. 

Há, com efeito, algumas cabeças que se oferecem de perfil: nenhuma, porém, suficientemente virada para olhar, no fundo da sala, esse espelho desolado, pequeno retângulo brilhante que nada mais é senão visibilidade, mas sem nenhum olhar capaz de apossar-se dela, torná-Ia atual e comprazer-se no fruto, subitamente amadurecido, de seu espetáculo. 

É preciso reconhecer que essa indiferença só se iguala à do espelho. Com efeito, este nada reflete daquilo que se encontra no mesmo espaço que ele: nem o pintor, que lhe volta as costas, nem as personagens no centro da sala. Em sua clara profundidade, não é o visível que ele fita. 

Na pintura holandesa, era tradição que os espelhos desempenhassem um papel de reduplicação: repetiam o que era dado uma primeira vez no quadro, mas no interior de um espaço irreal, modificado, estreitado, recurvo. Ali se via a mesma coisa que na primeira instância do quadro, porém decomposta e recomposta segundo uma outra lei. 

Aqui o espelho nada diz do que já foi dito. Sua posição, entretanto, é quase central: sua borda superior está exatamente sobre a linha que reparte em duas a altura do quadro, ocupa sobre a parede do fundo (ao menos sobre a parte visível desta) uma posição mediana; deveria, pois, ser atravessado pelas mesmas linhas perspectivas que o próprio quadro; poder-se-ia esperar que um mesmo ateliê, um mesmo pintor, uma mesma tela nele se dispusessem segundo um espaço idêntico; poderia ser o duplo perfeito. 

Ora, ele não faz ver nada do que o próprio quadro representa. Seu olhar imóvel vai captar à frente do quadro, nessa região necessariamente invisível que forma sua face exterior, as personagens que ali estão dispostas. 

Em vez de girar em torno de objetos visíveis, esse espelho atravessa todo o campo da representação, negligenciando o que aí poderia captar, e restitui a visibilidade ao que permanece fora de todo olhar. 

Mas essa invisibilidade que ele supera não é a do oculto: não contorna o obstáculo, não desvia a perspectiva, endereça-se ao que é invisível ao mesmo tempo pela estrutura do quadro e por sua existência como pintura. 

O que nele se reflete é o que todas as personagens da tela estão fixando, o olhar reto diante delas; é, pois, o que se poderia ver, se a tela se prolongasse para a frente, indo mais para baixo, até envolver as personagens que servem de modelos ao pintor. Mas é também, já que a tela se interrompe ali, dando a ver o pintor e seu ateliê, o que está exterior ao quadro, na medida em que ele é quadro, isto é, fragmento retangular de linhas e cores, encarregado de representar alguma coisa aos olhos de todo espectador possível. 

No fundo da sala, ignorado por todos, o espelho inesperado faz brilhar as figuras que o pintor olha (o pintor e sua realidade representada, objetiva, de pintor trabalhando); mas também as figuras que olham o pintor (nessa realidade material que as linhas e as cores depositaram sobre a tela). 

Estas figuras são, uma e outra, igualmente inacessíveis, mas de modo diferente: a primeira, por um efeito de composição que é próprio ao quadro; a segunda, pela lei que preside à existência mesma de todo quadro em geral. 

Aqui, o jogo da representação consiste em conduzir essas duas formas de invisibilidade uma ao lugar da outra, numa superposição instável – e em restituí-Ias logo à outra extremidade do quadro – a esse pólo que é o mais altamente representado: o de uma profundidade de reflexo na reentrância de uma profundidade de quadro. 

O espelho assegura uma metátese da visibilidade que incide ao mesmo tempo sobre o espaço representado no quadro e sua natureza de representação; faz ver, no centro da tela, aquilo que, do quadro, é duas vezes necessariamente invisível. 

Estranha maneira de aplicar ao pé da letra, mas invertendo-o, o conselho que o velho Pachero dera, ao que parece, ao seu aluno, quando trabalhava no ateliê de Sevilha: 

“A imagem deve sair da moldura.”

 

 II

Mas talvez seja tempo de nomear enfim essa imagem que aparece no fundo do espelho e que o pintor contempla à frente do quadro. Talvez valha a pena fixar de vez a identidade das personagens presentes ou indicadas, para não nos atrapalharmos infinitamente nestas designações flutuantes, um pouco abstratas, sempre suscetíveis de equívocos e de desdobramentos: “o pintor”, “as personagens”, “os espectadores”, “as imagens”. 

Em vez de prosseguir sem fim numa linguagem fatalmente inadequada ao visível, bastaria dizer 

  • que Velásquez compôs um quadro; que nesse quadro ele se representou a si mesmo no seu ateliê, ou num salão do Escorial, 
  • a pintar duas personagens que a infanta Margarida vem contemplar, 
  • rodeada de aias, 
  • de damas de honor, 
  • de cortesãos 
  • e de anões; 
  • que a esse grupo pode-se muito precisamente atribuir nomes: a tradição reconhece 
  • aqui dona Maria Agustina Sarmiente, 
  • ali, Nieto, 
  • no primeiro plano, Nicolaso Pertusato, bufão italiano. 

Bastaria acrescentar que as duas personagens que servem de modelo ao pintor não são visíveis, ao menos diretamente; mas que podemos distingui- Ias num espelho; que se trata, sem dúvida, 

  • do rei Filipe IV 
  • e de sua esposa Mariana. 

Esses nomes próprios constituiriam indícios úteis evitariam designações ambíguas; eles nos diriam, em todo o caso, o que o pintor olha e, com ele, a maioria das personagens do quadro. 

Mas a relação da linguagem com a pintura é uma relação infinita. Não que a palavra seja imperfeita e esteja, em face do visível, num déficit que em vão se esforçaria por recuperar. 

São irredutíveis uma ao outro: 

  • por mais que se diga o que se vê, 
    • o que se vê não se aloja jamais no que se diz, 
  • e por mais que se faça ver o que se está dizendo por imagens, metáforas, comparações, 
    • o lugar onde estas resplandecem não é aquele que os olhos descortinam, 
    • mas aquele que as sucessões da sintaxe definem. 

Ora, o nome próprio, nesse jogo, não passa de um artifício: 

  • permite mostrar com o dedo, quer dizer, fazer passar sub-repticiamente 
    • do espaço onde se fala 
    • para o espaço onde se olha, 
  • isto é, ajustá-los comodamente um sobre o outro como se fossem adequados. 

Mas, se se quiser manter aberta a relação entre a linguagem e o visível, se se quiser falar não de encontro a, mas a partir de sua incompatibilidade, de maneira que se permaneça o mais próximo possível de uma e de outro, é preciso então pôr de parte os nomes próprios e meter-se no infinito da tarefa. 

É, talvez, por intermédio dessa linguagem nebulosa, anônima, sempre meticulosa e repetitiva, porque demasiado ampla, que a pintura, pouco a pouco, acenderá suas luzes. 

É preciso, pois, fingir não saber quem se refletirá no fundo do espelho e interrogar esse reflexo ao nível de sua existência. 

De início, ele é o verso da grande tela representada à esquerda. O verso ou, antes, a face dianteira, pois que mostra de frente o que ela, por sua posição, esconde. 

Ademais, opõe-se à janela e a reforça. Como ela, é um lugar-comum ao quadro e ao que lhe é exterior. 

  • A janela, porém, opera pelo movimento contínuo de uma efusão que, da direita para a esquerda, agrega às personagens atentas, ao pintor, ao quadro, o espetáculo que contemplam; 
  • já o espelho, por um movimento violento, instantâneo e de pura surpresa, vai buscar, à frente do quadro, aquilo que é olhado mas não visível, a fim de, no extremo da profundidade fictícia, torná-lo visível mas indiferente a todos os olhares. 

O pontilhado imperioso que está traçado entre o reflexo e o que ele reflete corta perpendicularmente o fluxo lateral da luz. 

Enfim – e é a terceira função desse espelho – ele põe em paralelo uma porta que, como ele, se abre na parede do fundo. 

Também ela recorta um retângulo claro, cuja luz fosca não se irradia pela sala. Não passaria de uma placa dourada, não estivesse ela aberta para fora através de um batente esculpido, da curva de uma cortina e da sombra de vários degraus. Aí começa um corredor; mas, em vez de se perder em meio à obscuridade, ele se dissipa num brilho amarelo, cuja luz, sem entrar, rodopia em tomo de si mesma e repousa. 

Sobre esse fundo, ao mesmo tempo próximo e sem limite, um homem destaca sua alta silhueta; ele é visto de perfil; com uma das mãos retém o peso de um cortinado; seus pés estão pousados sobre dois degraus diferentes; tem o joelho dobrado. Talvez vá entrar na sala; talvez se limite a espiar o que se passa no interior, contente de surpreender sem ser observado. 

Tal como o espelho, fixa o verso da cena: tanto quanto ao espelho, ninguém lhe presta atenção. 

Não se sabe donde vem; pode-se supor que, seguindo por incertos corredores, contornou a sala onde as personagens estão reunidas e onde trabalha o pintor; talvez estivesse, há pouco, também ele à frente da cena, na região invisível que é contemplada por todos os olhos do quadro. Como as imagens que se distinguem no fundo do espelho, é possível que ele seja um emissário desse espaço evidente e escondido. 

Há, no entanto, uma diferença: 

  • ele está ali em carne e osso; surgiu de fora, no limiar da área representada; ele é indubitável – não um reflexo provável, mas uma irrupção. 
  • O espelho, fazendo ver, para além mesmo dos muros do ateliê, o que se passa à frente do quadro, faz oscilar, na sua dimensão sagital, o interior e o exterior. 

Com um pé sobre o degrau e o corpo inteiramente de perfil, o visitante ambíguo entra e sai ao mesmo tempo, num balancear imóvel. Ele repete, sem sair do lugar, mas na realidade sombria de seu corpo, o movimento instantâneo das imagens que atravessam a sala, penetram no espelho, nele se refletem e dele ressaltam como espécies visíveis, novas e idênticas. Pálidas, minúsculas, essas silhuetas no espelho são recusadas pela alta e sólida estatura do homem que surge no vão da porta. 

Cumpre, no entanto, retomar do fundo do quadro em direção à frente da cena; é preciso abandonar esse circuito cuja voluta se acaba de percorrer. 

Partindo do olhar do pintor que, à esquerda, constitui como que um centro deslocado, distingue-se primeiro o reverso da tela, depois os quadros expostos, com o espelho no centro, a seguir a porta aberta, novos quadros, cuja perspectiva, porém, muito aguda, só deixa ver as molduras em sua densidade, enfim, à extremidade direita a janela, ou, antes, a fenda por onde se derrama a luz. 

Essa concha em hélice oferece todo o ciclo da representação: o olhar, a palheta e o pincel, a tela inocente de signos (são os instrumentos materiais da representação), os quadros, os reflexos, o homem real (a representação acabada, mas como que liberada de seus conteúdos ilusórios ou verdadeiros que lhe são justapostos); depois, a representação se dilui: só se vêem as molduras e essa luz que, do exterior, banha os quadros, os quais, contudo, devem em troca reconstituir à sua própria maneira, como se ela viesse de outro lugar, atravessando suas molduras de madeira escura. E essa luz, vemo-la, com efeito, no quadro, parecendo emergir no interstício da moldura; e de lá ela alcança a fronte, as faces, os olhos, o olhar do pintor que segura numa das mãos a palheta e, na outra, o fino pincel… 

Assim se fecha a voluta, ou melhor, por essa luz, ela se abre. Essa abertura não é mais, como no fundo, uma porta que se abriu; é a própria amplitude do quadro, e os olhares que por ela passam não são de um visitante longínquo. 

O friso que ocupa o primeiro e o segundo planos do quadro representa – se se incluir o pintor – oito personagens. Cinco delas, a cabeça mais ou menos inclinada, virada ou abaixada, olham na direção perpendicular do quadro. 

O centro do grupo é ocupado pela pequena infanta, com seu amplo vestido cinza e rosa. A princesa vira a cabeça para a direita do quadro, enquanto seu busto e os grandes folhos do vestido pendem ligeiramente para a esquerda; o olhar, porém, dirige-se aprumado na direção do espectador que se acha em face do quadro. 

Uma linha mediana que dividisse a tela em duas alas iguais passaria entre os dois olhos da criança. Seu rosto está a um terço da altura total do quadro. De sorte que aí reside, sem dúvida, o tema principal da composição; aí, o objeto mesmo dessa pintura. 

Como que para prová-lo e melhor sublinhá-lo, o autor recorreu a uma figura tradicional: ao lado da personagem principal, colocou outra, ajoelhada, que a olha. Como um ofertante em prece, como o Anjo saudando a Virgem, uma governanta de joelhos estende as mãos para a princesa. Seu rosto se recorta num perfil perfeito. Está à altura do da criança. A aia olha para a princesa e só para ela. 

Um pouco mais à direita, outra dama de honor, voltada também para a infanta, ligeiramente inclinada acima dela mas com os olhos claramente dirigidos para a frente, lá onde já olham o pintor e a princesa. 

Enfim, dois grupos de duas personagens: um, em recuo; outro, composto de anões, no primeiro plano. Em cada par, uma personagem olha em frente, a outra à direita ou à esquerda. Por sua posição e por sua proporção, esses dois grupos se correspondem e se emparelham: 

  • atrás, os cortesãos (a mulher, à esquerda, olha para a direita); 
  • à frente, os anões (o rapaz que está na extremidade direita olha para o interior do quadro). 

Esse conjunto de personagens assim dispostas pode constituir, conforme a atenção que se dê ao quadro ou o centro de referência que se escolha, duas figuras. 

Uma seria um grande X; 

  • no ponto superior esquerdo estaria o olhar do pintor 
  • e, à direita, o do cortesão; 
  • na ponta inferior, do lado esquerdo, está o canto da tela representada de costas (mais exatamente, o pé do cavalete); 
  • do lado direito, o anão (com o calçado deposto sobre o dorso do cão). 

No cruzamento dessas duas linhas, no centro do X, o olhar da infanta. 

A outra figura seria antes a de uma vasta curva; 

  • suas duas pontas seriam determinadas pelo pintor à esquerda e pelo cortesão à direita – extremidades altas e recuadas; 
  • o recôncavo, bem mais aproximado, coincidiria com o rosto da princesa e com o olhar que a aia lhe dirige. 

Essa tênue linha desenha uma concha que, ao mesmo tempo, encerra e libera, no meio do quadro, a localização do espelho. 

Há, pois, dois centros que podem organizar o quadro, conforme a atenção do espectador divague e se prenda aqui ou ali. 

A princesa mantém-se de pé no meio de uma cruz de Santo André, que gira em torno dela com o turbilhão dos cortesãos, damas de honor, animais e bufões. 

Mas essa rotação é fixa. Fixa por um espetáculo que seria absolutamente invisível se essas mesmas personagens, subitamente imóveis, não oferecessem, como que no vão de uma taça, a possibilidade de olhar no fundo de um espelho, o dúplice imprevisto de sua contemplação. 

No sentido da profundidade, a princesa se superpõe ao espelho; 

no da altura, é o reflexo que se superpõe ao rosto. Mas a perspectiva os torna muito próximos um do outro. 

Ora, cada um deles emana uma linha inevitável; 

  • uma, saída do espelho, transpõe toda a espessura representada (e mesmo além dela, já que o espelho perfura a parede do fundo e faz nascer atrás dela um outro espaço); 
  • a outra é mais curta; vem do olhar da criança e só atravessa o primeiro plano. 

Essas duas linhas sagitais são convergentes, segundo um ângulo muito agudo, e o ponto de seu encontro, saindo da tela, se fixa à frente do quadro, mais ou menos lá de onde o olhamos. Ponto duvidoso, pois que não o vemos; ponto, porém, inevitável e perfeitamente definido, pois que é prescrito por essas duas figuras mestras e confirmado ainda por outros pontilhados adjacentes que nascem do quadro e que também dele escapam. 

Que há, enfim, nesse lugar perfeitamente inacessível, porquanto exterior ao quadro, mas prescrito por todas as linhas de sua composição? 

Que espetáculo é esse, quem são esses rostos que se refletem primeiro no fundo das pupilas da infanta, depois dos cortesãos e do pintor e, finalmente, na claridade longínqua do espelho? 

Mas a questão logo se desdobra: 

  • o rosto que o espelho reflete é igualmente aquele que o contempla; 
  • o que todas as personagens do quadro olham são também as personagens a cujos olhos elas são oferecidas como uma cena a contemplar; 
  • o quadro como um todo olha a cena para a qual ele é, por sua vez, uma cena. 

Pura reciprocidade que manifesta o espelho que olha e é olhado, e cujos dois momentos são desprendidos nos dois ângulos do quadro: 

  • à esquerda a tela virada, pela qual o ponto exterior se torna puro espetáculo; 
  • à direita o cão estirado, único elemento do quadro que não olha nem se mexe, porque ele, com seus fortes relevos e a luz que brinca em seus pelos sedosos, só é feito para ser um objeto a ser olhado. 

O primeiro olhar lançado ao quadro nos ensinou de que é constituído esse espetáculo-de-olhares. 

São os soberanos. 

Adivinhamo-los já no olhar respeitoso da assistência, no espanto da criança e dos anões. Reconhecemo-los, no fundo do quadro, nas duas pequenas silhuetas que o espelho reflete. Em meio a todos esses rostos atentos, a todos esses corpos ornamentados, eles são a mais pálida, a mais irreal, a mais comprometida de todas as imagens; um movimento, um pouco de luz bastariam para fazê-los desvanecer-se. 

De todas as personagens representadas, elas são também as mais desprezadas, pois ninguém presta atenção a esse reflexo que se esgueira por trás de todo o mundo e se introduz silenciosamente por um espaço insuspeitado; na medida em que são visíveis, são a forma mais frágil e mais distante de toda realidade. 

Inversamente, na medida em que, residindo no exterior do quadro, se retiraram para uma invisibilidade essencial, ordenam em torno delas toda a representação; 

  • é diante delas que as coisas estão, é para elas que se voltam, é a seus olhos que se mostra a princesa em seu vestido de festa; 
  • da tela virada à infanta e desta ao anão que brinca na extremidade direita, desenha-se uma curva (ou então, abre-se o braço inferior do X) para ordenar em relação a eles toda a disposição do quadro e fazer aparecer, assim, o verdadeiro centro da composição, ao qual o olhar da infanta e a imagem no espelho estão finalmente submetidos. 

Esse centro é simbolicamente soberano na sua particularidade histórica, já que é ocupado pelo rei Filipe IV e sua esposa. 

Mas, sobretudo, ele o é pela tríplice função que ocupa em relação ao quadro. 

Nele vêm superpor-se exatamente 

  • o olhar do modelo no momento em que é pintado, 
  • o do espectador que contempla a cena 
  • e o do pintor no momento em que compõe seu quadro (não o que é representado, mas o que está diante de nós e do qual falamos). 

Essas três funções “olhantes” confundem-se em um ponto exterior ao quadro: isto é, ideal em relação ao que é representado, mas perfeitamente real, porquanto é a partir dele que se torna possível a representação; nessa realidade mesma, ele não pode deixar de ser invisível. E, contudo, essa realidade é projetada no interior do quadro – projetada e difratada em três figuras que correspondem às três funções desse ponto ideal e real. 

São elas: 

  • à esquerda, o pintor com sua palheta na mão (autoretrato do autor do quadro); 
  • à direita o visitante, com um pé sobre o degrau, prestes a entrar na sala; ele capta ao revés toda a cena, mas vê de frente o par real, que é o próprio espetáculo; 
  • no centro, enfim, o reflexo do rei e da rainha, ornamentados, imóveis, na atitude de pacientes modelos. .

Tal reflexo mostra ingenuamente, e na sombra, aquilo que todos olham no primeiro plano. Restitui, como que por encanto, o que falta a cada olhar: 

  • ao do pintor, o modelo que é recopiado no quadro pelo seu duplo representado; 
  • ao do rei, seu retrato que se completa nesse lado da tela que ele não pode distinguir do lugar em que está; 
  • ao do espectador, o centro real da cena, cujo lugar ele assumiu como que por intrusão. 

Mas talvez essa generosidade do espelho seja simulada; talvez esconda tanto ou mais do que manifesta. O lugar onde impera o rei com sua esposa é também o do artista e o do espectador: no fundo do espelho poderiam aparecer – deveriam aparecer – o rosto anônimo do transeunte e o de Velásquez. Pois a função desse reflexo é atrair para o interior do quadro o que lhe é intimamente estranho: o olhar que o organizou e aquele para o qual ele se desdobra. 

Mas, por estarem presentes no quadro, à direita e à esquerda, o artista e o visitante não podem estar alojados no espelho: 

do mesmo modo o rei aparece no fundo do espelho, na medida mesma em que não faz parte do quadro. 

Na grande voluta que percorria o perímetro do ateliê, desde o olhar do pintor, sua palheta e sua mão suspensa, até os quadros terminados, a representação nascia, completava-se para se desfazer novamente na luz; o ciclo era perfeito. 

Em contrapartida, as linhas que atravessam a profundidade do quadro são incompletas; falta, a todas, uma parte de seu trajeto. 

Essa lacuna é devida à ausência do rei – ausência que é um artifício do pintor. Mas esse artifício recobre e designa um lugar vago que é imediato: o do pintor e do espectador quando olham ou compõem o quadro. 

É que, nesse quadro talvez, como em toda representação de que ele é, por assim dizer, a essência manifestada, 

  • a invisibilidade profunda do que se vê é solidária 
  • com a invisibilidade daquele que vê – malgrado os espelhos, os reflexos, as imitações, os retratos. 

Em torno da cena 

  • estão depositados os signos e as formas sucessivas da representação; 
  • mas a dupla relação 
    • da representação com o modelo e com o soberano, 
    • com o autor e com aquele a quem ela é dada em oferenda, 
  • essa relação é necessariamente interrompida. 

Ela jamais pode estar toda presente, ainda quando numa representação que se desse a si própria em espetáculo. 

Na profundidade que atravessa a tela, que a escava ficticiamente e a projeta para a frente dela própria, não é possível que a pura felicidade da imagem ofereça alguma vez, em plena luz, 

  • o mestre que representa 
  • e o soberano representado. 

Talvez haja, neste quadro de Velásquez, como que a representação da representação clássica e a definição do espaço que ela abre. 

Com efeito, ela intenta representar-se a si mesma em todos os seus elementos, com suas imagens, os olhares aos quais ela se oferece, os rostos que torna visíveis, os gestos que a fazem nascer. 

Mas aí, nessa dispersão que ela reúne e exibe em conjunto, por todas as partes um vazio essencial é imperiosamente indicado: o desaparecimento necessário daquilo que a funda – daquele a quem ela se assemelha e daquele a cujos olhos ela não passa de semelhança. 

Esse sujeito mesmo – que é o mesmo – foi elidido. 

E livre, enfim, dessa relação que a acorrentava, a representação pode se dar como pura representação.

 

V. O ser da linguagem

Capítulo II. A prosa do mundo; tópico V. O ser da linguagem

Desde o estoicismo, o sistema dos signos no mundo ocidental fora ternário, já que nele se reconhecia

  • o significante,
  • o significado
  • e a “conjuntura” (o ‘túyxavov).

A partir do século XVII, em contrapartida, a disposição dos signos tornar-se-á binária, pois que será definida, com Port- Royal,

  • pela ligação de um significante
  • com um significado.

No Renascimento, a organização é diferente e muito mais complexa; ela é ternária, já que apela

  • para o domínio formal das marcas,
  • para o conteúdo que se acha por elas assinalado
  • e para as similitudes que ligam as marcas às coisas designadas;

porém, como a semelhança é tanto a forma dos signos quanto seu conteúdo, os três elementos distintos dessa distribuição se resolvem numa figura única.

Essa disposição, com o jogo que ela autoriza, se reencontra, mas invertida, na experiência da linguagem. Com efeito, esta existe primeiramente, em seu ser bruto e primitivo, sob a forma simples, material, de uma escrita, de um estigma sobre as coisas, de uma marca espalhada pelo mundo e que faz parte de suas mais indeléveis figuras.

Num sentido, essa camada da linguagem é única e absoluta. Mas ela faz logo nascer duas outras formas de discurso que a vão enquadrar:

  • acima dela, o comentário, que retoma os signos dados com um novo propósito
  • e, abaixo, o texto, cujo comentário supõe a primazia oculta por sob as marcas visíveis a todos.

Daí três níveis de linguagem a partir do ser único da escrita. É esse jogo complexo que vai desaparecer com o fim do Renascimento. E isso de duas maneiras:

  • seja porque as figuras que oscilavam indefinidamente entre um e três termos vão ser fixadas numa forma binária que as tornará estáveis;
  • seja porque a linguagem, em vez de existir como escrita material das coisas, não achará mais seu espaço senão no regime geral dos signos representativos.

Essa nova disposição implica o aparecimento de um novo problema até então desconhecido: com efeito, perguntava-se

  • como reconhecer que um signo designasse realmente aquilo que ele significava;
  • a partir do século XVII, perguntar-se-á como um signo pode estar ligado àquilo que ele significa.

Questão à qual a idade clássica responderá pela análise da representação;

e à qual o pensamento moderno responderá pela análise do sentido e da significação.

Mas, por isso mesmo, a linguagem não será nada mais

  • que um caso particular da representação (para os clássicos)
  • ou da significação (para nós).

A profunda interdependência da linguagem e do mundo se acha desfeita.

O primado da escrita está suspenso.

Desaparece então essa camada uniforme onde se entrecruzavam indefinidamente

  • o visto e o lido,
  • o visível e o enunciável.

As coisas e as palavras vão separar-se.

O olho será destinado a ver e somente a ver; o ouvido somente a ouvir.

O discurso terá realmente por tarefa dizer o que é, mas não será nada mais que o que ele diz.

Imensa reorganização da cultura de que a idade clássica foi a primeira etapa, a mais importante talvez, posto ser ela a responsável pela nova disposição na qual estamos ainda presos – posto ser ela que nos separa de uma cultura onde a significação dos signos não existia, por ser absorvida na soberania do Semelhante; mas onde seu ser enigmático, monótono, obstinado, primitivo, cintilava numa dispersão infinita.

Nada mais há em nosso saber nem em nossa reflexão que nos traga hoje a lembrança desse ser. Nada mais, salvo talvez a literatura e ainda de um modo mais alusivo e diagonal que direto.

Pode-se dizer, num certo sentido, que a “literatura”, tal como se constituiu e assim se designou no limiar da idade moderna, manifesta o reaparecimento, onde era inesperado, do ser vivo da linguagem.

Nos séculos XVII e XVIII, a existência própria da linguagem, sua velha solidez de coisa inscrita no mundo foram dissolvidas no funcionamento da representação; toda linguagem valia como discurso.

A arte da linguagem era uma maneira de “fazer signo” ao mesmo tempo de significar alguma coisa e de dispor, em torno dessa coisa, signos: uma arte, pois, de nomear e, depois, por uma reduplicação ao mesmo tempo demonstrativa e decorativa, de captar esse nome, de encerrá-lo e encobri-lo por sua vez com outros nomes, que eram sua presença adiada, seu signo segundo, sua figura, seu aparato retórico.

Ora, ao longo de todo o século XIX e até nossos dias ainda – de Hôlderlin a Mallarmé, a Antonin Artaud – a literatura só existiu em sua autonomia, só se desprendeu de qualquer outra linguagem, por um corte profundo, na medida em que constituiu uma espécie de “contradiscurso” e remontou assim da função representativa ou significante da linguagem àquele ser bruto esquecido desde o século XVI.

Crê-se atingir a essência mesma da literatura, interrogando-a não mais ao nível do que ela diz, mas na sua forma significante: fazendo-o, permanece-se no estatuto clássico da linguagem.

Na idade moderna, a literatura é o que compensa (e não o que confirma) o funcionamento significativo da linguagem. Através dela o ser da linguagem brilha de novo nos limites da cultura ocidental e em seu coração – pois ele é, desde o século XVI, aquilo que lhe é mais estranho; porém, desde esse mesmo século XVI, ele está no centro do que ela recobriu.

Eis por que, cada vez mais, a literatura aparece como o que deve ser pensado; mas também, e pela mesma razão, como o que não poderá em nenhum caso ser pensado a partir de uma teoria da significação.

Quer a analisemos do lado do significado (o que ela quer dizer, suas “ideias”, o que ela promete ou o que exige), quer do lado do significante (com a ajuda de esquemas tomados à linguística ou à psicanálise), pouco importa: isso não passa de um episódio.

Tanto num caso como no outro, buscam-na fora do lugar onde, para a nossa cultura, ela jamais cessou, desde há um século e meio, de nascer e de se imprimir.

Tais modos de decifração provém de uma situação clássica da linguagem aquela que reinou no século XVII, quando o regime dos signos se tornou binário e quando a significação foi refletida na forma da representação; então a literatura era realmente composta de um significante e de um significado e merecia ser analisada como tal.

A partir do século XIX, a literatura repõe à luz a linguagem no seu ser: não, porém, tal como ela aparecia ainda no final do Renascimento.

Porque agora não há mais aquela palavra primeira, absolutamente inicial, pela qual se achava fundado e limitado o movimento infinito do discurso; doravante a linguagem vai crescer sem começo, sem termo e sem promessa.

É o percurso desse espaço vão e fundamental que traça, dia a dia, o texto da literatura.

IV. A escrita das coisas

Capítulo II. A prosa do mundo; tópico IV. A escrita das coisas

No século XVI, a linguagem real não é um conjunto de signos independentes, uniforme e liso, em que as coisas viriam refletir-se como num espelho, para aí enunciar, uma a uma, sua verdade singular.

É antes coisa opaca, misteriosa, cerrada sobre si mesma, massa fragmentada e ponto por ponto enigmática, que se mistura aqui e ali com as figuras do mundo e se imbrica com elas: tanto e tão bem que, todas juntas, elas formam uma rede de marcas, em que cada uma pode desempenhar, e desempenha de fato, em relação a todas as outras, o papel de conteúdo ou de signo, de segredo ou de indicação.

No seu ser bruto e histórico do século XVI, a linguagem não é um sistema arbitrário; está depositada no mundo e dele faz parte, porque, ao mesmo tempo, as próprias coisas escondem e manifestam seu enigma como uma linguagem e porque as palavras se propõem aos homens como coisas a decifrar.

A grande metáfora do livro que se abre, que se soletra e que se lê para conhecer a natureza não é mais que o reverso visível de uma outra transferência, muito mais profunda, que constrange a linguagem a residir do lado do mundo, em meio às plantas, às ervas, às pedras e aos animais.

A linguagem faz parte da grande distribuição das similitudes e das assinalações. Por conseguinte, deve, ela própria, ser estudada como uma coisa da natureza. Seus elementos têm, como os animais, as plantas ou as estrelas, suas leis de afinidade e de conveniência, suas analogias obrigatórias.

Ramus dividia sua gramática em duas partes.

  • A primeira era consagrada à etimologia, o que não quer dizer que se buscasse aí o sentido originário das palavras, mas sim as “propriedades” intrínsecas das letras, das sílabas, enfim, das palavras inteiras.
  • A segunda parte tratava da sintaxe: seu propósito era ensinar

“a construção das palavras entre si mediante suas propriedades” e consistia “quase que apenas em conveniência e mútua comunhão das propriedades, como a do nome com o nome ou com o verbo, do advérbio com todas as palavras às quais é associado, da conjunção na ordem das coisas conjugadas”(29).

A linguagem não é o que é porque tem um sentido; seu conteúdo representativo que, para os gramáticos dos séculos XVII e XVIII terá tanta importância a ponto de servir de fio condutor para suas análises, não tem aqui papel a desempenhar.

As palavras agrupam sílabas e as sílabas, letras, porque há, depositadas nestas, virtudes que as aproximam e as desassociam, exatamente como no mundo as marcas se opõem ou se atraem umas às outras.

O estudo da gramática repousa, no século XVI, na mesma disposição epistemológica em que repousam a ciência da natureza ou as disciplinas esotéricas.

As Únicas diferenças são:

  • há uma natureza e várias línguas;
  • e, no esoterismo, as propriedades das palavras, das sílabas e das letras são descobertas por um outro discurso que permanece secreto,
  • enquanto na gramática são as palavras e as frases de todos os dias que, por si mesmas, enunciam suas propriedades.

A linguagem está a meio caminho entre

  • as figuras visíveis da natureza
  • e as conveniências secretas dos discursos esotéricos.

É uma natureza fragmentada, dividida contra ela mesma e alterada, que perdeu sua transparência primeira; é um segredo que traz em si, mas na superfície, as marcas decifráveis daquilo que ele quer dizer. É, ao mesmo tempo, revelação subterrânea e revelação que, pouco a pouco, se restabelece numa claridade ascendente.

Sob sua forma primeira, quando foi dada aos homens pelo próprio Deus, a linguagem era um signo das coisas absolutamente certo e transparente, porque se lhes assemelhava. Os nomes eram depositados sobre aquilo que designavam, assim como a força está escrita no corpo do leão, a realeza no olhar da águia, como a influência dos planetas está marcada na fronte dos homens: pela forma da similitude.

Essa transparência foi destruída em BabeI para punição dos homens.

  • As línguas foram separadas umas das outras e se tornaram incompatíveis,
  • somente na medida em que antes se apagou essa semelhança com as coisas que havia sido a primeira razão de ser da linguagem.

Todas as línguas que conhecemos, só as falamos agora com base nessa similitude perdida e no espaço por ela deixado vazio. Só há uma língua que guarda sua memória, porque deriva diretamente desse primeiro vocabulário agora esquecido; porque Deus não quis que o castigo de Babel escapasse a lembrança dos homens; por que essa língua teve de servir para narrar a velha Aliança de Deus com seu povo; enfim, porque é nessa língua que Deus se dirigiu aos que o escutavam.

O hebreu carrega, pois, como resquícios as marcas da nomeação primeira. E aquelas palavras que Adão havia pronunciado, impondo-as aos animais, permaneceram, ao menos em parte, arrastando consigo na sua espessura, como um fragmento de saber silencioso, as propriedades imóveis dos seres:

“Assim a cegonha, tão louvada por causa da caridade para com seus pais e mães, é chamada em hebreu Chasida, que quer dizer bondosa, caridosa, dotada de piedade… O nome Sus, do cavalo, é considerado do verbo Hasas, se não for antes este verbo que deriva do nome e que significa altear-se, pois, entre todos os animais de quatro pés, aquele é altivo e bravo como Jó o descreve no capítulo 39”(30).

Mas isso não passa de monumentos fragmentários; as outras línguas perderam essas similitudes radicais que só o hebreu conserva, para mostrar que foi outrora a língua comum a Deus, a Adão e aos animais da primeira terra. Mas, se a linguagem não mais se assemelha imediatamente às coisas que ela nomeia, não está por isso separada do mundo; continua, sob uma outra forma, a ser o lugar das revelações e a fazer parte do espaço onde a verdade, ao mesmo tempo, se manifesta e se enuncia.

Certamente que não é mais a natureza na sua visibilidade de origem, mas também não é um instrumento misterioso, cujos poderes somente alguns privilegiados conheceriam. É antes a figura de um mundo em via de se redimir, colocando-se, enfim, à escuta da verdadeira palavra.

É por isso que Deus quis que o latim, linguagem de sua igreja, se expandisse por todo o globo terrestre. É por isso que todas as linguagens do mundo, tal como foi possível conhecê-las graças a essa conquista, formam, em conjunto, a imagem da verdade.

O espaço em que se desdobram e sua imbricação liberam o signo do mundo salvo, tal como a disposição dos primeiros nomes se assemelhava às coisas que Deus colocara a serviço de Adão.

Claude Duret observa que

  • os hebreus, os cananeus, os samaritanos, os caldeus, os sírios, os egípcios, os púnicos, os cartagineses, os sarracenos, os turcos, os mouros, os persas, os tártaros escrevem da direita para a esquerda, seguindo assim

“o curso e movimento diário do primeiro céu, que é muito perfeito, conforme a opinião do grande Aristóteles, aproximando-se da unidade”;

  • os gregos, os georgianos, os maronitas, os jacobitas, os coftitas, os tzvernianos, os posnanianos e, certamente, os latinos e todos os europeus escrevem da esquerda para a direita, seguindo

“o curso e movimento do segundo céu, conjunto dos sete planetas”;

  • os indianos, os catânios, os chineses, os japoneses escrevem de cima para baixo, conforme

“a ordem da natureza, que deu aos homens a cabeça no alto e os pés embaixo”;

  • “ao contrário dos supracitados”, os mexicanos escrevem
    • quer de baixo para cima,
    • quer em “linhas espirais, como as que o Sol faz em seu curso anual sobre o Zodíaco”.

E assim,

“por esses cinco diversos modos de escrever, os segredos e mistérios da janela do mundo e da forma da cruz, conjunto da redondeza do céu e da terra, são propriamente denotados e expressos”(31).

As línguas estão com o mundo

  • numa relação mais de analogia que de significação;
  • ou, antes, seu valor de signo e sua função de duplicação se sobrepõem;
  • elas dizem o céu e a terra de que são a imagem;
  • reproduzem, na sua mais material arquitetura, a cruz cujo advento anunciam – esse advento que, por sua vez, se estabelece pelas Escrituras e pela Palavra.

Há uma função simbólica na linguagem:

  • mas, desde o desastre de BabeI, não devemos mais buscá-la senão em raras exceções(32) nas próprias palavras,
  • mas antes na existência mesma da linguagem,
  • na sua relação total com a totalidade do mundo,
  • no entrecruzamento de seu espaço com os lugares e as figuras do cosmos.

Daí a forma do projeto enciclopédico, tal como aparece no fim do século XVI ou nos primeiros anos do século seguinte:

  • não refletir o que se sabe no elemento neutro da linguagem – o uso do alfabeto como ordem enciclopédica arbitrária, mas eficaz, só aparecerá na segunda metade do século XVII(33) –
  • mas reconstituir, pelo encadeamento das palavras e por sua disposição no espaço, a ordem mesma do mundo.

É esse projeto que se encontra em

  • Gregório, no seu Syntaxeon artis mirabilis (1610),
  • em Alstedius com sua Encyclopaedia (1630);
  • ou ainda em Cristophe de Savigny (Tableau de tous les arts libéraux) que consegue espacializar os conhecimentos, ao mesmo tempo segundo a forma cósmica, imóvel e perfeita do círculo e aquela, sublunar, perecível, múltipla e dividida da árvore;
  •  encontramo-lo também em La Croix du Maine, que imagina um espaço ao mesmo tempo de Enciclopédia e de Biblioteca, que permitiria dispor os textos escritos segundo as figuras da vizinhança, do parentesco, da analogia e da subordinação, prescritas pelo próprio mundo(34).

De todo modo, um tal entrelaçamento da linguagem com as coisas, num espaço que lhes seria comum, supõe um privilégio absoluto da escrita. Esse privilégio dominou todo o Renascimento e, sem dúvida, foi um dos grandes acontecimentos da cultura ocidental.

A imprensa, a chegada à Europa dos manuscritos orientais, o aparecimento de uma literatura que não era mais feita pela voz ou pela representação nem comandada por elas, a primazia dada à interpretação dos textos religiosos sobre a tradição e o magistério da igreja – tudo isso testemunha, sem que se possam apartar os efeitos e as causas, o lugar fundamental assumido, no Ocidente, pela Escrita.

Doravante, a linguagem tem por natureza primeira ser escrita. Os sons da voz formam apenas sua tradução transitória e precária.

  • O que Deus depositou no mundo são palavras escritas; quando Adão impôs os primeiros nomes aos animais, não fez mais que ler essas marcas visíveis e silenciosas;
  • a Lei foi confiada a Tábuas, não à memória dos homens; e a verdadeira Palavra, é num livro que a devemos encontrar.

Tanto Vigenere como Duret(35) diziam – e em termos quase idênticos – que a escrita precedera sempre a fala, certamente na natureza, talvez mesmo no saber dos homens.

Pois poderia bem ser que antes de BabeI, antes do Dilúvio, houvesse uma escrita composta pelas marcas mesmas da natureza, de tal sorte que esses caracteres tivessem o poder de agir diretamente sobre as coisas, atraí-las ou repeli-las, figurar suas propriedades, suas virtudes e seus segredos.

Escrita primitivamente natural, da qual certos saberes esotéricos e a cabala, em primeiro lugar, conservaram a memória dispersada e tentam retomar os poderes desde muito tempo adormecidos.

O esoterismo do século XVI é um fenômeno de escrita, não de fala. Esta, em todo o caso, é despojada de seus poderes;

  • ela só é, dizem Vigenère e Duret, a parte fêmea da linguagem, como seu intelecto passivo;
  • já a Escrita é o intelecto agente, o “princípio macho” da linguagem.

Somente ela detém a verdade. Essa primazia da escrita explica a presença gêmea de duas formas que são indissociáveis no saber do século XVI, apesar de sua oposição aparente.

Trata-se, em primeiro lugar, da não-distinção entre o que se vê e o que se lê, entre o observado e o relatado, da constituição, pois, de uma superfície única e lisa, onde o olhar e a linguagem se entrecruzam ao infinito; e trata-se também, inversamente, da dissociação imediata de toda linguagem que desdobra, sem um termo jamais assinalável, a repetição do comentário.

Buffon, um dia, estranhará que se possa encontrar em um naturalista como Aldrovandi uma mistura inextrincável de descrições exatas de citações relatadas, de fábulas sem critica, de observações concernindo indiferentemente à anatomia, aos brasões, ao habitat, aos valores mitológicos de um animal, aos usos que dele se podem fazer na medicina ou na magia. E, com efeito, quando nos reportamos à Historia serpentum et draconum, vemos o capítulo “Da Serpente em Geral” desenvolver-se segundo as seguintes rubricas:

  • equívoco (isto é, os diferentes sentidos da palavra serpente), sinônimos e etimologias, diferenças, forma e descrição, anatomia, natureza e costumes, temperamento, coito e geração, voz, movimentos, lugares, alimentação, fisionomia, antipatia, simpatia, modos de captura, morte e ferimentos pela serpente, modos e sinais de envenenamento, remédios, epítetos, denominações, prodígios e presságios, monstros, mitologia, deuses aos quais é consagrada, apólogos, alegorias e mistérios, hieróglifos, emblemas e símbolos, adágios, moedas, milagres, enigmas, divisas, signos heráldicos, fatos históricos, sonhos, simulacros e estátuas, usos nos alimentos, usos na medicina, usos diversos.

E Buffon diz:

“Que se julgue, a partir disso, que porção de história natural se pode encontrar em toda essa miscelânea de escrita. Tudo isso não é descrição, mas lenda.”

Com efeito, para Aldrovandi e seus contemporâneos, tudo isso é legenda – coisas para ler.

Mas a razão disso não está em que se prefira a autoridade dos homens à exatidão de um olhar não-prevenido, mas em que a natureza, em si mesma, é um tecido ininterrupto de palavras e de marcas, de narrativas e de caracteres, de discursos e de formas.

Quando se tem de fazer a história de um animal, inútil e impossível escolher entre o ofício de naturalista e o de compilador: o que é preciso é recolher, numa única e mesma forma do saber, tudo o que foi visto e ouvido, tudo o que foi contado pela natureza ou pelos homens, pela linguagem do mundo, das tradições ou dos poetas.

Conhecer um animal, ou uma planta, ou uma coisa qualquer da terra, é recolher toda a espessa camada dos signos que puderam ter sido depositados neles ou sobre eles; é reencontrar também todas as constelações de formas em que eles assumem valor de insígnia.

Aldrovandi não era nem melhor nem pior observador que Buffon; não era mais crédulo que ele nem menos empenhado na fidelidade do olhar ou na racionalidade das coisas.

Simplesmente o seu olhar não estava ligado às coisas pelo mesmo sistema, nem pela mesma disposição da epistémê. O próprio Aldrovandi contemplava meticulosamente uma natureza que era, toda ela, escrita.

Saber consiste, pois, em referir a linguagem à linguagem. Em restituir a grande planície uniforme das palavras e das coisas. Em fazer tudo falar. Isto é, em fazer nascer, por sobre todas as marcas, o discurso segundo do comentário.

O que é próprio do saber não é nem ver nem demonstrar, mas lnterpretar.

Comentário das Escrituras, comentários dos antigos, comentário do que relataram os viajantes, comentário das lendas e das fábulas:

  • não se solicita a cada um desses discursos que se interpreta seu direito de enunciar uma verdade;
  • só se requer dele a possibilidade de falar sobre ele.

A linguagem tem em si mesma seu princípio interior de proliferação.

“Há mais a fazer interpretando as interpretações que interpretando as coisas; e mais livros sobre os livros que sobre qualquer outro assunto; nós não fazemos mais que nos entreglosar.”(36)

Não se trata aí da constatação do malogro de uma cultura soterrada sob seus próprios monumentos; mas da definição da relação inevitável que a linguagem do século XVI entretinha consigo mesma.

De um lado, esta relação permite uma mobilização infinita da linguagem que não cessa de se desenvolver, de se retomar e de fazer imbricarem-se suas formas sucessivas.

Talvez pela primeira vez na cultura ocidental descobre-se essa dimensão absolutamente aberta de uma linguagem que não pode mais se deter porque, jamais encerrada numa palavra definitiva, só enunciará sua verdade num discurso futuro, inteiramente consagrado a dizer o que irá dizer; mas esse próprio discurso não tem o poder de se deter sobre si e encerra aquilo que diz como uma promessa legada ainda a um outro discurso…

A tarefa do comentário, por definição, não pode jamais ser completada. E, contudo, o comentário é inteiramente voltado para a parte enigmática, murmurada, que se oculta na linguagem comentada: faz nascer, por sob o discurso existente, um outro discurso, mais fundamental e como que “mais primeiro”, cuja restituição ele se propõe como tarefa.

Só há comentário se, por sob a linguagem que se lê e se decifra, corre a soberania de um Texto primitivo. E é esse texto que, fundando o comentário, lhe promete como recompensa sua descoberta final.

De tal sorte que a necessária proliferação da exegese é medida, idealmente limitada e, contudo, incessantemente animada por esse reino silencioso.

A linguagem do século XVI – entendida não como um episódio na história da língua, mas como uma experiência cultural global – foi sem dúvida tomada nesse jogo, nesse interstício entre o Texto primeiro e o infinito da Interpretação.

Fala-se sobre o fundo de uma escrita que se incorpora ao mundo; fala-se infinitamente sobre ela, e cada um de seus signos torna-se, por sua vez, escrita para novos discursos; mas cada discurso se endereça a essa primeira escrita, cujo retorno ao mesmo tempo promete e desvia.

Vê-se que a experiência da linguagem pertence à mesma rede arqueológica a que pertence o conhecimento das coisas da natureza. Conhecer essas coisas era patentear o sistema das semelhanças que as tornavam próximas e solidárias umas às outras; não se podia, porém, fazer o levantamento das similitudes senão na medida em que um conjunto de signos formava o texto de uma indicação peremptória. Ora, esses mesmos signos não eram senão um jogo de semelhanças e remetiam a uma tarefa infinita, necessariamente inacabada, de conhecer o similar.

Da mesma forma, mas com alguma transposição, a linguagem se dá por tarefa restituir um discurso absolutamente primeiro que, no entanto, ela só pode enunciar acercando-se dele, tentando dizer a seu propósito coisas semelhantes a ele, e fazendo nascer assim, ao infinito, as fidelidades vizinhas e similares da interpretação.

O comentário se assemelha indefinidamente ao que ele comenta e que jamais pode enunciar; assim como o saber da natureza encontra sempre novos signos da semelhança, porque a semelhança não pode ser conhecida por si mesma, já que os signos não podem ser outra coisa senão similitudes. E,

  • assim como esse jogo infinito da natureza encontra seu liame, sua forma e sua limitação na relação do microcosmo com o macrocosmo,
  • assim a tarefa infinita do comentário se assegura na promessa de um texto efetivamente escrito, que um dia a interpretação revelará por inteiro.

III. Os limites do mundo

Capítulo II. A prosa do mundo; tópico III. Os limites do mundo

Tal é, em seu esboço geral, a epistémê do século XVI.

Essa configuração traz consigo um certo número de consequências. E, de início, o caráter ao mesmo tempo

  • pletórico
  • e absolutamente pobre

desse saber.

Pletórico porque ilimitado.

A semelhança jamais permanece estável em si mesma;

  • só é fixada se remete a uma outra similitude que, por sua vez, requer outras;
  • de sorte que cada semelhança só vale pela acumulação de todas as outras,
  • e que o mundo inteiro deve ser percorrido para que a mais tênue das analogias seja justificada e apareça enfim como certa.

É, pois, um saber que poderá, que deverá proceder por acúmulo infinito de confirmações requerendo-se umas às outras. E por isso, desde suas fundações, esse saber será movediço. A única forma de ligação possível entre os elementos do saber é a adição. Daí essas imensas colunas, daí sua monotonia.

Colocando a semelhança (ao mesmo tempo terceira potência e poder único, pois que habita do mesmo modo a marca e o conteúdo) como nexo entre o signo e o que ele indica, o saber do século XVI condenou-se a só conhecer sempre a mesma coisa, mas a conhecê-la apenas ao termo jamais atingido de um percurso indefinido.

É aí que funciona a categoria, demasiado ilustre, do microcosmo.

Sem dúvida, essa noção foi reanimada, através da Idade Média e desde o começo do Renascimento, por certa tradição neoplatônica. Mas ela acabou por desempenhar, no século XVI, um papel fundamental no saber.

Pouco importa que ela seja ou não, como se dizia outrora, visão do mundo ou Weltanschauung. De fato, ela tem uma, ou melhor, duas funções muito precisas na configuração epistemológica dessa época.

  • Como categoria de pensamento,
    • aplica a todos os domínios da natureza o jogo das semelhanças redobradas;
    • garante à investigação que cada coisa encontrará, numa escala maior, seu espelho e sua segurança macroscópica;
    • afirma, em troca, que a ordem visível das mais altas esferas virá mirar-se na profundeza mais sombria da terra.
  • Mas, entendida como configuração geral da natureza,
    • ela coloca limites reais e, por assim dizer, tangíveis ao inacessível curso das similitudes que se permutam.
    • Indica que existe um grande mundo e que seu perímetro traça o limite de todas as coisas criadas;
    • que, na outra extremidade, existe uma criatura privilegiada que reproduz, nas suas dimensões restritas, a ordem imensa do céu, dos astros, das montanhas, dos rios e das tempestades;
    • e que é entre os limites efetivos dessa analogia constitutiva que se desenvolve o jogo das semelhanças.

Por isso mesmo, a distância do microcosmo ao macrocosmo pode ser imensa, mas não é infinita; os seres que aí residem podem ser numerosos, mas afinal poderíamos contá-los; e, consequentemente, as similitudes que, pelo jogo dos signos que elas exigem, apóiam-se sempre umas nas outras, não se arriscam mais a escapar indefinidamente. Para se apoiarem e se reforçarem, elas têm um domínio perfeitamente cerrado. A natureza, como o jogo dos signos e das semelhanças, fecha-se sobre si mesma segundo a figura redobrada do cosmos.

É necessário, pois, evitar inverter as relações.

Sem dúvida alguma, a ideia do microcosmo é, como se diz, “importante” no século XVI; dentre todas as formulações que uma inquirição poderia recensear, ela seria provavelmente uma das mais frequentes.

  • Mas não se trata aqui de um estudo de opiniões que somente uma análise estatística do material escrito permitiria conduzir.
  • Se, em contrapartida, se interroga o saber do século XVI em seu nível arqueológico isto é, naquilo que o tornou possível -, as relações entre o macrocosmo e o microcosmo aparecem como um simples efeito de superfície.

Não foi porque se acreditava em tais relações que se passou a buscar todas as analogias do mundo.

Mas havia no coração do saber uma necessidade: era preciso

  • ajustar a infinita riqueza de uma semelhança, introduzida como terceiro entre os sinais e seus sentidos,
  • e a monotonia imposta pela mesma repartição da semelhança ao significante e ao que ele significava.

Numa epistémê onde signos e semelhanças se enrolavam reciprocamente segundo uma voluta que não tinha termo, era realmente necessário que se pensasse na relação do microcosmo com o macrocosmo como a garantia desse saber e o termo de sua expansão.

Graças à mesma necessidade, esse saber devia acolher, ao mesmo tempo e no mesmo plano,

  • magia
  • e erudição.

Afigura-se-nos que os conhecimentos do século XVI eram constituídos por uma mistura instável

  • de saber racional,
  • de noções derivadas das práticas da magia
  • e de toda uma herança cultural, cujos poderes de autoridade a redescoberta de textos antigos havia multiplicado.

Assim concebida, a ciência dessa época aparece dotada de uma estrutura frágil; ela não seria mais do que o lugar liberal de um afrontamento entre

  • a fidelidade aos antigos, o gosto pelo maravilhoso
  • e uma atenção já despertada para essa soberana racionalidade na qual nos reconhecemos.

E essa época trilobada se refletiria no espelho de cada obra e de cada espírito dividido…

De fato, não é de uma insuficiência de estrutura que sofre o saber do século XVI. Vimos, ao contrário, quão meticulosas são as configurações que definem seu espaço. É esse rigor que impõe a relação com a magia e com a erudição não conteúdos aceitos, mas formas requeridas.

O mundo é coberto de signos que é preciso decifrar, e estes signos, que revelam semelhanças e afinidades, não passam, eles próprios, de formas da similitude.

Conhecer será, pois, interpretar: ir da marca visível ao que se diz através dela e, sem ela, permaneceria palavra muda, adormecida nas coisas.

“Nós, homens, descobrimos tudo o que está oculto nas montanhas por meio de sinais e correspondências exteriores; e é assim que encontramos todas as propriedades das ervas e tudo o que está nas pedras. Nada há nas profundezas dos mares, nada nas alturas do firmamento que o homem não seja capaz de descobrir. Não há montanha bastante vasta para ocultar ao olhar do homem o que nela existe; isso lhe é revelado por sinais correspondentes.”(27)

A adivinhação não é uma forma concorrente de conhecimento; incorpora-se ao próprio conhecimento. Ora esses signos que se interpretam só designam o oculto na medida em que se lhe assemelham; e não se atuará sobre as marcas sem operar ao mesmo tempo sobre o que é, por elas secretamente indicado.

Eis por que as plantas que representam a cabeça, ou os olhos, ou o coração, ou o fígado, terão eficácia sobre um órgão; eis por que os próprios animais são sensíveis às marcas que os designam.

“Dize-me pois” pergunta Paracelso, “por que a serpente na Helvécia, na Argólida, na Suécia, compreende as palavras gregas Osy, Osya, Osy… Em que academias aprenderam, já que, ao escutarem a palavra, viram em seguida sua cauda, a fim de não escutá-la de novo? Não obstante sua natureza e seu espírito, basta escutarem a palavra para permanecerem imóveis e não envenenarem ninguém com sua ferida venenosa.”

E não se diga que isso é somente o efeito do ruído das palavras pronunciadas:

“Se escreveres, em tempo favorável, somente lavras em velino, pergaminho, papel, e a impuseres à serpente, esta não ficará menos imóvel que se as tivesses articulado em voz alta?”.

O projeto das “Magias naturais”, que ocupa um amplo lugar no final do século XVI e se alonga até plenos meados do século XVII, não é um efeito residual na consciência européia; ele foi ressuscitado – diz expressamente Campanella(28) – e por razões contemporâneas:

  • porque a configuração fundamental do saber remetia umas às outras as marcas e as similitudes.

A forma era inerente à maneira de conhecer. E, pela mesma razão, a erudição: pois, no tesouro que nos transmitiu a Antiguidade, a linguagem vale como o signo das coisas.

Não há diferença entre

  • essas marcas visíveis que Deus depositou sobre a superfície da Terra, para nos fazer conhecer seus segredos interiores,
  • e as palavras legíveis que a Escritura ou os sábios da Antiguidade, esclarecidos por uma luz divina, depositaram nesses livros que a tradição salvou.

A relação com os textos é da mesma natureza que a relação com as coisas; aqui e lá são signos que arrolamos. Mas Deus, para exercitar nossa sabedoria, só semeou na natureza figuras a serem decifradas (e é nesse sentido que o conhecimento deve ser divinatio), enquanto os antigos já deram interpretações que não temos senão que recolher.

Que deveríamos somente recolher, se não fosse necessário aprender sua língua, ler seus textos, compreender o que dizem.

A herança da Antiguidade é como a própria natureza, um vasto espaço a interpretar; aqui e lá é preciso arrolar signos e pouco a pouco fazê-Ios falar. Em outras palavras, Divinatio e Eruditio são uma mesma hermenêutica.

Ela se desenvolve, porém, segundo figuras semelhantes, em dois níveis diferentes:

  • uma vai da marca muda à própria coisa
    (e faz falar a natureza);
  • a outra vai do grafismo imóvel à clara palavra (restitui vida às linguagens adormecidas).

Mas, assim como os sinais naturais estão ligados ao que indicam pela profunda relação de semelhança, assim também o discurso dos antigos é feito à imagem do que ele enuncia;

  • se tem para nós o valor de um signo precioso, é porque, do fundo de seu ser, e pela luz que não cessou de atravessá-lo desde seu nascimento, está ajustado às próprias coisas, forma seu espelho e sua emulação;
  • ele é, para a verdade eterna, o que os sinais são para os segredos da natureza (desta palavra, ele é o sinal a decifrar);
  • tem, com as coisas que desvela, uma afinidade sem idade.

Inútil, pois, pedir-lhe seu título de autoridade; ele é um tesouro de signos ligados por similitude àquilo que eles podem designar.

A única diferença é que se trata de um tesouro de segundo grau, remetendo às notações da natureza, as quais indicam obscuramente o fino ouro das próprias coisas. A verdade de todas essas marcas quer atravessem a natureza, quer se alinhem nos pergaminhos e nas bibliotecas – é em toda a parte a mesma: tão arcaica quanto a instituição de Deus.

Entre as marcas e as palavras, não difere a observação da autoridade aceita ou o verificável da tradição. Por toda a parte há somente um mesmo jogo, o do signo e do similar, e é por isso que a natureza e o verbo podem se entrecruzar ao infinito, formando, para quem sabe ler, como que um grande texto único.

II. As assinalações

Capítulo II. A prosa do mundo; tópico II. As assinalações

E, no entanto, o sistema não é fechado. Subsiste uma abertura: por ela, todo o jogo das semelhanças se arriscaria a escapar de si mesmo ou a permanecer na noite, se uma nova figura da similitude não viesse completar o círculo tomá-lo ao mesmo tempo perfeito e manifesto.

Convenientia, aemulatio, analogia e simpatia nos dizem de que modo o mundo deve se dobrar sobre si mesmo, se duplicar, se refletir ou se encadear para que as coisas possam assemelhar-se. Dizem-nos os caminhos da similitude e por onde eles passam;

  • não onde ela está
  • nem como a vemos,
  • nem com que marca a reconhecemos.

Ora, talvez nos ocorresse atravessar toda essa proliferação maravilhosa das semelhanças, sem mesmo suspeitarmos que ela está preparada, desde muito tempo, pela ordem do mundo e para nosso maior beneficio.

Para saber que o acônito cura nossas doenças de olhos ou que a noz esmagada com o álcool sana as dores de cabeça, é preciso uma marca que no-la advirta: sem o que este segredo permaneceria indefinidamente adormecido.

Saberíamos jamais que existe, de um homem com seu planeta, uma relação de geminidade ou de contenda, se não houvesse em seu corpo e entre as rugas de seu rosto, o sinal de que ele é rival de Marte ou aparentado a Saturno?

É preciso que as similitudes submersas estejam assinaladas na superfície das coisas; é necessária uma marca visível das analogias invisíveis.

Acaso não será toda semelhança a um tempo o que há de mais manifesto e o que está mais bem oculto?

Com efeito,

  • ela não é composta de porções justapostas – algumas idênticas, outras diferentes -;
  • ela é, por inteiro, uma similitude
    • que se vê
    • ou que não se vê.

Seria, pois, sem critério, se não houvesse nela – ou acima ou ao lado – um elemento de decisão que transformasse sua duvidosa cintilação em clara certeza.

Não há semelhança sem assinalação.

O mundo do similar só pode ser um mundo marcado.

“Não é vontade de Deus”, diz Paracelso, “que o que ele cria para o beneficio do homem e o que lhe deu permaneça escondido… E ainda que ele tenha escondido certas coisas, nada deixou sem sinais exteriores e visíveis com marcas especiais – assim como um homem que enterrou um tesouro marca a sua localização a fim de que possa reencontrá-lo.”(19)

O saber das similitudes funda-se

  • na súmula de suas assinalações
  • e na sua decifração.

Inútil deter-se na casca das plantas para conhecer sua natureza; é preciso ir diretamente às suas marcas –

“à sombra e imagem de Deus que elas trazem ou à virtude interna que lhes foi dada do céu como por dote natural,… virtude, digo eu, que se reconhece melhor pela assinalação”(20).

O sistema das assinalações inverte a relação do visível com o invisível.

A semelhança era

  • a forma invisível daquilo que, do fundo do mundo, tornava as coisas visíveis;
  • mas para que essa forma, por sua vez, venha até a luz, é necessária uma figura visível que a tire de sua profunda invisibilidade.

Eis por que a face do mundo é coberta de brasões, de caracteres, de cifras, de palavras obscuras – de “hieróglifos”, dizia Turner.

E o espaço das semelhanças imediatas torna-se como um grande livro aberto; é carregado de grafismos; ao longo da página, veem-se figuras estranhas que se entrecruzam e por vezes se repetem. Só se tem que decifrá-las:

“Não é verdade que todas as ervas, árvores e outros, provenientes das entranhas da terra, são outros tantos livros e sinais mágicos?”(21).

O grande espelho calmo, no fundo do qual as coisas se mirariam e remeteriam umas às outras suas imagens, é, na realidade, todo buliçoso de palavras.

Os reflexos mudos são duplicados por que os indicam. E, graças a uma última forma de semelhança que envolve todas as outras e as encerra em um único, mundo pode se comparar a um homem que fala;

“Assim como os secretos movimentos de seu entendimento são manifestados pela voz, assim não parece que as ervas falam ao médico curioso por sua assinalação, descobrindo-lhe… suas virtudes interiores ocultas sob o véu do silêncio da natureza?”(22)

Mas convém nos determos mais sobre essa própria linguagem.

  • Sobre os signos de que é formada.
  • Sobre a maneira como esses signos remetem ao que indicam.

Há simpatia entre o acônito e os olhos. Essa afinidade imprevista permaneceria na sombra se não houvesse sobre a planta uma assinalação, uma marca e como que uma palavra dizendo que ela é boa para as doenças dos olhos.

  • Esse signo perfeitamente legível em suas sementes: são pequenos globos escuros engastados em películas brancas, que figuram aproximadamente o que as pálpebras são para os olhos(23).
  • O mesmo se passa com a afinidade entre a noz e a cabeça; o que cura “as aflições do pericrânio” é a espessa casca verde que repousa sobre os ossos – sobre o invólucro – do fruto: mas os males interiores da cabeça são evitados pelo próprio núcleo “que indica totalmente o cérebro”(24).

O sinal da afinidade, e o que a torna visível, é simplesmente a analogia; a cifra da simpatia reside na proporção.

Mas que assinalação trará a própria proporção para que seja possível reconhecê-la?

Como se poderia saber que as pregas da mão ou as rugas da fronte desenham no corpo dos homens o que são as inclinações, os acidentes ou os reveses no grande tecido da vida?

Somente porque a simpatia faz comunicarem-se o corpo e o céu e transmite o movimento dos planetas às aventuras dos homens. Somente também porque a brevidade de uma linha reflete a imagem simples de uma vida curta, o cruzamento de duas pregas, o encontro de um obstáculo, o movimento ascendente de uma ruga, a escalada de um homem para o sucesso. A largura é sinal de riqueza e de importância; a continuidade marca a fortuna, a descontinuidade, o infortúnio(25).

A grande analogia do corpo e do destino é assinalada por todo o sistema dos espelhos e das atrações. São as simpatias e as emulações que assinalam as analogias.

Quanto à emulação,

  • podemos reconhecê-la na analogia:
    • os olhos são estrelas porque espalham a luz sobre os rostos como os astros na obscuridade,
    • e porque os cegos são no mundo como os que têm clarividência no mais soturno da noite.
  • Podemos reconhecê-la também na conveniência:
    • sabe-se, desde os gregos, que os animais fortes e corajosos têm a extremidade dos membros larga e bem desenvolvida como se seu vigor tivesse sido comunicado às partes mais distantes do seu corpo.
    • Do mesmo modo, o rosto e a mão do homem carregarão a semelhança com a alma à qual estão ligados.

O reconhecimento das mais visíveis similitudes apóia-se, pois, numa descoberta que é a da conveniência das coisas entre si.

E se lembrarmos agora que a conveniência não é sempre definida por uma localização atual, mas que muitos seres que se convêm estão separados

(como ocorre entre a doença e seu remédio, entre o homem e seus astros, entre a planta e o solo de que precisa)

tornar-se-á de novo necessário um sinal da conveniência.

Ora, que outra marca existe de que duas coisas estão encadeadas uma à outra senão que elas se atraem reciprocamente, como o sol e a flor do girassol, ou a água e o rebento do pepino(26), senão que entre elas há afinidade e como que simpatia?

Assim o círculo se fecha. Vê-se, porém, através de qual sistema de desdobramentos.

As semelhanças exigem uma assinalação, pois nenhuma dentre elas poderia ser notada se não fosse legivelmente marcada.

Mas que são esses sinais?

Como reconhecer, entre todos os aspectos do mundo e tantas figuras que se entrecruzam, que há aqui um caráter no qual convém se deter, porque ele indica uma secreta e essencial semelhança?

Que forma constitui o signo no seu singular valor de signo?- É a semelhança. Ele significa na medida em que tem semelhança com o que indica (isto é, com uma similitude).

Contudo, não é a homologia que ele assinala, pois seu ser distinto de assinalação se desvaneceria no semelhante de que é signo; trata-se de outra semelhança, uma similitude vizinha e de outro tipo que serve para reconhecer a primeira, mas que, por sua vez, é patenteada por uma terceira.

Toda semelhança recebe uma assinalação; essa assinalação, porém, é apenas uma forma intermediária da mesma semelhança.

De tal sorte que o conjunto das marcas faz deslizar, sobre o círculo das similitudes, um segundo círculo que duplicaria exatamente e, ponto por ponto, o primeiro,

  • se não fosse esse pequeno desnível que faz com que
    • o signo da simpatia resida na analogia,
    • o da analogia na emulação,
    • o da emulação na conveniência,
    • que, por sua vez, para ser reconhecida, requer a marca da simpatia…

A assinalação e o que ela designa

  • são exatamente da mesma natureza;
  • apenas a lei da distribuição a que obedecem é diferente; a repartição é a mesma.

Forma assinalante e forma assinalada são semelhanças, mas paralelas.

E é por isso, sem dúvida, que, no saber do século XVI,

  • a semelhança é o que há de mais universal;
  • ao mesmo tempo aquilo que há de mais visível,
  • mas que se deve, entretanto, buscar descobrir por ser o mais escondido;
  • o que determina a forma do conhecimento (pois só se conhece seguindo os caminhos da similitude)
  • e o que lhe garante a riqueza de seu conteúdo (pois, desde que soergamos os signos e olhemos o que eles indicam, deixamos vir às claras e cintilar na sua própria luz a própria Semelhança).

Chamemos hermenêutica ao conjunto de conhecimentos e de técnicas que permitem fazer falar os signos e descobrir seu sentido;

chamemos semiologia ao conjunto de conhecimentos e de técnicas que permitem distinguir onde estão os signos, definir o que os institui como signos, conhecer seus liames e as leis de seu encadeamento:

o século XVI superpôs

  • semiologia
  • e hermenêutica

na forma da similitude.

Buscar o sentido é trazer à luz o que se assemelha.

Buscar a lei dos signos é descobrir as coisas que são semelhantes.

A gramática dos seres é sua exegese.

E a linguagem que eles falam não narra outra coisa senão a sintaxe que os liga.

A natureza das coisas, sua coexistência, o encadeamento que as vincula e pelo que se comunicam não é diferente de sua semelhança. E esta só aparece na rede de signos que, de um extremo ao outro, percorre o mundo.

A “natureza” está inserida na fina espessura que mantém, uma acima da outra, semiologia e hermenêutica;

  • ela só é misteriosa e velada, só se oferece ao conhecimento por ela às vezes confundido,
  • na medida em que essa superposição não se faz sem um ligeiro desnível das semelhanças.

De imediato, o crivo não é claro; a transparência se acha turva desde o primeiro lance. Aparece um espaço sombrio que será necessário progressivamente aclarar.

É aí que está a “natureza” e é isso que é mister aplicar-se a conhecer.

Tudo seria imediato e evidente

  • se a hermenêutica da semelhança
  • e a semiologia das assinalações coincidissem sem a menor oscilação.

Mas, posto que há um “vão” entre

  • as similitudes que formam grafismo
  • e as que formam discurso,

o saber e seu labor infinito recebem aí o espaço que lhes é próprio: terão que sulcar essa distância indo, por um ziguezague indefinido, do semelhante ao que lhe é semelhante.

I. As quatro similitudes

Capítulo II. A prosa do mundo; tópico I. As quatro similitudes

Até o fim do século XVI, a semelhança desempenhou um papel construtor no saber da cultura ocidental.

  • Foi ela que, em grande parte, conduziu a exegese e a interpretação dos textos:
  • foi ela que organizou o jogo dos símbolos, permitiu o conhecimento das coisas visíveis e invisíveis, guiou a arte de representá-las.

O mundo enrolava-se sobre si mesmo:

  • a terra repetindo o céu, os rostos mirando-se nas estrelas e a erva envolvendo nas suas hastes os segredos que serviam ao homem. A pintura imitava o espaço.

E a representação – fosse ela festa ou saber – se dava como repetição: teatro da vida ou espelho do mundo, tal era o título de toda linguagem, sua maneira de anunciar-se e de formular seu direito de falar.

É preciso nos determos um pouco nesse momento do tempo em que a semelhança desfará sua dependência para com o saber e desaparecerá, ao menos em parte, do horizonte do conhecimento.

No fim do século XVI, no começo ainda do século XVII, como era pensada a similitude?

Como podia ela organizar as figuras do saber?

E se é verdade que as coisas que se assemelhavam eram em número infinito, podem-se, ao menos, estabelecer as formas segundo as quais era possível ocorrer-lhes serem semelhantes umas às outras?

A trama semântica da semelhança no século XVI é muito rica: Amicitia, Aequalitas (contractus, consensus, matrimonium, societas, pax et similia), Consonantia, Concertus, Continuum, Paritas, Proportio, Similitudo, Conjunctio, Copula (1).

E há ainda muitas outras noções que, na superfície do pensamento, se entrecruzam, se imbricam, se reforçam ou se limitam. Por ora, basta indicar as principais figuras que prescrevem suas articulações ao saber da semelhança. Dentre elas há quatro seguramente essenciais.

  • Similitude
    1. Convenientia;
    2. Aemulatio;
    3. Analogia;
    4. Simpatias – antipatias

Primeiro, a convenientia.

Na verdade, por esta palavra é designada com mais força a vizinhança dos lugares que a similitude. São “convenientes” as coisas que, aproximando-se umas das outras, vêm a se emparelhar; tocam-se nas bordas, suas franjas se misturam, a extremidade de uma designa o começo da outra. Desse modo, comunica-se o movimento, comunicam-se as influências e as paixões, e também as propriedades.

De sorte que, nessa articulação das coisas, aparece uma semelhança.

Dupla, desde que se tenta destrinchá-la:

  • semelhança do lugar, do local onde a natureza colocou as duas coisas, similitude, pois, de propriedades; pois, neste continente natural que é o mundo, a vizinhança não é uma relação exterior entre as coisas, mas o signo de um parentesco ao menos obscuro. E, depois, desse contato nascem por permuta novas semelhanças; um regime comum se impõe;
    • à similitude como razão surda da vizinhança,
    • superpõe-se uma semelhança que é o efeito visível da proximidade.

A alma e o corpo, por exemplo, são duas vezes convenientes:

  • foi preciso que o pecado tivesse tornado a alma espessa, pesada e terrestre, para que Deus a colocasse nas entranhas da matéria.
  • Mas, por essa vizinhança,
    • a alma recebe os movimentos do corpo e se assimila a ele,
    • enquanto o “corpo se altera e se corrompe pelas paixões da alma”(2).

Na vasta sintaxe do mundo, os diferentes seres se ajustam uns aos outros; a planta comunica com o animal, a terra com o mar, o homem com tudo o que o cerca.

A semelhança impõe vizinhanças que, por sua vez, asseguram semelhanças. O lugar e a similitude se imbricam:

  • vê-se crescer limos nos dorsos das conchas,
  • plantas nos galhos dos cervos,
  • espécies de ervas no rosto dos homens;
  • e o estranho zoófito justapõe, misturando-as, as propriedades que o tornam semelhante tanto à planta quanto ao animal(3).

São signos de conveniência.

A convenientia é uma semelhança ligada ao espaço na forma da “aproximação gradativa”. É da ordem da conjunção e do ajustamento.

Por isso pertence menos às próprias coisas que ao mundo onde elas se encontram.

O mundo é a “conveniência” universal das coisas;

  • há tantos peixes na água quanto sobre a terra animais ou objetos produzidos pela natureza ou pelos homens (não há peixes que se chamam Episcopus, outros Catena, outros Priapus?);
  • na água e sobre a superfície da terra, tantos seres quantos os há no céu e aos quais correspondem;
  • enfim, em tudo o que é criado, há tantos quantos se poderiam encontrar eminentemente contidos em Deus, “Semeador da Existência, do Poder, do Conhecimento e do Amor”(4).

Assim, pelo encadeamento da semelhança e do espaço, pela força dessa conveniência que avizinha o semelhante e assimila os próximos, o mundo constitui cadeia consigo mesmo. Em cada ponto de contato começa e acaba um elo que se assemelha ao precedente e se assemelha ao seguinte: e, de círculos em círculos, as similitudes prosseguem retendo os extremos na sua distância (Deus e a matéria), aproximando-os, de maneira que a vontade do Todo- Poderoso penetre até os recantos mais adormecidos.

É essa cadeia imensa, estendida e vibrante, essa corda da conveniência, que Porta evoca num texto de sua Magia natural:

“No tocante a sua vegetação, a planta convém com a besta bruta e, por sentimento, o animal brutal com o homem, que se conforma ao resto dos astros por sua inteligência; essa ligação procede tão apropriadamente que parece uma corda estendida desde a primeira causa até as coisas baixas e ínfimas, por uma ligação recíproca e contínua; de sorte que a virtude superior, expandindo seus raios, chegará a tal ponto que, se lhe tocarmos uma extremidade, tremerá e fará mover o resto.”(5)

A segunda forma da similitude é a aemulatio:

uma espécie de conveniência, mas que fosse liberada da lei do lugar e atuasse, imóvel, na distância.

Um pouco como se a conveniência espacial tivesse sido rompida, e os elos da cadeia, desatados, reproduzissem seus círculos longe uns dos outros, segundo uma semelhança sem contato.

Há na emulação algo do reflexo e do espelho: por ela, as coisas dispersas através do mundo se correspondem.

  • De longe, o rosto é o êmulo do céu
  • e, assim como o intelecto do homem reflete, imperfeitamente, a sabedoria de Deus,
  • assim os dois olhos, com sua claridade limitada, refletem a grande iluminação que, no céu, expandem o Sol e a Lua;
  • a boca é Vênus, pois que por ela passam os beijos e as palavras de amor;
  • o nariz dá a minúscula imagem do cetro de Júpiter e do caduceu de Mercúrio(6).

Por esta relação de emulação, as coisas podem se imitar de uma extremidade à outra do universo sem encadeamento nem proximidade:

  • por sua reduplicação em espelho, o mundo abole a distância que lhe é própria;
  • triunfa assim sobre o lugar que é dado a cada coisa.

Desses reflexos que percorrem o espaço, quais são os primeiros?

Onde a realidade, onde a imagem projetada?

Frequentemente não é possível dizê-lo, pois a emulação é uma espécie de geminação natural das coisas; nasce de uma dobra do ser, cujos dois lados imediatamente se defrontam. Paracelso compara essa duplicação fundamental do mundo à imagem de dois gêmeos

“que se assemelham perfeitamente, sem que seja possível a ninguém dizer qual deles trouxe ao outro sua similitude”(7).

No entanto, a emulação não deixa inertes, uma em face da outra, as duas figuras refletidas que ela opõe.

Pode ocorrer a uma ser mais fraca e acolher a forte influência daquela que vem refletir-se no seu espelho passivo.

As estrelas não têm primazia sobre as ervas da terra, das quais são o modelo sem mudança, a forma inalterável e sobre as quais lhes é dado verter secretamente toda a dinastia de suas influências? A terra sombria é o espelho do céu disseminado, mas, nesta contenda, os dois rivais não têm nem o mesmo valor nem a mesma dignidade. As luzes da erva, sem violência, reproduzem a forma pura do céu:

“As estrelas”, diz Crollius, “são a matriz de todas as ervas, e cada estrela do céu não é mais que a prefiguração espiritual de uma erva tal como a representa e, assim como cada erva ou planta é uma estrela terrestre olhando o céu, assim também cada estrela é uma planta celeste em forma espiritual, a qual só pela matéria é diferente das terrestres (…), as plantas e as ervas celestes estão viradas para o lado da terra e olham diretamente as ervas que elas procriaram, infundindo-lhes alguma virtude particular”(8).

Mas pode também ocorrer que a contenda permaneça aberta e que o calmo espelho não reflita mais que a imagem dos “dois soldados irritados”. A similitude torna-se então o combate de uma forma contra outra – ou melhor, de uma mesma forma separada de si pelo peso da matéria ou pela distância dos lugares.

O homem de Paracelso é, como o firmamento,

“constelado de astros”; mas não está a ele ligado como “o ladrão às galeras, o assassino ao suplício da roda, o peixe ao pescador, a caça ao caçador”.

Pertence ao firmamento do homem ser “livre e poderoso”, “não obedecer a ordem alguma”, “não ser regido por nenhuma das outras criaturas”. Seu céu interior pode ser autônomo e repousar somente em si mesmo, sob a condição, porém, de que, por sua sabedoria, que é também saber, ele se torne semelhante à ordem do mundo, a retome em si e faça assim equilibrar no seu firmamento interno aquele onde cintilam as estrelas visíveis.

Então, essa sabedoria do espelho envolverá, em troca, o mundo onde estava colocada; seu grande elo girará até o fundo do céu e mais além; o homem descobrirá que contém “as estrelas no interior de si mesmo (…), e que assim carrega o firmamento com todas as suas influências”(9).

A emulação apresenta-se de início sob a forma de um simples reflexo, furtivo, longínquo; percorre em silêncio os espaços do mundo.

Mas a distância que ela transpõe não é anulada por sua sutil metáfora; permanece aberta para a visibilidade. E, neste duelo, as duas figuras afrontadas se apossam uma da outra.

  • o semelhante envolve o semelhante,
  • que, por sua vez, o cerca
  • e, talvez, será novamente envolvido por uma duplicação
  • que tem o poder de prosseguir ao infinito.

Os elos da emulação não formam uma cadeia como os elementos da conveniência: mas, antes, círculos concêntricos, refletidos e rivais.

Terceira forma da similitude, a analogia.

Velho conceito, familiar já à ciência grega e ao pensamento medieval, mas cujo uso se tornou provavelmente diferente.

Nessa analogia superpõem-se

  • convenientia
  • e aemulatio.

Como esta, assegura o maravilhoso afrontamento das semelhanças através do espaço; mas fala, como aquela, de ajustamentos, de liames e de juntura.

Seu poder é imenso, pois as similitudes que executa não são aquelas visíveis, maciças, das próprias coisas; basta serem as semelhanças mais sutis das relações.

Assim alijada, pode tramar, a partir de um mesmo ponto, um número indefinido de parentescos.

A relação, por exemplo,

  • dos astros
  • com o céu onde cintilam,

reencontra-se igualmente:

  • na da erva com a terra,
  • dos seres vivos com o globo onde habitam,
  • dos minerais e dos diamantes com as rochas onde se enterram
  • dos órgãos dos sentidos com o rosto que animam,
  • das manchas da pele com o corpo que elas marcam secretamente.

Uma analogia pode também se voltar sobre si mesma sem ser por isso contestada.

A velha analogia da planta com o animal

(o vegetal é um animal que se sustenta com a cabeça para baixo, a boca – ou as raízes – entranhada na terra),

Césalpin não a critica nem a põe de parte; reforça-a, ao contrário, multiplica-a por ela própria, quando descobre que a planta é um animal de pé, cujos princípios nutritivos sobem de baixo para cima, ao longo de uma haste que se estende como um corpo e se completa por uma cabeça – ramalhete, flores, folhas: relação inversa mas não contraditória com a analogia primeira, que coloca “a raiz na parte inferior da planta, a haste na parte superior, pois, nos animais, a rede venosa começa também na parte inferior do ventre e a veia principal sobe para o coração e a cabeça”10.

Tanto essa reversibilidade como esta polivalência conferem à analogia um campo universal de aplicação. Por ela, todas as figuras do mundo podem se aproximar.

Existe, entretanto, nesse espaço sulcado em todas as direções, um ponto privilegiado: é saturado de analogias (cada uma pode aí encontrar um de seus pontos de apoio) e, passando por ele, as relações se invertem sem se alterar.

Esse ponto é o homem; ele está em proporção com o céu, assim como com os animais e as plantas, assim como com a terra, os metais, as estalactites ou as tempestades.

Erguido entre as faces do mundo, tem relação com o firmamento

(seu rosto está para seu corpo como a face do céu está para o éter; seu pulso bate-lhe nas veias como os astros circulam segundo suas vias próprias; as sete aberturas formam no seu rosto o que são os sete planetas do céu);

todas essas relações, porém, ele as desloca e as reencontramos, similares, na analogia do animal humano com a terra que habita:

sua carne é uma gleba, seus ossos, rochedos, suas veias, grandes rios; sua bexiga é o mar e seus sete membros principais, os sete metais que se escondem no fundo das minas (11).

O corpo do homem é sempre a metade possível de um atlas universal. Sabe-se como Pierre Belon traçou, até nos detalhes, a primeira tábua comparada do esqueleto humano com o dos pássaros: ali se vê

“a ponta da asa chamada apêndice, que está em proporção com a asa, com o polegar, com a mão; a extremidade da ponta da asa, que é como nossos dedos (…); o osso, tido como pernas para os pássaros, correspondendo ao nosso calcanhar; assim como temos quatro dedos pequenos nos pés, assim os pássaros têm quatro dedos, dos quais o de trás tem proporção semelhante à do dedo grande do nosso pé”(12).

Tanta precisão só constitui anatomia comparada para um olhar munido dos conhecimentos do século XIX.

Ocorre que o crivo pelo qual deixamos chegar ao nosso saber as figuras da semelhança recobre nesse ponto (e quase somente nesse ponto) aquele que o saber do século XVI dispusera sobre as coisas.

Mas a descrição de Belon, a bem dizer, só procede da positividade que, em sua época, a tornou possível.

  • Ela não é mais racional nem mais científica que certa observação de Aldrovandi, quando ele compara as partes inferiores do homem aos lugares infectos do mundo, ao Inferno, às suas trevas, aos condenados que são como excrementos do Universo(13);
  • ela pertence à mesma cosmografia analógica que a comparação, clássica na época de Crollius, entre a apoplexia e a tempestade: a borrasca começa quando o ar se toma pesado e se agita, a crise, no momento em que os pensamentos se tornam pesados, inquietos; depois as nuvens se acumulam, o ventre incha, o trovão estronda e a bexiga se rompe; os relâmpagos fulminam enquanto os olhos brilham com um fulgor terrível, a chuva cai, a boca espuma, o raio deflagra enquanto os espíritos fazem rebentar a pele; mas eis que o tempo se torna claro e a razão se restabelece no doente(14).

O espaço das analogias é, no fundo, um espaço de irradiação. Por todos os lados, o homem é por ele envolvido; mas esse mesmo homem, inversamente, transmite as semelhanças que recebe do mundo. Ele é’ o grande fulcro das proporções – o centro onde as relações vem se apoiar e donde são novamente refletidas.

Enfim, a quarta forma da semelhança é assegurada pelo jogo das simpatias.

Nela nenhum caminho é de antemão determinado, nenhuma distância é suposta, nenhum encadeamento prescrito.

A simpatia atua em estado livre nas profundezas do mundo. Em um instante percorre os espaços mais vastos:

  • do planeta ao homem que ela rege, a simpatia desaba de longe como o raio;
  • ela pode nascer, ao contrário, de um só contato – como essas “rosas fúnebres que servirão num funeral”, que, pela simples vizinhança com a morte, tornam “triste e agonizante” (15) toda pessoa que respirar seu perfume.

Mas é tal seu poder, que ela não se contenta em brotar de um único contato e em percorrer os espaços; suscita o movimento das coisas no mundo e provoca a aproximação das mais distantes.

Ela é princípio de mobilidade:

  • atrai o que é pesado para o peso do solo e o que é leve para o éter sem peso;
  • impele as raízes para a água e faz girar com a curva do sol a grande flor amarela do girassol.

Mais ainda,

atraindo as coisas umas às outras por um movimento exterior e visível,

suscita em segredo um movimento interior – um deslocamento de qualidades que se substituem mutuamente:

  • o fogo, porque quente e leve,
  • se eleva no ar, para o qual as chamas infatigavelmente se erguem;
  • perde, porém, sua própria secura (que o aparentava à terra)
  • e adquire assim certa umidade (que o liga à água e ao ar);
  • desaparece então em ligeiro vapor, em fumaça azul, em nuvem: tornou-se ar.

A simpatia é uma instância do Mesmo tão forte e tão contumaz que não se contenta em ser uma das formas do semelhante;

  • tem o perigoso poder de assimilar,
  • de tornar as coisas idênticas umas às outras,
  • de misturá-las,
  • de fazê-las desaparecer em sua individualidade – de torná-las, pois, estranhas ao que eram.

A simpatia transforma. Altera, mas na direção do idêntico, de sorte que, se seu poder não fosse contrabalançado, o mundo se reduziria a um ponto, a uma massa homogênea, à morna figura do Mesmo:

todas as suas partes se sustentariam e se comunicariam entre si sem ruptura nem distância, como elos de metal suspensos por simpatia à atração de um único ímã(16).

Eis por que a simpatia é compensada por sua figura gêmea, a antipatia.

Esta mantém as coisas em seu isolamento e impede a assimilação; encerra cada espécie na sua diferença obstinada e na sua propensão a perseverar no que é:

“É assaz conhecido que as plantas têm ódio entre si… diz-se que a oliveira e a videira odeiam a couve; o pepino foge da oliveira… Sabendo-se que seu crescimento se deve ao calor do sol e à umidade da terra, é necessário que toda árvore opaca e espessa – assim como aquela que tem várias raízes – seja perniciosa às outras”(17)

Assim, infinitamente, através do tempo, os seres do mundo se odiarão e manterão, contra toda simpatia, seu feroz apetite.

“O rato da Índia é pernicioso ao crocodilo, pois a natureza lho deu por inimigo; de sorte que, quando esse violento animal se deita ao sol, ele lhe arma uma emboscada e astúcia mortal; percebendo que o crocodilo, adormecido em suas delícias, dorme com a goela aberta, entra por ela e desliza pela ampla garganta até o seu ventre, rói-lhe as entranhas e sai enfim pelo ventre do animal morto.”

Mas os inimigos do rato, por sua vez, o espreitam: pois está em discórdia com a aranha e, “combatendo frequentemente com o áspide, morre”.

Por este jogo de antipatia que as dispersa tanto quanto as atrai ao combate, torna-as mortíferas e as expõe, por sua.vez, à morte, sucede que as coisas e os animais e todas as figuras do mundo permanecem o que são.

A identidade das coisas, o fato de que possam assemelhar-se a outras e aproximar-se delas, sem contudo se dissiparem, preservando sua singularidade, é o contrabalançar constante da simpatia e da antipatia que o garante. Explica que as coisas cresçam, se desenvolvam, se misturem, desapareçam, morram, mas indefinidamente se reencontrem; em suma,

  • que haja um espaço (não, porém, sem referência nem repetição, sem amparo de similitude)
  • e um tempo (que deixa, porém, reaparecer indefinidamente as mesmas figuras, as mesmas espécies, os mesmos elementos).

“Conquanto em si mesmos os quatro corpos (água, ar, fogo, terra) sejam simples e tenham suas qualidades distintas, todavia o Criador ordenou que de elementos misturados seriam compostos os corpos elementares, razão pela qual suas conveniências e discordâncias são notórias, o que se conhece pelas suas qualidades. O elemento do fogo é quente e seco; tem, portanto, antipatia pelos da água, que é fria e úmida. O ar quente é úmido, a terra fria é seca, eis a antipatia. Para conciliá-los, o ar foi colocado entre o fogo e a água, a água, entre a terra e o ar. Enquanto é quente, o ar se avizinha do fogo e sua umidade se acomoda com a da água. Ademais, porque sua umidade é temperada, modera o calor do fogo de que também recebe ajuda, assim como, de outro lado, por seu calor medíocre, amorna a frieza úmida da água. A umidade da água é aquecida pelo calor do ar e abranda a fria secura da terra.”(18)

A soberania do par simpatia – antipatia, o movimento e a dispersão que ele prescreve dão lugar a todas as formas da semelhança.

Assim se encontram retomadas e explicadas as três primeiras similitudes.

Todo o volume do mundo,

  • todas as vizinhanças da conveniência,
  • todos os ecos da emulação,
  • todos os encadeamentos da analogia

são suportados, mantidos e duplicados por esse espaço da simpatia e da antipatia que não cessa de aproximar as coisas e de mantê-las a distância.

Através desse Jogo, o mundo permanece idêntico;

  • as semelhanças continuam a ser o que são
  • e a se assemelharem.

O mesmo persiste o mesmo, trancafiado sobre si.

 
 

VI. Máthêsis e Taxinomia

Capítulo III. Representar; tópico VI. Máthêsis e Taxinomia

  • Projeto de uma ciência geral da ordem; 
  • teoria dos signos analisando a representação; 
  • disposição em quadros ordenados das identidades e das diferenças: 

assim se constituiu na idade clássica um espaço de empiricidade que 

  • não existira até o fim do Renascimento 
  • e que estava condenado a desaparecer desde o início do século XIX. 

Ele é para nós, hoje, tão difícil de restituir e tão profundamente recoberto pelo sistema de positividades a que pertence nosso saber que, durante muito tempo, passou despercebido. 

Deformamo-lo, e mascaramo-lo através de categorias ou de uma distribuição que são nossas. 

Pretende-se reconstituir, ao que parece, o que foram nos séculos XVII e XVIII as “ciências da vida”, da “natureza” ou do “homem”. 

Esquece-se simplesmente que nem o homem, nem a vida, nem a natureza são domínios que se oferecem espontânea e passivamente à curiosidade do saber. 

  • O que torna possível o conjunto da epistémê clássica é, primeiramente, a relação a um conhecimento da ordem. 
  • Quando se trata de ordenar as naturezas simples, recorre-se a uma máthêsis cujo método universal é a Álgebra. 
  • Quando se trata de pôr em ordem naturezas complexas (as representações em geral, tais como são dadas na experiência), é necessário constituir uma taxinomia e, para tanto, instaurar um sistema de signos. 

Os signos estão para a ordem das naturezas compostas como a álgebra está para a ordem das naturezas simples.

Mas, na medida em que 

as representações empíricas devem ser suscetíveis de se analisar como naturezas simples, vê-se que a taxinomia se reporta inteiramente à máthêsis; 

em contrapartida, posto que a percepção das evidências é apenas um caso particular da representação em geral, pode-se dizer igualmente que a máthêsis não é mais do que um caso particular da taxinomia. 

Do mesmo modo, 

os signos que o próprio pensamento estabelece constituem como que uma álgebra das representações complexas; 

e a álgebra, inversamente, é um método para conferir signos às naturezas simples e para operar sobre esses signos. 

Tem-se, pois, a seguinte disposição: Mas não é tudo. 

A taxinomia implica, ademais, um certo continuum das coisas (uma não-descontinuidade, uma plenitude do ser) e uma certa potência da imaginação, que faz aparecer o que não é, mas permite, por isso mesmo, trazer à luz o contínuo. 

A possibilidade de uma ciência das ordens empíricas requer, pois, uma análise do conhecimento – análise que deverá mostrar de que modo a continuidade escondida (e como que confusa) do ser pode reconstituir-se através do liame temporal de representações descontínuas. 

Daí a necessidade, sempre manifestada ao longo da idade clássica, de interrogar a origem dos conhecimentos. De fato, essas análises empíricas não se opõem ao projeto de uma máthêsis universal, como um ceticismo a um racionalismo; elas eram envolvidas nos requisitos de um saber que não se dá mais como experiência do Mesmo, mas como estabelecimento da Ordem. 

Nas duas extremidades da epistémê clássica, tem-se, portanto 

  • uma máthêsis como ciência da ordem calculável 
  • e uma gênese como análise da constituição das ordens a partir de sequências empíricas. 

De um lado, utilizam-se os símbolos das operações possíveis sobre identidades e diferenças; 

de outro, analisam-se as marcas progressivamente depositadas pela semelhança das coisas e as recorrências da imaginação. 

  • Entre a máthêsis e a gênese estende-se a região dos signos – signos que atravessam todo o domínio da representação empírica, mas que jamais a transbordam. 
  • Margeado pelo cálculo e pela gênese, está o espaço do quadro. 
  • Nesse saber, trata-se de afetar com um signo tudo o que pode nos oferecer nossa representação:
    • percepções,
    • pensamentos,
    • desejos; 
  • esses signos devem valer como caracteres, isto é, articular o conjunto da representação em plagas distintas, separadas umas das outras por traços assinaláveis; 
  • autorizam, assim, o estabelecimento de um sistema simultâneo, segundo o qual as representações enunciam sua proximidade e seu afastamento, sua vizinhança e suas distâncias –
    • portanto, a rede que,
      • fora da cronologia, 
      • manifesta seu parentesco e restitui num espaço permanente suas relações de ordem. 

Por essa forma pode-se delinear o quadro das identidades e das diferenças. 

É nessa região que se encontra a história natural ciência dos caracteres que articulam a continuidade da natureza e sua imbricação. 

Nessa região também se encontra a teoria da moeda e do valor – ciência dos signos que autorizam a troca e permitem estabelecer equivalências entre as necessidades ou os desejos dos homens. 

Aí, enfim, se aloja a Gramática geral, ciência dos signos pelos quais os homens reagrupam a singularidade de suas percepções e recortam o movimento contínuo de seus pensamentos. 

Apesar das suas diferenças, esses três domínios só existiram na idade clássica, na medida em que o espaço fundamental do quadro se instaurou entre 

  • o cálculo das igualdades 
  • e a gênese das representações. 

Vê-se que estas três noções – 

  • máthêsis, 
  • taxinomia, 
  • gênese 

– designam menos domínios separados que uma rede sólida de interdependências que define a configuração geral do saber na época clássica. 

A taxinomia não se opõe à máthêsis: aloja-se nela e dela se distingue; pois ela também é uma ciência da ordem – uma máthêsis qualitativa. 

Entendida, porém, no sentido estrito, a máthêsis é ciência das igualdades, portanto, das atribuições e dos juízos; é a ciência da verdade; 

já a taxinomia trata das identidades e das diferenças; é a ciência das articulações e das classes; é o saber dos seres. 

Da mesma forma, a gênese se aloja no interior da taxinomia, ou ao menos encontra nela sua possibilidade primeira.  

Mas a taxinomia estabelece o quadro das diferenças visíveis; a gênese supõe uma série sucessiva; uma trata os signos na sua simultaneidade espacial, como uma sintaxe; a outra os reparte num análogon do tempo, como uma cronologia. 

Em relação à máthêsis, a taxinomia funciona como uma ontologia em face de uma apofântica; em face da gênese, funciona como uma semiologia em face de uma história. 

Ela define, pois, a lei geral dos seres e, ao mesmo tempo, as condições sob as quais é possível conhecê-los. 

Daí o fato de que a teoria dos signos na época clássica tenha podido sustentar ao mesmo tempo 

  • uma ciência de feição dogmática que se apresentava como o conhecimento da própria natureza, 
  • e uma filosofia da representação que, no decurso do tempo, se tornou cada vez mais nominalista e cada vez mais cética. 

Daí também o fato de que semelhante disposição tenha desaparecido a ponto de as eras posteriores perderem até a memória de sua existência: 

é que, após a crítica kantiana e tudo o que se passou na cultura ocidental do fim do século XVIII, uma divisão de um novo tipo se instaurou: 

  • de um lado, a máthêsis se reagrupou, constituindo uma apofântica e uma ontologia; é ela que até nossos dias reinou sobre as disciplinas formais; 
  • de outro lado, a história e a semiologia (esta absorvida, de resto, por aquela) se reuniram nessas disciplinas da interpretação que estenderam seu poder de Schleiermacher a Nietzsche e a Freud. 

Em todo o caso, a epistémê clássica pode se definir, na sua mais geral disposição, 

  • pelo sistema articulado de uma máthêsis, 
  • de uma taxinomia 
  • e de uma análise genética. 

As ciências trazem sempre consigo o projeto mesmo longínquo de uma exaustiva colocação em ordem: apontam sempre para a descoberta de elementos simples e de sua composição progressiva; e, no meio deles, elas formam quadro, exposição de conhecimentos, num sistema contemporâneo de si próprio. 

O centro do saber, nos séculos XVII e XVIII, é o quadro. Quanto aos grandes debates que ocuparam a opinião, alojam- se muito naturalmente nas dobras dessa organização. 

Pode-se perfeitamente escrever uma história do pensamento na época clássica, tomando esses debates como pontos de partida ou como temas. Mas não se fará então mais que a história das opiniões, isto é, das escolhas operadas segundo os indivíduos, os meios, os grupos sociais; e é todo um método de inquirição que está implicado. 

Se se quiser empreender uma análise arqueológica do próprio saber, então não são esses debates célebres que devem servir de fio condutor e articular o propósito. É preciso reconstituir o sistema geral de pensamento, cuja rede, em sua positividade, toma possível um jogo de opiniões simultâneas e aparentemente contraditórias. É essa rede que define as condições de possibilidade de um debate ou de um problema, é ela a portadora da historicidade do saber. 

Se o mundo ocidental debateu-se para saber se a vida era apenas movimento ou se a natureza era bastante ordenada para provar Deus, não é porque um problema fora aberto; é porque, após ter dispersado o círculo indefinido dos signos e das semelhanças, e antes de organizar as séries da causalidade e da história, a epistémê da cultura ocidental abriu um espaço em quadro que ela não cessou de percorrer desde as formas calculáveis da ordem até a análise das mais complexas representações. 

E desse percurso, percebe-se o sulco na superfície histórica dos temas, dos debates, dos problemas e das preferências de opinião. 

Os conhecimentos atravessaram de ponta a ponta um “espaço de saber” que havia sido disposto de uma só vez, no século XVII, e que só devia ser encerrado 150 anos mais tarde. 

Desse espaço em quadro, cumpre empreender agora a análise, lá onde ele aparece sob sua mais clara forma, isto é, 

  • na teoria da linguagem, 
  • da classificação 
  • e da moeda. 

Objetar-se-á talvez que o simples fato de querer analisar, ao mesmo tempo e num só movimento, 

  • a gramática geral, 
  • a história natural 
  • e a economia, 

reportando-as a uma teoria geral dos signos e da representação, supõe uma questão que só pode vir de nosso século. 

Sem dúvida, a idade clássica, não mais que qualquer outra cultura, pôde circunscrever ou nomear o sistema geral de seu saber. Mas esse sistema foi suficientemente constringente para que as formas visíveis dos conhecimentos nele esboçassem por si próprias os seus parentescos, como se os métodos, os conceitos, os tipos de análise, as experiências adquiridas, os espíritos e finalmente os próprios homens se tivessem deslocado ao sabor de uma rede fundamental que definia a unidade implícita mas inevitável do saber. 

Desses deslocamentos, a história mostrou mil exemplos. Trajeto tantas vezes percorrido entre a teoria do conhecimento, a dos signos e a da gramática: 

Port-Royal deu 

  • sua Gramática em complemento e como que em seqüência natural
  •  da sua Lógica, 
  • à qual se liga por uma comum análise dos signos; 

Condillac, Destutt de Tracy, Gerando articularam, uma com outra, a decomposição do conhecimento em suas condições ou “elementos” e a reflexão sobre esses signos de que a linguagem só constitui a aplicação e o uso mais visíveis. 

Trajeto também entre a análise da representação e dos signos e a da riqueza; 

  • Quesnay, o fisiocrata, escreveu um artigo “Evidência” para a Enciclopédia; 
  • Condillac e Destutt colocaram na linha de sua teoria do conhecimento e da linguagem a do comércio e da economia que tinha para eles valor de política e também de moral; 
  • sabe-se que Turgot escreveu o artigo “Etimologia” da Enciclopédia e o primeiro paralelo sistemático entre a moeda e as palavras; 
  • que Adam Smith escreveu, além de sua grande obra econômica, um ensaio sobre a origem das línguas. 

Trajeto entre a teoria das classificações naturais e as da linguagem: 

  • Adanson não pretendeu somente criar uma nomenclatura ao mesmo tempo artificial e coerente no domínio da botânica; tinha em vista (e aplicou-a em parte) toda uma reorganização da escrita em função dos dados fonéticos da linguagem; 
  • Rousseau deixou, entre suas obras póstumas, elementos de botânica e um tratado sobre a origem das línguas. 

Assim se delineava, como em pontilhado, a grande rede do saber empírico: a das ordens não-quantitativas. 

E talvez a unidade recuada, mas insistente de uma Taxinomia universalis apareça com toda a clareza em Lineu, quando ele projeta encontrar, em todos os domínios concretos da natureza ou da sociedade, as mesmas distribuições e a mesma ordem(22). 

O limite do saber seria a transparência perfeita das representações nos signos que as ordenam.

V. A imaginação da semelhança

Capítulo III. Representar; tópico V. A imaginação da semelhança

Eis, pois, os signos, libertos de todo esse fervilhar do mundo onde o Renascimento os havia outrora repartido. 

Estão doravante alojados no interior da representação, no interstício da ideia, nesse tênue espaço onde ela joga consigo mesma, decompondo-se e recompondo-se. 

Quanto à similitude, só lhe resta agora sair do domínio do conhecimento. É o empírico sob sua mais rude forma; já não podemos “olhá-la como fazendo parte da filosofia”(19) a menos que seja desvanecida na sua inexatidão de semelhança e transformada pelo saber numa relação de igualdade ou de ordem. 

E todavia, para o conhecimento, a similitude é uma indispensável moldura. Pois uma igualdade ou uma relação de ordem não pode ser estabelecida entre duas coisas, senão quando sua semelhança tenha sido ao menos a ocasião de compará-las: 

  • Hume colocava a relação de identidade entre aquelas, “filosóficas”, que supõem a reflexão; 
  • já a semelhança pertencia, para ele, às relações naturais, àquelas que constrangem nosso espírito segundo uma “força calma” mas inevitável(20). 

“Que o filósofo se arrogue a precisão quando queira… ouso contudo desafiá-lo a dar um só passo em sua carreira sem a ajuda da semelhança. Que se lance um olhar sobre a face metafisica das ciências, mesmo as menos abstratas; e que me digam se as induções gerais que se tiram dos fatos particulares, ou, antes, se os próprios gêneros, as espécies e todas as noções abstratas podem formar-se de outro modo senão por meio da semelhança.”(21) 

Na orla exterior do saber, a similitude é essa forma somente esboçada, esse rudimento de relação que o conhecimento deve recobrir em toda a sua extensão, mas que, indefinidamente, permanece por sob ele, à maneira de uma necessidade muda e indelével. 

Como no século XVI, semelhança e signo se interpelam fatalmente. Mas de um modo novo. 

Em vez de precisar de uma marca para que seja desvendado seu segredo, 

a similitude é agora o fundo indiferenciado, movediço, instável, sobre o qual o conhecimento pode estabelecer suas relações, suas medidas e suas identidades. 

Dupla reviravolta por conseguinte: 

  • porque é o signo e, com ele, todo o conhecimento discursivo que exigem um fundo de similitude, 
  • e porque não se trata mais de manifestar um conteúdo prévio ao conhecimento, mas de dar um conteúdo que possa oferecer um lugar de aplicação às formas do conhecimento. 

Enquanto no século XVI a semelhança era a relação fundamental do ser consigo mesmo e a dobradura do mundo, 

na idade clássica ela é a mais simples forma sob a qual aparece o que se deve conhecer e que está mais afastado do próprio conhecimento. 

É por ela que a representação pode ser conhecida, isto é, comparada com as que podem ser similares, analisada em elementos (em elementos que lhe são comuns com outras representações), combinada com as que podem apresentar identidades parciais e distribuídas finalmente num quadro ordenado. 

A similitude na filosofia clássica (isto é, numa filosofia da análise) desempenha um papel simétrico ao que a diversidade assegurará no pensamento crítico e nas filosofias do juízo. 

Nessa posição de limite e de condição (aquilo sem o que e aquém do que não se pode conhecer), a semelhança se situa do lado da imaginação ou, mais exatamente, ela só aparece em virtude da imaginação, e a imaginação, em troca, só se exerce apoiando-se nela. 

Com efeito, se se supõem, na cadeia ininterrupta da representação, impressões por mais simples que sejam, e se não houvesse entre elas o menor grau de semelhança, não haveria nenhuma possibilidade para que a segunda lembrasse a primeira, a fizesse reaparecer e autorizasse assim sua reapresentação no imaginário; as impressões se sucederiam na mais total diferença: tão total que não poderia sequer ser percebida, visto que uma representação jamais teria ensejo de se estabelecer num lugar, de ressuscitar outra mais antiga e de se justapor a ela para dar lugar a uma comparação; a tênue identidade necessária a toda diferenciação sequer seria dada. A mudança perpétua se desenrolaria sem referência na perpétua monotonia. 

Mas, se não houvesse na representação o obscuro poder de tornar novamente presente uma impressão passada, nenhuma jamais apareceria como semelhante a uma precedente ou dessemelhante dela. 

Esse poder de lembrar implica ao menos a possibilidade de fazer aparecer como quase semelhantes (como vizinhas e contemporâneas, como existindo quase da mesma forma) duas impressões, das quais uma porém está presente enquanto a outra, desde muito talvez, deixou de existir. 

Sem imaginação não haveria semelhança entre as coisas. 

Vê-se o duplo requisito. 

É preciso que haja, nas coisas representadas, o murmúrio insistente da semelhança; 

é preciso que haja, na representação, o recôndito sempre possível da imaginação. 

E nem um nem outro desses requisitos pode dispensar aquele que o completa e lhe faz face. 

Daí duas direções de análise que se mantiveram ao longo de toda a idade clássica e não deixaram de se aproximar, para finalmente enunciarem, na última metade do século XVIII, sua verdade comum na Ideologia. 

  • De um lado, encontra-se a análise que explica a reversão da série de representações num quadro inatual mas simultâneo de comparações: 

análise da impressão, da reminiscência, da imaginação, da memória, de todo esse fundo involuntário que é como que a mecânica da imagem no tempo. 

  • De outro, há a análise que explica a semelhança das coisas – sua semelhança antes de sua ordenação, sua decomposição em elementos idênticos e diferentes, a repartição em quadro de suas similitudes desordenadas: 

por que, pois, as coisas se oferecem numa imbricação, numa mistura, num entrecruzamento, em que sua ordem essencial está confusa, mas bastante visível ainda para que transpareça sob forma de semelhanças, de similitudes vagas, de ocasiões alusivas para uma memória alerta? 

  • A primeira série de problemas corresponde grosso modo à analítica da imaginação, como poder positivo de transformar o tempo linear da representação em espaço simultâneo de elementos virtuais; 
  • a segunda corresponde grosso modo à análise da natureza, com as lacunas, as desordens, que confundem o quadro dos seres e o dispersam numa seqüência de representações que, vagamente e de longe, se assemelham. 

Ora, esses dois momentos opostos 

  • (um, negativo, da desordem da natureza nas impressões, 
  • outro, positivo, do poder de reconstituir a ordem a partir dessas impressões) 

encontram sua unidade na ideia de uma “gênese”. 

E isso de duas maneiras possíveis. 

Ou o momento negativo (o da desordem, da vaga semelhança) é atribuído à própria imaginação que exerce então, por si só, uma dupla função: se ela pode, apenas pela duplicação da representação, restituir a ordem, é na medida justamente em que ela impediria de perceber diretamente, e na sua verdade analítica, as identidades e as diferenças das coisas. O poder da imaginação é tão-somente o reverso ou a outra face de sua falha. Ela está, no homem, na juntura da alma com o corpo. Com efeito, é aí que Descartes, Malebranche, Spinoza a analisaram, ao mesmo tempo como lugar do erro e poder de aceder à verdade mesmo matemática; nela reconheceram o estigma da finitude, quer como signo de uma queda fora da extensão inteligível, quer como marca de uma natureza limitada. 

O momento positivo da imaginação, ao contrário, pode ser atribuído à semelhança turva, ao murmúrio vago das similitudes. É a desordem da natureza devida à sua própria história, a suas catástrofes, ou talvez simplesmente à sua pluralidade imbricada, que não é mais capaz de oferecer à representação senão coisas que se assemelham. De tal sorte que a representação, sempre acorrentada a conteúdos muito próximos uns dos outros, se repete, se recorda, dobra-se naturalmente sobre si, faz renascer impressões quase idênticas e engendra a imaginação. E nesse burburinho de uma natureza múltipla mas obscuramente e sem razão recomeçada, no fato enigmático de uma natureza que, antes de toda ordem, se assemelha a si mesma, que Condillac e Hume buscaram o liame entre a semelhança e a imaginação. 

Soluções estritamente opostas, mas que respondem ao mesmo problema. 

Compreende-se, em todo o caso, que o segundo tipo de análise tenha sido facilmente desenvolvido não fora mítica do primeiro homem (Rousseau) ou da consciência que desperta (Condillac) ou do espectador estranho jogado no mundo (Hume): essa gênese funcionava exatamente em lugar da própria Gênese. 

Ainda uma observação. 

Se as noções de natureza e de natureza humana tiveram na idade clássica uma certa importância, não é porque bruscamente se descobriu, como campo de pesquisas empíricas, essa potência surda, inesgotavelmente rica, a que se chama a natureza; não é também porque se isolou, no interior dessa vasta natureza, uma pequena região singular e complexa que seria a natureza humana. De fato, esses dois conceitos funcionam para assegurar a interdependência, o liame recíproco da imaginação e da semelhança. 

Decerto que a imaginação não é, em aparência, senão uma das propriedades da natureza humana, e a semelhança um dos efeitos da natureza. 

Mas, seguindo a rede arqueológica, que confere suas leis ao pensamento clássico, 

  • vê-se bem que a natureza humana se aloja nesse tênue extravasamento da representação que lhe permite se reapresentar 

(toda a natureza humana está aí: apenas estreitada ao exterior da representação para que se apresente de novo, no espaço branco que separa a presença da representação e o “re” de sua repetição);

  • e que a natureza não é mais do que o inapreensível tumulto da representação que faz com que a semelhança seja aí sensível antes que a ordem das identidades seja visível. 

Natureza e natureza humana permitem, na configuração geral da epistémê, o ajustamento da semelhança e da imaginação, que funda e torna possíveis todas as ciências empíricas da ordem.

  • No século XVI, a semelhança estava ligada a um sistema de signos; e era sua interpretação que abria o campo dos conhecimentos concretos. 
  • A partir do século XVII, a semelhança é repelida para os confins do saber, do lado de suas mais baixas e mais humildes fronteiras. Lá, ela se liga à imaginação, às repetições incertas, às analogias nebulosas. E, em vez de desembocar numa ciência da interpretação, implica uma gênese que ascende dessas formas rudes do Mesmo aos grandes quadros do saber desenvolvidos segundo as formas da identidade, da diferença e da ordem. 

O projeto de uma ciência da ordem, tal como foi fundado no século XVII, implicava que fosse ele duplicado por uma gênese do conhecimento, como o foi efetivamente, e sem interrupção, de Locke à Ideologia.

IV. A representação reduplicada

Capítulo III. Representar; tópico IV. A representação reduplicada

No entanto, a mais fundamental propriedade dos signos para a epistémê clássica não foi enunciada até o presente. 

Com efeito, que o signo possa ser 

  • mais ou menos provável, 
  • mais ou menos afastado daquilo que significa, 
  • que possa ser natural 
  • ou arbitrário sem que sua natureza ou seu valor de signo seja afetado por isso – 

tudo isso mostra bem que a relação do signo com seu conteúdo não é assegurada na ordem das próprias coisas. 

A relação do significante com o significado se aloja agora num espaço onde nenhuma figura intermediária assegura mais seu encontro: ela é, no interior do conhecimento, o liame estabelecido entre 

  • a ideia de uma coisa 
  • e a ideia de uma outra. 

A Lógica de Port-Royal o diz: 

“O signo encerra duas idéias, uma da coisa que representa, outra da coisa representada; e sua natureza consiste em excitar a primeira pela segunda.”(16) 

Teoria dual do signo, que se opõe sem equívoco à organização mais complexa do Renascimento; então, a teoria do signo implicava três elementos perfeitamente distintos: 

  • o que era marcado, 
  • o que era marcante 
  • e o que permitia ver nisto a marca daquilo; 

ora, este último elemento era a semelhança – o signo marcava na medida em que era “quase a mesma coisa” que o que ele designava. 

É esse sistema unitário e triplo que desaparece ao mesmo tempo que o “pensamento por semelhança”, e que é substituído por uma organização estritamente binária. 

Mas há uma condição para que o signo seja realmente essa pura dualidade. Em seu ser simples de ideia ou de imagem ou de percepção, associada ou substituída a uma outra, o elemento significante não é signo. 

Ele só se torna signo sob a condição de manifestar, além do mais, a relação que o liga àquilo que significa. 

É preciso que ele represente, mas que essa representação, por sua vez, se ache representada nele. 

Condição indispensável à organização binária do signo e que a Lógica de Port-Royal enuncia antes mesmo de dizer o que é um signo: 

“Quando só se olha certo objeto como representando outro, a ideia que dele se tem é uma ideia de signo e esse primeiro objeto se chama signo.”(17) 

A ideia significante se desdobra, porquanto à ideia que substitui outra se superpõe a ideia de seu poder representativo. 

Acaso não haveria três termos: a ideia significada, a ideia significante e, no interior desta, a ideia de seu papel de representação? 

Não se trata, porém, de um retorno sub-reptício a um sistema ternário. Trata-se antes de um desnível inevitável da figura com dois termos, que recua em relação a si mesma e vem alojar-se por inteiro no interior do elemento significante. 

De fato, o significante tem por conteúdo total, por função total e por determinação total somente aquilo que ele representa: 

  • ele lhe é inteiramente ordenado e transparente; 
  • mas esse conteúdo só é indicado numa representação que se dá como tal, 
  • e o significado se aloja sem resíduo e sem opacidade no interior da representação do signo. 

É característico que o exemplo primeiro de um signo que dá a Lógica de Port-Royal 

  • não seja nem a palavra, nem o grito, nem o símbolo, 
  • mas a representação espacial e gráfica – o desenho: mapa ou quadro. 

É que, com efeito, o quadro só tem por conteúdo o que ele representa e, no entanto, esse conteúdo só aparece representado por uma representação. 

A disposição binária do signo, tal como aparece no século XVII, substitui-se a uma organização que, de modos diferentes, era sempre ternária desde os estoicos e mesmo desde os primeiros gramáticos gregos; ora, essa disposição supõe que o signo é uma representação duplicada e reduplicada sobre si mesma. 

Uma ideia pode ser signo de outra 

  • não somente porque entre elas pode estabelecer-se um liame de representação, 
  • mas porque essa representação pode sempre se representar no interior da ideia que representa. 

Ou ainda porque, em sua essência própria, a representação é sempre perpendicular a si mesma: é, ao mesmo tempo, 

  • indicação e aparecer; 
  • relação a um objeto e manifestação de si. 

A partir da idade clássica, o signo é a representatividade da representação enquanto ela é representável. 

Isso tem conseqüências de grande peso. 

Primeiramente, a importância dos signos no pensamento clássico. 

Eles eram outrora meios de conhecer e chaves para um saber; são agora co-extensivos à representação, isto é, ao pensamento inteiro, alojam-se nele, percorrendo-o, porém, em toda a sua extensão: 

  • desde que uma representação esteja ligada a outra e represente em si mesma essa ligação, há signo; 
  • a ideia abstrata significa a percepção concreta donde ela foi formada (Condillac); 
  • a ideia geral é tão-somente uma ideia singular servindo de signos às outras (Berkeley); 
  • as imaginações são signos das percepções donde elas vieram (Hume, Condillac); 
  • as sensações são signos umas das outras (Berkeley, Condillac) 
  • e é possível finalmente que as próprias sensações (como em Berkeley) sejam os signos do que Deus nos quer dizer, o que delas faria como que os signos de um conjunto de signos. 

A análise da representação e a teoria dos signos se interpenetram de modo absoluto: 

  • e no dia em que a Ideologia, no fim do século XVIII, se interrogar sobre o primado que é preciso dar à ideia ou ao signo, 
  • no dia em que Destutt reprovar Gerando por ter elaborado uma teoria dos signos antes de ter definido a ideia(18), 

é que sua imediata interdependência já começará a anuviar-se e que a ideia e o signo cessarão de ser perfeitamente transparentes um ao outro.

Segunda conseqüência: essa extensão universal do signo no campo da representação exclui até a possibilidade de uma teoria da significação. 

Com efeito, interrogar-se sobre o que é a significação supõe que esta seja uma figura determinada na consciência. Mas, se os fenômenos nunca são dados senão numa representação que, em si mesma e por sua representatividade própria, é inteiramente signo, a significação não pode constituir problema. 

Mais ainda, ela nem sequer aparece. 

  • Todas as representações são ligadas entre si como signos; 
  • em conjunto, formam como que uma imensa rede; 
  • cada uma na sua transparência se dá como o signo daquilo que ela representa; 
  • e todavia – ou, antes, por isso mesmo – nenhuma atividade específica da consciência pode jamais constituir uma significação. 

É, sem dúvida, porque o pensamento clássico da representação exclui a análise da significação que nós, que só pensamos os signos a partir desta, temos tanta dificuldade, a despeito da evidência, em reconhecer que a filosofia clássica, de Malebranche à Ideologia, foi inteiramente uma filosofia do signo. 

Não há sentido exterior ou anterior ao signo; nenhuma presença implícita de um discurso prévio que seria necessário restituir para trazer à luz o sentido autóctone das coisas. 

Mas também não há ato constituinte da significação nem gênese interior à consciência. 

É que entre o signo e seu conteúdo não há nenhum elemento intermediário e nenhuma opacidade. Os signos não têm, pois, outras leis, senão aquelas que podem reger seu conteúdo: toda análise de signos é, ao mesmo tempo e de pleno direito, decifração do que eles querem dizer. 

Inversamente, a elucidação do significado nada mais será que a reflexão sobre os signos que o indicam. 

Como no século XVI, “semiologia” e “hermenêutica” se sobrepõem. Mas de uma forma diferente. Na idade clássica, elas não se reúnem mais no terceiro elemento da semelhança; ligam-se neste poder próprio da representação de representar-se a si mesma. 

Não haverá, pois, 

  • uma teoria dos signos 
  • diferente de uma análise do sentido. 

Entretanto, o sistema concede certo privilégio à primeira sobre a segunda; 

  • como ela não dá ao que é significado uma natureza diferente da que concede ao signo, 
  • o sentido não poderá ser mais que a totalidade dos signos desenvolvida em seu encadeamento;
    • ele se dará no quadro completo dos signos. 

Mas, por outro lado, a rede completa dos signos se liga e se articula de acordo com os cortes próprios ao sentido. O quadro dos signos será a imagem das coisas. Se o ser do sentido está inteiramente do lado do signo, o funcionamento está inteiramente do lado do significado. 

É por isso que a análise da linguagem, de Lancelot a Destutt de Tracy, faz-se a partir de uma teoria abstrata dos signos verbais e na forma de uma gramática geral: 

  • mas ela toma sempre por fio condutor o sentido das palavras; 
  • é por isso também que a história natural se apresenta como análise dos caracteres dos seres vivos, mas que, mesmo artificiais, as taxinomias têm sempre o projeto de se ajustar à ordem natural ou de dissociar-se dela o menos possível; 
  • é por isso que a análise das riquezas faz-se a partir da moeda e da troca, mas que o valor é sempre fundado na necessidade. 

Na idade clássica, a ciência pura dos signos vale como o discurso imediato do significado. 

Enfim, última conseqüência que se estende, sem dúvida, até nós: a teoria binária do signo, a que funda, desde o século XVII, toda a ciência geral do signo, está ligada, segundo uma relação fundamental, a uma teoria geral da representação. 

Se o signo é a pura e simples ligação de um significante com um significado (ligação que é arbitrária ou não, voluntária ou imposta, individual ou coletiva), de todo modo a relação só pode ser estabelecida no elemento geral da representação: o significante e o significado só são ligados na medida em que um e outro são (ou foram ou podem ser) representados e em que um representa atualmente o outro. 

Era, pois, necessário que a teoria clássica do signo desse a si própria, como fundamento e justificação filosófica, uma “ideologia”, isto é, uma análise geral de todas as formas da representação, desde a sensação elementar até a ideia abstrata e complexa. 

Era igualmente necessário que, reencontrando o projeto de uma semiologia geral, Saussure desse ao signo uma definição que pôde parecer “psicologista” (ligação de um conceito com uma imagem): é que, de fato, ele redescobria aí a condição clássica para pensar a natureza binária do signo.

III. A representação do signo

Capítulo III. Representar; tópico III. A representação do signo

Que é um signo na idade clássica? 

Pois o que mudou na primeira metade do século XVII e por longo tempo – talvez até hoje – 

  • é o regime inteiro dos signos, as condições sob as quais exercem eles sua estranha função; 
  • é aquilo que, dentre tantas outras coisas que sabemos ou que vemos, os erige de súbito como signos; 
  • é seu próprio ser. 

No limiar da idade clássica, o signo deixa de ser uma figura do mundo; deixa de estar ligado àquilo que ele marca por liames sólidos e secretos da semelhança ou da afinidade. 

O classicismo o define segundo três variáveis (11). 

  • A origem da ligação:
    • um signo pode ser natural (como o reflexo num espelho designa o que ele reflete) 
    • ou de convenção (como uma palavra, para um grupo de homens, pode significar uma ideia). 
  • O tipo da ligação:
    • um signo pode pertencer ao conjunto que ele designa (como a boa fisionomia que faz parte da saúde que ela manifesta) 
    • ou ser dele separado (como as figuras do Antigo Testamento são os signos longínquos da Encarnação e do Resgate). 
  • A certeza da ligação:
    • um signo pode ser tão constante que estamos seguros de sua fidelidade (é assim que a respiração designa a vida); 
    • mas ele pode ser simplesmente provável (como a palidez para a gravidez). 

Nenhuma dessas formas de ligação implica necessariamente a similitude; 

  • o próprio signo natural não a exige: os gritos são os signos espontâneos, mas não análogos, do medo; 
  • ou ainda, como diz Berkeley, as sensações visuais são signos do tato instaurados por Deus e, no entanto, não se lhe assemelham de maneira alguma(12). 

Essas três variáveis substituem a semelhança para definir a eficácia do signo no domínio dos conhecimentos empíricos. 

1. Uma vez que é sempre certo ou provável, o signo deve encontrar seu espaço no interior do conhecimento. 

No século XVI, considerava-se que os signos tinham sido depositados sobre as coisas para que os homens pudessem desvendar seus segredos, sua natureza ou suas virtudes; 

  • mas essa descoberta nada mais era que o fim último dos signos, a justificação de sua presença; 
  • era sua utilização possível, a melhor, sem dúvida; 
  • mas não tinham necessidade de ser conhecidos para existirem: mesmo se permanecessem silenciosos e se jamais alguém os percebesse, nada perdiam de sua consistência. 

Não era o conhecimento mas a linguagem mesma das coisas que os instaurava na sua função significante. 

A partir do século XVII, todo o domínio do signo se distribui entre o certo e o provável: isso quer dizer que não seria mais possível haver signo desconhecido, marca muda. 

Não que os homens estejam de posse de todos os signos possíveis. Mas, sim, que só há signo a partir do momento em que se acha conhecida a possibilidade de uma relação de substituição entre dois elementos já conhecidos. 

O signo não espera silenciosamente a vinda daquele que pode reconhecê-lo: ele só se constitui por um ato de conhecimento. 

É aqui que o saber rompe seu velho parentesco com a divinatio. 

Esta supunha sempre signos que lhe eram anteriores: de sorte que o conhecimento se alojava inteiramente na vaga de um signo descoberto, ou afirmado, ou secretamente transmitido. Tinha por tarefa fazer o levantamento de uma linguagem prévia distribuída por Deus no mundo; é nesse sentido que, por uma implicação essencial, ele adivinhava, e adivinhava o divino. 

Doravante, é no interior do conhecimento que o signo começará a significar: é dele que tirará sua certeza ou sua probabilidade. 

E, se Deus utiliza ainda signos para nos falar através da natureza, serve-se de nosso conhecimento e dos laços que se estabelecem entre as impressões, para instaurar no nosso espírito uma relação de significação. 

Tal é o papel do sentimento em Malebranche ou da sensação em Berkeley: no juízo natural, no sentimento, nas impressões visuais, na percepção da terceira dimensão, são conhecimentos apressados, confusos, mas prementes, inevitáveis e constringentes, que servem de signos a conhecimentos discursivos, que nós, porque não somos puros espíritos, já não temos a prerrogativa ou a permissão de atingir por nós mesmos e apenas pela força de nosso espírito. 

Em Malebranche e Berkeley, o signo gerido por Deus é a superposição sagaz e diligente de dois conhecimentos. Já não há aí divinatio – inserção do conhecimento no espaço enigmático, aberto e sagrado dos signos; mas um conhecimento conciso e concentrado em si mesmo: a centralização de uma longa seqüência de juízos na figura rápida do signo. 

Vê-se também como, por um movimento de retorno, o conhecimento, que encerrou os signos no seu espaço próprio, poderá agora abrir-se à probabilidade: de uma impressão a outra, a relação será de signo a significado, isto é, uma relação que, como na sucessão, se desdobrará da mais fraca probabilidade à maior certeza. 

“A conexão das idéias implica não a relação de causa a efeito mas somente a de um indício e de um signo à coisa significada. O fogo que se vê não é a causa da dor que sofro quando dele me aproximo: é o indício que me previne dessa dor.”(13) 

O conhecimento que adivinhava, por acaso, signos absolutos e mais antigos que ele, 

foi substituído por uma rede de signos construída passo a passo pelo conhecimento do provável. 

Hume tornou-se possível. 

2. Segunda variável do signo: a forma de sua ligação com o que ele significa. 

Pelo jogo da conveniência, da emulação e sobretudo da simpatia, a similitude no século XVI triunfava do espaço e do tempo: pois competia ao signo reduzir e reunir. 

Com o classicismo, ao contrário, o signo se caracteriza por sua essencial dispersão. O mundo circular dos signos convergentes é substituído por um desdobramento ao infinito. 

Nesse espaço, o signo pode ter duas posições: 

  • ou faz parte, a título de elemento, daquilo que ele serve para designar; 
  • ou é dele real e atualmente separado. 

Na verdade, essa alternativa não é radical; pois o signo, para funcionar, deve estar ao mesmo tempo inserido no que ele significa e dele distinto. 

Com efeito, para que o signo seja o que é, é preciso que ele seja dado ao conhecimento ao mesmo tempo que aquilo que ele significa. Como observa Condillac, um som não se tornaria jamais para uma criança o signo verbal de uma coisa, se não tivesse sido ouvido pelo menos uma vez, no momento em que essa coisa é percebida(14). 

Mas, para que um elemento de uma percepção possa tornar-se seu signo, não basta que dela faça parte; 

  • é preciso que seja distinguido a título de elemento e destacado da impressão global a que estava confusamente ligado; 
  • é necessário, pois, que esta seja dividida, que a atenção incida numa dessas regiões imbricadas que a compõem e que delas tenha sido isolada. 

A constituição do signo é, pois, inseparável da análise. 

  • É seu resultado já que, sem ela, não poderia aparecer. 
  • É também seu instrumento, já que, uma vez definido e isolado, ele pode ser reportado a novas impressões; 
  • e aí, desempenha em relação a elas como que o papel de um crivo. 

Porque o espírito analisa, o signo aparece. 

Porque o espírito dispõe de signos, a análise não cessa de prosseguir. 

Compreende-se por que de Condillac a Destutt de Tracy e a Gerando, a doutrina geral dos signos e a definição do poder de análise do pensamento se superpuseram exatamente numa única e mesma teoria do conhecimento. 

Quando a Lógica de Port-Royal dizia que um signo podia ser inerente àquilo que ele designa ou dele separado, mostrava que o signo, na idade clássica, não é mais encarregado de tornar o mundo próximo de si e inerente às suas próprias formas, mas, ao contrário, de estendê-Io, de justapô-lo segundo uma superfície indefinidamente aberta e de prosseguir a partir dele o desdobramento sem termo dos substitutos com os quais o pensamos. É desse modo que o oferecemos ao mesmo tempo à análise e à combinatória, que o tornamos, de ponta a ponta, ordenável. 

O signo no pensamento clássico não apaga as distâncias e não abole o tempo: ao contrário, permite desenrolá-los e percorrê-los passo a passo. Por ele, as coisas tornam-se distintas, conservam-se em sua identidade, desenlaçam-se e se ligam. 

A razão ocidental entra na idade do juízo. 

3. Resta uma terceira variável: a que pode assumir os dois valores da natureza e da convenção. 

Sabia-se desde há muito – e bem antes do Crátilo – que os signos podem ser dados pela natureza ou constituídos pelo homem. 

O século XVI também não o ignorava e reconhecia nas línguas humanas os signos de instituição. 

Mas os signos artificiais só deviam seu poder à sua fidelidade aos signos naturais. Estes, de longe, fundavam todos os outros. 

A partir do século XVII, dá-se um valor inverso à natureza e à convenção: 

natural, o signo não é mais do que um elemento subtraído às coisas e constituído como signo pelo conhecimento. 

Ele é, pois, prescrito, rígido, incômodo, e o espírito não pode assenhorar-se dele. Ao contrário, quando se estabelece um signo de convenção, pode-se sempre (e é preciso, com efeito) escolhê-lo de tal sorte que ele seja simples, fácil de lembrar, aplicável a um número indefinido de elementos, suscetível de se dividir ele próprio e de se compor; o signo de instituição é o signo na plenitude de seu funcionamento. 

É ele que traça a divisória entre o homem e o animal; 

  • ele que transforma a imaginação em memória voluntária, 
  • a atenção espontânea em reflexão, 
  • o instinto em conhecimento racional(15). 

Foi sua carência ainda que Itard descobriu no “Selvagem de Aveyron”. Desses signos de convenção, os signos naturais não passam do esboço rudimentar, o desenho longinquo que só será concluído pela instauração do arbitrário. Mas esse arbitrário é medido por sua função, e suas regras muito exatamente definidas por ela. 

Um sistema arbitrário de signos deve 

  • permitir a análise das coisas nos seus mais simples elementos; 
  • deve decompor até a origem; 
  • mas deve também mostrar como são possíveis combinações desses elementos e permitir a gênese ideal na complexidade das coisas. 

“Arbitrário” só se opõe a “natural” se se quiser designar a maneira como os signos foram estabelecidos. 

Mas o arbitrário é também o crivo de análise e o espaço combinatório através dos quais a natureza vai se oferecer no que ela é ao nível das impressões originárias e em todas as formas possíveis de sua combinação. 

Na sua perfeição, o sistema dos signos 

  • é essa língua simples, absolutamente transparente, que é capaz de nomear o elementar; 
  • é também esse conjunto de operações que define todas as conjunções possíveis. 

A nossos olhos, 

  • essa busca da origem 
  • e esse cálculo dos agrupamentos 

parecem incompatíveis, e nós os explicamos facilmente como uma ambiguidade no pensamento dos séculos XVII e XVIII. 

O mesmo ocorre com o jogo entre o sistema e a natureza. De fato, não há para esse pensamento nenhuma contradição. Mais precisamente, existe uma disposição necessária e única que atravessa toda a epistémê clássica: 

  • é a pertença
    • de um cálculo universal
    • e de uma busca do elementar 
  • a um sistema que é artificial e que, por isso mesmo, pode fazer aparecer a natureza desde seus elementos de origem até a simultaneidade de todas as suas combinações possíveis. 

Na idade clássica, servir-se de signos 

  • não é, como nos séculos precedentes, tentar reencontrar por sob eles o texto primitivo de um discurso afirmado, e reafirmado, para sempre; 
  • é tentar descobrir a linguagem arbitrária que autorizará o desdobramento da natureza no seu espaço, os termos últimos de sua análise e as leis de sua composição. 

O saber não tem mais que desencravar a velha Palavra dos lugares desconhecidos onde ela se pode esconder; cumpre-lhe fabricar uma língua e que ela seja bem-feita – isto é, que, analisante e combinante, ela seja realmente a língua dos cálculos. 

É possível agora definir os instrumentos que ao pensamento clássico prescreve o sistema dos signos. 

  • É ele que introduz no conhecimento a probabilidade, a análise e a combinatória, o arbitrário justificado do sistema. 
  • É ele que dá lugar ao mesmo tempo
    • à busca da origem 
    • e à calculabilidade; 
    • à constituição de quadros fixando as composições possíveis 
    • e à restituição de uma gênese a partir dos mais simples elementos; 
  • é ele que aproxima todo saber de uma linguagem e busca substituir todas as línguas por um sistema de símbolos artificiais e de operações de natureza lógica. 

No nível de uma história das opiniões, tudo isso apareceria sem dúvida como uma imbricação de influências, em que seria necessário sem dúvida fazer aparecer a parte individual que cabe a Hobbes, Berkeley, Leibniz, Condillac, aos ideólogos. 

Mas se se interroga o pensamento clássico ao nível do que arqueologicamente o tornou possível, percebe-se que a dissociação entre o signo e a semelhança no começo do século XVIII fez aparecer estas figuras novas que são a probabilidade, a análise, a combinatória, o sistema e a língua universal, não como temas sucessivos engendrando-se ou repelindo-se uns aos outros, mas como uma rede única de necessidades. 

E foi ela que tornou possíveis essas individualidades a que chamamos Hobbes ou Berkeley ou Hume ou Condillac.

Duas visões, duas leituras do fenômeno 'operações':
sob o pensamento clássico, o de antes de 1775; (seta amarela)
sob o pensamento moderno, o de depois de 1825 (seta vermelha)
com duas amplitudes - abrangências muito diferentes
Las meninas, Diego Velázquez, 1656; óleo sobre tela; Museu do Prado, Madrid, Espanha
]
Caos como um tipo de ordem instável
em que as sequências temporais são muito complexas e revelam estruturas
que nos permitem melhor entender o mundo que nos cerca

Paleta de ideias ou elementos de imagem
presentes na configuração de pensamento clássico

O ontologia do sistema SIPOC/FEPSC

Proposição instanciativa: pensamento moderno, caminho da Construção da representação
designações primitivas inativas; elementos de suporte da Forma de produção existentes e ativados; linguagem de ação ou raiz sim contém a representação para essa empiricidade objeto
recuperada desde o Repositório para objeto desta operação
Proposição explicativa: pensamento moderno, caminho da Construção da representação
designações primitivas ativas; elementos de suporte da Forma de produção existentes; linguagem de ação ou raiz sim contém a representação para essa empiricidade objeto
Proposição enunciativa: pensamento moderno, caminho da Construção da representação
designações primitivas ativas; elementos de suporte da Forma de produção inexistentes; linguagem de ação ou raiz não contém a representação para essa empiricidade objeto
a proposição no pensamento clássico
ponto de aplicação da leitura de operações no momento da troca
a proposição no pensamento moderno: ponto de aplicação da leitura de operações antes da troca
ECA-moderno
Características do pensamento moderno
o de depois de 1825
ECA-Clássico
Características do pensamento clássico
o de antes de 1775
homem no modelo de operações do pensamento clássico, o de antes de 1775,
considerado como uma das categorias do sistema de categorias,
como um gênero, ou uma espécie
os dois obstáculos encontrados por Michel Foucault em seu trabalho
no livro 'As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas
caminho do Instanciamento da representação, com valor já atribuído;
que tem início novamente no interior do Circuito das trocas
fontes de valor para a representação em construção: a) designações primitivas; b) linguagem de ação ou taiz.

Exemplos de modelos de operações e de organizações sem a possibilidade de fundar as sínteses (do objeto das operações) no espaço da representação e com ponto de inserção da análise de operações no cruzamento entre o dado e o recebido na operação de troca

Funcionamento
do pensamento
funcionamento das operações no pensamento clássico
Modelo de
Operação de produção
relação do modelo de operações de produção de E. S. Buffa
e o sistema Input-Output
do LE da figura.
Modelo da 
Organização de produção
Um modelo de organização sob o pensamento clássico, destacando a utilização de múltiplas ordens, ou
múltiplos sistemas de categorias
Modelo de operações
e de organização
Modelo FEPSC(SIPOC), Six Sigma
Modelo de  Operação
contábil-financeira
O modelo de operação
no sistema contábil-financeiro
Modelo da  Organização
ponto de vista financeiro
a organização no sistema contábil-financeiro

Exemplos de modelos de operações e de organizações no pensamento moderno, e assim  com a possibilidade de fundar as sínteses (do objeto das operações) no espaço da representação e com ponto de inserção da análise de operações antes do cruzamento entre o dado e o recebido na operação de troca

Funcionamento
de operação do pensamento
O funcionamento das operações no pensamento moderno
Modelo de
Operação de produção
relação entre o modelo descritivo da produção do Kanban e 'essa maneira moderna de conhecer empiricidades'
Modelo da 
Organização de produção
o modelo de organização 'Mapa da atividade semicondutores', da Reengenharia, o modelo de operações do Kanban e o modelo moderno de operações
O modelo descritivo da produção do Kanban operação de
instanciamento de representação
O mapa da atividade semicondutores da Texas Instruments: modelo de organização
do movimento Reengenharia

O espaço interior do Triedro dos saberes – habitat das ciências humanas, com modelos situados no espectro de modelos no segmento para além do objeto

Assim, estes três pares,

  • função e norma,
  • conflito e regra,
  • significação e sistema,

cobrem, por completo, o domínio inteiro do conhecimento do homem. 

Mas, qualquer que seja a natureza da análise e o domínio a que ela se aplica, tem-se um critério formal para saber o que é

  • do nível da psicologia,
  • da sociologia
  • ou da análise das linguagens

é a escolha do modelo fundamental e a posição dos modelos secundários que permitem saber em que momento

  • se “psicologiza” ou se “sociologiza” no estudo das literaturas e dos mitos, em que momento se faz, em psicologia, decifração de textos ou análise sociológica. 

Mas essa superposição de modelos não é um defeito de método. 

Só há defeito se os modelos não forem ordenados e explicitamente articulados uns com os outros.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo X  – As ciências humanas;
 III. Os três modelos
Michel Foucault 

O Triedro dos saberes: eixos e faces
espaço das ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem
O interior ao Triedro dos saberes
o espaço das Ciências humanas

Aquém do objeto

Não há modelos constituintes nesta faixa do espectro, já que nada é constituído na existência durante as operações;

  • o ponto de inserção na análise do fenômeno ‘operações está no cruzamento entre o que é dado e o que é recebido na operação de troca.

Na configuração do pensamento pressupõe-se que todas as coisas
existem desde sempre e para sempre,
e integram o Universo em uma visão única.

Existem múltiplas ordens que podem ser arbitrariamente escolhidas para cada operação; e em uma mesma organização podem conviver ordens – como diz Foucault – ligeiramente diferentes. Tem-se inúmeras categorias para cada ordem escolhida, e muitas ordens possíveis de serem selecionadas.

Nada é constituído na existência como resultado das distinções feitas durante as operações nesta faixa do espectro.

Diante do objeto

No eixo epistemológico fundamental – ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem, a modelagem em cada área do saber pode ser feita com um modelo constituinte específico e próprio de cada uma delas:

  • em todas, o ponto de inserção na análise do fenômeno ‘operações’ está antes do cruzamento entre o dado e o recebido, e portanto antes da existência destes.

No que Foucault chama de ‘Região epistemológica Fundamental’ os Modelos constituintes são compostos por pares constituintes, próprios a cada região do saber ou área do conhecimento em que o modelo é feito:

  • Ciências da vida (Biologia):


    função-norma
    ;

  • Ciências do trabalho (Economia):


    conflito-regra;

  • Ciências da Linguagem (Filologia):

    significação-sistema.

Além do objeto

No campo das ciências humanas, o modelo constituinte de qualquer uma delas se unifica. 

Os Modelos constituintes são compostos por uma combinação dos três pares de modelos constituintes das ciências

  • da Vida-(Biologia),
  • do Trabalho-(Economia)
  • e da Linguagem-(Filologia).

O Modelo constituinte  de cada uma das Ciências Humanas – é uma combinação – ponderada pelo projetista de modelos.

O modelo composto é uma combinação dos três pares de modelos constituintes: 

  • Ciências da vida  (Biologia):
    função-norma;

    +
    Ciências do trabalho (Economia):

    conflito-regra;
    +
    Ciências da Linguagem (Filologia):
    significação-sistema.

Sob ciências humanas como:

  • economia política;
  • sociologia,
  • psicologia e psicanálise

estão modelos compostos, que são combinações ponderadas dos três pares de modelos constituintes das ciências integrantes do eixo epistemológico fundamental.

- Lugar do nascimento do que é empírico:
pensamento moderno - caminho da Construção da representação
- Circuito das trocas, ou Mercado: pensamento clássico, ou pensamento moderno, sempre no caminho do Instanciamento da representação objeto

Mercado, ou Circuito das trocas: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades não muda.

Encontra-se 

  • sob o pensamento clássico, o de antes de 1775,
  • e também ocorre no pensamento moderno, o de depois de 1825, no caminho do Instanciamento da representação.

Lugar do nascimento do que é empírico: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental das empiricidade sim, muda.

Encontra-se somente sob o pensamento moderno, o de depois de 1825, no caminho da Construção da representação

O 'Circuito das trocas', ou 'Mercado'
lugar onde transcorre uma operação sob o pensamento clássico
O Lugar de nascimento do que é empírico
lugar onde transcorre a operação de construção de representação nova
e onde se dá a articulação do pensamento do homem, com o impensado
O Circuito das trocas
as chaves horizontais amarelas
onde ocorrem operações durante as quais o 'modo de ser fundamental'
não se altera

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

2Assim como a Ordem
no pensamento clássico
não era
a harmonia visível
das coisas,
seu ajustamento,
sua regularidade
ou sua simetria constatados,
mas o espaço próprio de seu ser
e aquilo que,
antes de todo
conhecimento efetivo,
as estabelecia no saber,

1″Mas vê-se bem
que a História
não deve ser aqui entendida
como a coleta das sucessões de fatos, tais como se constituíram;

ela é
o modo de ser fundamental
das empiricidades,

aquilo a partir de que elas são

  • afirmadas,
  • postas,
  • dispostas
  • e repartidas no espaço do saber para eventuais conhecimentos e para ciências possíveis.

[veja citação 2 à esquerda]

A referência ao ‘Circuito das trocas’ – ou Mercado é uma quase unanimidade na literatura especializada filosófica ou técnica.

Qual será a explicação para isso?

Por que praticamente ninguém fala no ‘Lugar de nascimento do que é empírico’?

Seria o caso de haver um desalinhamento filosófico no trabalho desses autores?

3assim também a História,
a partir do século XIX,
define o
lugar de nascimento
do que é empírico,
lugar onde,
aquém
de toda cronologia estabelecida,
ele assume o ser
que lhe é próprio.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VII – Os limites da representação;
I. A idade da história
Michel Foucault 

- Lugar do nascimento do que é empírico:
pensamento moderno - caminho da Construção da representação
- Circuito das trocas, ou Mercado: pensamento clássico, ou pensamento moderno, sempre no caminho do Instanciamento da representação objeto

Mercado, ou Circuito das trocas: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades não muda.

Encontra-se 

  • sob o pensamento clássico, o de antes de 1775,
  • e também ocorre no pensamento moderno, o de depois de 1825, no caminho do Instanciamento da representação.

Lugar do nascimento do que é empírico: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental das empiricidade sim, muda.

Encontra-se somente sob o pensamento moderno, o de depois de 1825, no caminho da Construção da representação

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

2Assim como a Ordem
no pensamento clássico
não era
a harmonia visível
das coisas,
seu ajustamento,
sua regularidade
ou sua simetria constatados,
mas o espaço próprio de seu ser
e aquilo que,
antes de todo
conhecimento efetivo,
as estabelecia no saber,

1″Mas vê-se bem
que a História
não deve ser aqui entendida
como a coleta das sucessões de fatos, tais como se constituíram;

ela é
o modo de ser fundamental
das empiricidades,

aquilo a partir de que elas são

  • afirmadas,
  • postas,
  • dispostas
  • e repartidas no espaço do saber para eventuais conhecimentos e para ciências possíveis.

[veja citação 2 à esquerda]

assim também a História,
a partir do século XIX,
define o
lugar de nascimento
do que é empírico,
lugar onde,
aquém de toda cronologia estabelecida,
ele assume o ser
que lhe é próprio.

A referência ao ‘Circuito das trocas’ – ou Mercado é uma quase unanimidade na literatura especializada filosófica ou técnica.

Qual será a explicação para isso?

Por que praticamente ninguém fala no ‘Lugar de nascimento do que é empírico’?

Seria o caso de haver um desalinhamento filosófico no trabalho desses autores?

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VII – Os limites da representação;
I. A idade da história
Michel Foucault 

Questões/Perguntas

_thumb história do livro

A intenção com este estudo é buscar no pensamento de Michel Foucault,
 – com foco no livro ‘As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas’ – subsídios para responder ao seguinte tipo de questões:

- Lugar do nascimento do que é empírico:
pensamento moderno - caminho da Construção da representação
- Circuito das trocas, ou Mercado: pensamento clássico, ou pensamento moderno, sempre no caminho do Instanciamento da representação objeto

Mercado, ou Circuito das trocas: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades não muda.

Encontra-se 

  • sob o pensamento clássico, o de antes de 1775,
  • e também ocorre no pensamento moderno, o de depois de 1825, no caminho do Instanciamento da representação.

Lugar do nascimento do que é empírico: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental das empiricidade sim, muda.

Encontra-se somente sob o pensamento moderno, o de depois de 1825, no caminho da Construção da representação

O 'Circuito das trocas', ou 'Mercado'
lugar onde transcorre uma operação sob o pensamento clássico
O Lugar de nascimento do que é empírico
lugar onde transcorre a operação de construção de representação nova
e onde se dá a articulação do pensamento do homem, com o impensado
O Circuito das trocas
as chaves horizontais amarelas
onde ocorrem operações durante as quais o 'modo de ser fundamental'
não se altera

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

2Assim como a Ordem
no pensamento clássico
não era
a harmonia visível
das coisas,
seu ajustamento,
sua regularidade
ou sua simetria constatados,
mas o espaço próprio de seu ser
e aquilo que,
antes de todo
conhecimento efetivo,
as estabelecia no saber,

1″Mas vê-se bem
que a História
não deve ser aqui entendida
como a coleta das sucessões de fatos, tais como se constituíram;

ela é
o modo de ser fundamental
das empiricidades,

aquilo a partir de que elas são

  • afirmadas,
  • postas,
  • dispostas
  • e repartidas no espaço do saber para eventuais conhecimentos e para ciências possíveis.

[veja citação 2 à esquerda]

A referência ao ‘Circuito das trocas’ – ou Mercado é uma quase unanimidade na literatura especializada filosófica ou técnica.

Qual será a explicação para isso?

Por que praticamente ninguém fala no ‘Lugar de nascimento do que é empírico’?

Seria o caso de haver um desalinhamento filosófico no trabalho desses autores?

3assim também a História,
a partir do século XIX,
define o
lugar de nascimento
do que é empírico,
lugar onde,
aquém
de toda cronologia estabelecida,
ele assume o ser
que lhe é próprio.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VII – Os limites da representação;
I. A idade da história
Michel Foucault 

Questões/Perguntas

_thumb história do livro

A intenção com este estudo é buscar no pensamento de Michel Foucault,  – com foco no livro ‘As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas’ – subsídios para responder ao seguinte tipo de questões:

Os dois obstáculos, as duas pedras de tropeço no caminho,
encontradas por Foucault durante seu trabalho no livro
‘As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas’

exemplos de modelos de operações e de organizações muito usados ainda hoje, mostrando esses dois obstáculos presentes entre nós atualmente.

os dois obstáculos encontrados por Michel Foucault em seu trabalho
no livro ‘As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas
Michel Foucault
1926-1984

“Eis que nos adiantamos
bem para além do acontecimento histórico
que se impunha situar
– bem para além das margens cronológicas dessa ruptura
que divide, em sua profundidade,
a epistémê do mundo ocidental
e isola para nós o começo de certa
maneira moderna de conhecer as empiricidades.

É que o pensamento que nos é contemporâneo
e com o qual, queiramos ou não, pensamos,
se acha ainda muito dominado

1 pela impossibilidade
trazida à luz por volta 
do fim do século XVIII, 
de fundar as sínteses
no espaço da representação:

2 e pela obrigação 
correlativa, simultânea, 

mas logo dividida contra si mesma, 
de abrir o campo transcendental da subjetividade e de constituir inversamente, 
para além do objeto, 

esses “quase-transcendentais” 
que são para nós 
Vida, o Trabalho, a Linguagem.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;

Capítulo VIII – Trabalho, vida e linguagem;
tópico I – As novas empiricidades

no pensamento clássico
aquém do objeto
antes de 1775

no pensamento moderno
diante do objeto
depois de 1825

espaço interior
Triedro dos saberes
para além do objeto
reservado às
Ciências humanas

comparações de diferentes configurações de pensamento feitas por Michel Foucault
A impossibilidade
[no pensamento clássico,
LE da figura]
contra a sim-possibilidade
[no pensamento moderno,
LD da figura]
de fundar as sínteses
[da empiricidade objeto]
no espaço da representação.
o espaço interno do
Triedro dos saberes
– o habitat das ciências humanas –
mostrando o modelo constituinte composto e comum a todas as Ciências Humanas

Os obstáculos no caminho de Foucault 

aquém do objeto

diante do objeto

para além do objeto

0 Foucault havia anteriormente identificado o perfil do pensamento no período clássico, com uma configuração tal que a capacidade (ou a possibilidade – e mesmo a intenção) de fundar as sínteses – dos objetos de operações cujas representações resultassem dessas operações – no espaço da representação não era sequer cogitada:

  • em razão dos pressupostos adotados,

e principalmente, em razão 

  • do tipo de leitura feita do fenômeno ‘operações’ das trocas, 
    • na leitura então feita, o ponto de início do fenômeno  ‘operações’, estava inserido no exato momento em que a troca tem todas as condições para acontecer; (os dois objetos da troca – o dado e o obtido –  tinham representações disponíveis e já carregadas de valor).

1 Michel Foucault relata a seguinte situação:

  • ele havia delineado um tipo de pensamento ‘com o qual queiramos ou não pensamos’, um pensamento que segundo ele ‘tem a nossa idade e a nossa geografia’,
    • com a possibilidade de fundar as sínteses (da empiricidade objeto da operação) no espaço da representação;

para conseguir fundar as sínteses no espaço da representação,

  • foi necessário alterar profundamente todos os pressupostos

e a leitura feita do que seja uma operação e a análise de valor, exigiram:

  • o deslocamento do ponto de inserção da análise desde o ponto de cruzamento entre o dado e o recebido;
  • para um ponto antes da possibilidade da troca, quando os elementos que dão as condições de efetivação dessa troca, ainda não existissem,

incorporando à análise, a operação de construção da representação nova. 

E ele havia percebido que esse pensamento com o qual queiramos ou não pensamos

  • estava muito contaminadodominado, mesmo –
    • justamente pela impossibilidade de fazer isso (essa fundação das sínteses do objeto da operação no espaço da representação), sendo esta impossibilidade  uma característica do pensamento clássico.

2 Ele percebia ainda uma obrigação a cumprir:

  • a de abrir o campo transcendental da subjetividade
    • e constituir, para além do objeto, os quase-transcendentais Vida, Trabalho e Linguagem.

Ele descobre que operações nos domínios das ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem podem ser expressos completamente em cada domínio, por pares de modelos constituintes:

  • Vida(Biologia)
    • função-norma;
  • Trabalho(Economia)
    • conflito-regra;
  • Linguagem(Filologia)
    • significação sistema;

e que os modelos constituintes das Ciências humanas são sempre compostos por uma combinação desses três pares de modelos constituintes.

O Modelo constituinte  de cada uma das Ciências Humanas – é sempre uma combinação dos modelos constituintes das:

  • Ciências da vida  (Biologia):
    [função-norma];

    +
    Ciências do trabalho (Economia):
    [conflito-regra];
    +
    Ciências da Linguagem (Filologia):
    [significação-sistema].

Podemos ver a atualidade dessa percepção de Foucault
com Exemplos de modelos para operações e organizações
construídos sobre estruturas de conceitos
uns que não permitem, e outros que ao contrário sim permitem
a fundação das sínteses (do objeto das operações) no espaço da representação.

Veja isso aqui.

Os tratamentos dados ao homem em nossa cultura, no pensamento clássico e no moderno, segundo Michel Foucault; 

e as ideias – ou elementos de imagem – requeridos para compor estruturalmente modelos de operações e modelos de organizações
com os respectivos tratamentos dados ao homem

homem no modelo de operações do pensamento clássico, o de antes de 1775, considerado como uma das categorias do sistema de categorias,
como um gênero, ou uma espécie
homem no sistema de operações do pensamento moderno, o de depois de 1825 considerado em sua duplicidade de papéis:
1. raiz e fundamento de toda positividade
2. elemento do que é empírico.

“Instaura-se
uma forma de reflexão
bastante afastada
do cartesianismo
e da análise kantiana,
em que está em questão,
pela primeira vez,
o ser do homem,
nessa dimensão
segundo a qual
o pensamento
se dirige ao impensado,
e com ele se articula.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IX  – O homem e seus duplos;
V. O cogito e o impensado
Michel Foucault 

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

“No pensamento clássico,
aquele para quem
a representação existe,
e que nela se representa a si mesmo,
aí se reconhecendo
por imagem ou reflexo,
aquele que trama
todos os fios entrecruzados
da “representação em quadro” -,
esse [o ser do homem]
jamais se encontra lá presente.

Antes do fim do século XVIII,
o homem não existia.

Sem dúvida,
as ciências naturais
trataram do homem como 

  • de uma espécie
  • ou de um gênero

a discussão
sobre o problema das raças,
no século XVIII, o testemunha.
A gramática e a economia,
por outro lado, utilizavam noções como as de necessidade,
de desejo,
ou de memória
e de imaginação.”

Mas não havia
consciência epistemológica

do homem como tal.

“Antes do fim do século XVIII,
o homem não existia.”

“O modo de ser do homem,
tal como se constituiu
no pensamento moderno,
permite-lhe desempenhar dois papéis:
está, ao mesmo tempo,

  • no fundamento
    de todas as positividades,
  • presente, de uma forma que não se pode sequer dizer privilegiada,
    no elemento
    das coisas empíricas.

Esse fato
– e não se trata aí
da essência em geral do homem,
mas pura e simplesmente
desse a priori histórico que,
desde o século XIX,
serve de solo quase evidente
ao nosso pensamento –
esse fato é, sem dúvida, decisivo
para o estatuto a ser dado
às “ciências humanas”,
a esse corpo de conhecimentos
(mas mesmo esta palavra
é talvez demasiado forte:
digamos,
para sermos mais neutros ainda,
a esse conjunto de discursos)
que toma por objeto o homem
no que ele tem de empírico.”

É possível pensar as condições em que se dá a subjetividade de um ‘homem’ tratado como espécie, ou gênero?

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IX – O homem e seus duplos;
II. O lugar do rei
Michel Foucault 

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo X  – As ciências humanas;
 I. O triedro dos saberes
Michel Foucault 

Veja o ponto “2. as possibilidades de leitura do fenômeno ‘operações de troca’ e respectivas possibilidades de análise de valor que elas nos permitem fazer”

Parece ser a opção de leitura da ‘operação de troca’ deslocada para um ponto antes das existência dos objetos da troca o que arrasta o ser do homem e cada objeto da troca para a Forma de reflexão que se instaura em nossa cultura.

O fenômeno ‘operações’ (em qualquer área): visões com duas abrangências muito diferentes dependendo da leitura que fazemos.

As duas possibilidades de inserção do ponto de início da leitura do fenômeno ‘operações’ – de qualquer tipo – e a análise das diferentes origens do valor carregado pelas proposições para as representações em função da inserção do ponto de início de leitura de ‘operações’; 

Duas visões, duas leituras do fenômeno ‘operações’:
sob o pensamento clássico, o de antes de 1775; (seta amarela)
sob o pensamento moderno, o de depois de 1825 (seta vermelha)
com duas amplitudes – duas abrangências muito diferentes

Note-se que as condições para a ocorrência da troca – a existência simultânea dos dois objetos de troca, o que é dado e o que é recebido – são satisfeitas em duas situações:

  • 1. no pensamento clássico pelo posicionamento do ponto de início de leitura sob essa condição, quer dizer, a existência prévia do que é dado e do que é recebido;
  • 2. no pensamento moderno, pela satisfação dessa pré-condição no início do Instanciamento da representação, porém com a condição da execução anterior da Construção da representação, também incluída no escopo da operação. 

Nos pontos marcados por setas amarelas para baixo (1) e (2) as pré-condições para a ocorrência da troca são dadas, qualquer que seja a estrutura de pensamento – clássico ou moderno – segundo o pensamento de Michel Foucault.

O que não muda entre essas duas possibilidades

A proposição como bloco construtivo padrão fundamental e genérico para construção de representações e suas duas possibilidades de carregamento de valor, quanto às respectivas origens

A proposição é para a linguagem
o que a representação é
para o pensamento:
sua forma, ao mesmo tempo
mais geral e mais elementar,
porquanto, desde que a decomponhamos, não reencontraremos mais o discurso,
mas seus elementos
como tantos materiais dispersos.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV  – Falar;
tópico III – Teoria do verbo
Michel Foucault 

(…) Em outras palavras,
para que, numa troca,
uma coisa possa representar outra,
é preciso que elas existam
já carregadas de valor;
e, contudo,
o valor só existe
no interior da representação

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

O que sim muda entre essas duas possibilidades

A origem do valor carregado pelo veículo de carregamento de valor na representação: a proposição, sempre, porém em linguagens essencialmente diferentes e representações com origens de valor distintas.

“Valer, para o pensamento clássico,
é primeiramente valer alguma coisa,
poder substituir essa coisa num processo de troca.

A moeda só foi inventada,
os preços só foram fixados e só se modificam
na medida em que essa troca existe.

Ora, a troca é um fenômeno simples
apenas na aparência.

Com efeito, só se troca numa permuta,
quando cada um dos dois parceiros
reconhece um valor
para aquilo que o outro possui.

Num sentido, é preciso, pois,
que as coisas permutáveis,
com seu valor próprio,
existam antecipadamente nas mãos de cada um,
para que a dupla cessão e a dupla aquisição
finalmente se produzam.

Mas, por outro lado,

  • o que cada um come e bebe,
    aquilo de que precisa para viver
    não tem valor
    enquanto não o cede;
  • e aquilo de que não tem necessidade
    é igualmente desprovido de valor
    enquanto não for usado
    para adquirir alguma coisa de que necessite.

Em outras palavras,
para que, numa troca,
uma coisa possa representar outra,
é preciso que elas existam
já carregadas de valor;
e, contudo,
o valor só existe
no interior da representação

  • (atual [troca imediata]
  • ou possível [permutabilidade]),

isto é, no interior

  1. da troca
    [representação existente]
  2. ou da permutabilidade
    [representação possível]
    .

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

O funcionamento da troca em cada uma das duas possibilidades de leitura do fenômeno ‘operação’: no ato mesmo da troca; ou anterior à troca, na criação das condições de troca

“Daí duas possibilidades simultâneas de leitura:

  1. leitura já dadas as condições de troca;
  2. leitura na permutabilidade, isto é na criação de condições de troca

1 uma analisa o valor
no ato mesmo da troca,
no ponto de cruzamento
entre o dado e o recebido;

  • A primeira dessas duas leituras corresponde a uma análise que coloca e encerra
    • toda a essência da linguagem no interior da proposição;

3 no primeiro caso, com efeito, a linguagem encontra seu lugar de possibilidade numa atribuição assegurada pelo verbo – isto é, por esse elemento da linguagem em recuo relativamente a todas as palavras mas que as reporta umas às outras; o verbo, tornando possíveis todas as palavras da linguagem a partir de seu liame proposicional, corresponde à troca que funda, como um ato mais primitivo que os outros, o valor das coisas trocadas e o preço pelo qual são cedidas;

2 outra analisa-o
como anterior à troca
e como condição primeira
para que esta possa ocorrer.

  • a outra, a uma análise que descobre essa mesma essência da linguagem do lado das
    • designações primitivas
    • linguagem de ação ou raiz;

4 a outra forma de análise, a linguagem está enraizada 

fora de si mesma e como que

    • na natureza, ou nas   
    • analogias das coisas;

a raiz, o primeiro grito que dera nascimento às palavras antes mesmo que a linguagem tivesse nascido, corresponde à formação imediata do valor, antes da troca e das medidas recíprocas da necessidade.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

Esta segunda leitura para ‘operações’
– que orienta a análise de valor
desde antes do momento da troca -,
não é possível sem a presença do homem
na estrutura dos modelos.

Isso fica bastante claro com a descrição da forma de reflexão que se instaura em nossa cultura depois da descontinuidade epistemológica de 1775-1825

Esses dois pontos de inserção da leitura da operação de troca
mostrados nos modelos de operações

Colocando o ponto de inserção de leitura do fenômeno ‘operações’ antes da existência dos objetos envolvidos na troca, ocorre uma portentosa ampliação no escopo da operação – de qualquer natureza -, incorporando toda a etapa de construção de representação nova. Veja isso aqui.

As características das duas configurações do pensamento:

  • a do pensamento clássico, de antes de 1775;
  • e a do pensamento moderno, de depois de 1825

características de características, ou características de segunda ordem,
das configurações do pensamento em cada caso.

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

_Estrutura IO-transformação
Os princípios organizadores
sob o pensamento clássico:
o de antes de 1775
‘Caráter’ e ‘Similitude’
Características do pensamento clássico, o de antes de 1775
Os princípios organizadores desse espaço de empiricidades sob o pensamento moderno,
o de depois de 1825
‘Analogia’ e ‘Sucessão’
Características do pensamento moderno, o de depois de 1825

“Instaura-se
uma forma de reflexão
bastante afastada
do cartesianismo
e da análise kantiana,
em que está em questão,
pela primeira vez,
o ser do homem,
nessa dimensão
segundo a qual
o pensamento
se dirige ao impensado,
e com ele se articula.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IX  – O homem e seus duplos;
V. O cogito e o impensado
Michel Foucault 

“Assim o círculo se fecha.

Vê-se, porém, através de qual sistema de desdobramentos. 

As semelhanças exigem uma assinalação, pois nenhuma dentre elas poderia ser notada se não fosse legivelmente marcada. 

Mas que são esses sinais? 

Como reconhecer, entre todos os aspectos do mundo e tantas figuras que se entrecruzam, 

  • que há aqui um caráter 

no qual convém se deter, porque ele indica uma secreta e essencial semelhança? 

Que forma constitui o signo no seu singular valor de signo? 

  • – É a semelhança

Ele significa na medida em que tem semelhança com o que indica (isto é, com uma similitude).

Contudo, não é a homologia que ele assinala, pois seu ser distinto de assinalação se desvaneceria no semelhante de que é signo; trata-se de outra semelhança, uma similitude vizinha e de outro tipo que serve para reconhecer a primeira, mas que, por sua vez, é patenteada por uma terceira. 

Toda semelhança recebe uma assinalação; essa assinalação, porém, é apenas uma forma intermediária da mesma semelhança. De tal sorte que o conjunto das marcas faz deslizar, sobre o círculo das similitudes, um segundo círculo que duplicaria exatamente e, ponto por ponto, o primeiro, se não fosse esse pequeno desnível que faz com que 

  • o signo da simpatia resida na analogia, 
  • o da analogia na emulação, 
  • o da emulação na conveniência, 

que, por sua vez, para ser reconhecida, requer 

  • a marca da simpatia… 

A assinalação e o que ela designa são exatamente da mesma natureza; apenas a lei da distribuição a que obedecem é diferente; a repartição é a mesma.”

De sorte que se vêem surgir,
como princípios organizadores
desse espaço de empiricidades, 

  • a Analogia 
  • e a Sucessão

de uma organização a outra,
o liame, com efeito,
não pode mais ser
a identidade de um
ou vários elementos,
mas a identidade
da relação entre os elementos
(onde a visibilidade
não tem mais papel)
e da função que asseguram;
ademais, se porventura essas organizações se avizinham
por efeito de uma densidade singularmente grande de analogias, não é porque ocupem
localizações próximas
num espaço de classificação,
mas sim porque
foram formadas uma ao mesmo tempo que a outra e uma logo após a outra
no devir das sucessões.
Enquanto, no pensamento clássico,
a seqüência das cronologias
não fazia mais que percorrer
o espaço prévio e mais fundamental
de um quadro
que de antemão apresentava
todas as suas possibilidades,
doravante
as semelhanças contemporâneas
e observáveis simultaneamente
no espaço não serão mais que
as formas depositadas e fixadas de uma sucessão que procede
de analogia em analogia.
A ordem clássica
distribuía num espaço permanente
as identidades
e as diferenças não-quantitativas
que separavam e uniam as coisas:
era essa a ordem
que reinava soberanamente,
mas a cada vez
segundo formas e leis
ligeiramente diferentes,
sobre o discurso dos homens,
o quadro dos seres naturais
e a troca das riquezas.

A partir do século XIX,
a História
vai desenrolar
numa série temporal
as analogias
que aproximam umas das outras
as organizações distintas.

É essa História que,
progressivamente,
imporá suas leis

  • à análise da produção,
  • à dos seres organizados, enfim,
  • à dos grupos linguísticos.

A História dá lugar
às organizações analógicas,
assim como a Ordem
abria o caminho
das identidades
e das diferenças sucessivas.

Essa forma de reflexão surgida será decorrência da segunda leitura do que seja uma operação de troca e portanto não pode prescindir do homem e do objeto?

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo II – A prosa do mundo;
II. As assinalações
Michel Foucault 

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VII – Os limites da representação;
I. A idade da história
Michel Foucault 

os lugares onde ocorrem as operações: 

  • Lugar de nascimento do que é empírico
    – operações de Construção de representações;
    • lugar onde o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades sim muda
  • Circuito onde ocorrem as trocas‘ ou Mercado
    – operações de Instanciamento de representações já existentes;
    • lugar onde o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades não muda.
Lugar do nascimento do que é empírico:
pensamento moderno – caminho da Construção da representação
Circuito das trocas, ou Mercado: pensamento clássico, ou pensamento moderno, sempre no caminho do Instanciamento da representação objeto

Mercado, ou Circuito das trocas: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades não muda.

Encontra-se 

  • sob o pensamento clássico, o de antes de 1775,
  • e também ocorre no pensamento moderno, o de depois de 1825, apenas no caminho do Instanciamento da representação.

Lugar do nascimento do que é empírico: lugar onde ocorrem operações nas quais o ‘modo de ser fundamental das empiricidade sim, muda.

Encontra-se somente sob o pensamento moderno, o de depois de 1825, e apenas no caminho da Construção da representação

O ‘Circuito das trocas’,
ou ‘Mercado’
as chaves amarelas no LE da figura, lugar onde transcorre uma operação sob o pensamento clássico
O Lugar de nascimento do que é empírico – fora e antes do Mercado –
lugar onde transcorre a operação de construção de representação nova
e onde se dá a articulação
do pensamento do homem,
com o impensado
O Circuito das trocas
as chaves horizontais amarelas
no LD da figura, onde ocorrem operações durante as quais
o ‘modo de ser fundamental’
não se altera; é novamente o Mercado, agora no pensamento moderno

‘modo de ser fundamental das empiricidades’ é o conceito chave aqui.

No pensamento clássico, o de antes de 1775, pelos pressupostos adotados, é impossível definir o que seja ‘modo de ser fundamental’ de empiricidades cuja definição escapa ao escopo destas operações.

Estas operações transcorrem no interior do Circuito das trocas, a chave amarela horizontal, lugar onde não há alteração no modo como as coisas se apresentam à operação.

No pensamento moderno, o de depois de 1825, pelos pressupostos adotados é sim possível definir o que seja ‘modo de ser fundamental’ de empiricidades objeto da operação de Construção da representação que, se nova nesse domínio e ambiente, é o próprio escopo destas operações.

Operações no caminho da Construção da representação transcorrem no interior do ‘Lugar de nascimento do que é empírico’, as chaves coloridas verticais, em um espaço que engloba os lugares  desde onde se fala e do falado. O sucesso dessas operações altera ‘o modo de ser fundamental’ da empiricidade objeto, e com isso, faz-se História.

No pensamento moderno, o de depois de 1825, em uma operação de Instanciamento de representação objeto cuja construção da representação foi anteriormente feita e incorporada ao Repositório, a representação objeto de Instanciamento é recuperada do Repositório.

Assim, a operação de Instanciamento não altera o ‘modo de ser fundamental’ da empiricidade objeto de instanciamento.

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

2Assim como a Ordem
no pensamento clássico
não era
a harmonia visível
das coisas,
seu ajustamento,
sua regularidade
ou sua simetria constatados,
mas o espaço próprio de seu ser
e aquilo que,
antes de todo
conhecimento efetivo,
as estabelecia no saber,

1″Mas vê-se bem
que a História
não deve ser aqui entendida
como a coleta das sucessões de fatos, tais como se constituíram;

ela é

o modo de ser fundamental
das empiricidades,

aquilo a partir de que elas são

  • afirmadas,
  • postas,
  • dispostas
  • e repartidas no espaço do saber

para eventuais conhecimentos
e para ciências possíveis.

3 assim também
a História,
a partir do século XIX,
define o

lugar de nascimento
do que é empírico,

lugar onde,
aquém
de toda cronologia estabelecida,
ele assume o ser
que lhe é próprio.

A referência ao ‘Circuito das trocas’ – ou Mercado é uma quase unanimidade na literatura especializada filosófica ou técnica.

Qual será a explicação para isso?

Por que praticamente ninguém fala no ‘Lugar de nascimento do que é empírico’?

Seria o caso de haver um desalinhamento filosófico no trabalho desses autores?

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VII – Os limites da representação;
I. A idade da história
Michel Foucault 

os princípios organizadores dos modelos de operações que fazemos

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

_Estrutura IO-transformação
Os princípios organizadores
sob o pensamento clássico:
o de antes de 1775
‘Caráter’ e ‘Similitude’
Características do pensamento clássico
o de antes de 1775

“Assim o círculo se fecha.

Vê-se, porém, através de qual sistema de desdobramentos. 

As semelhanças exigem uma assinalação, pois nenhuma dentre elas poderia ser notada se não fosse legivelmente marcada. 

Mas que são esses sinais? 

Como reconhecer, entre todos os aspectos do mundo e tantas figuras que se entrecruzam, 

  • que há aqui um caráter 

no qual convém se deter, porque ele indica uma secreta e essencial semelhança? 

Que forma constitui o signo no seu singular valor de signo? 

  • – É a semelhança

Ele significa na medida em que tem semelhança com o que indica (isto é, com uma similitude).

Contudo, não é a homologia que ele assinala, pois seu ser distinto de assinalação se desvaneceria no semelhante de que é signo; trata-se de outra semelhança, uma similitude vizinha e de outro tipo que serve para reconhecer a primeira, mas que, por sua vez, é patenteada por uma terceira. 

Toda semelhança recebe uma assinalação; essa assinalação, porém, é apenas uma forma intermediária da mesma semelhança. De tal sorte que o conjunto das marcas faz deslizar, sobre o círculo das similitudes, um segundo círculo que duplicaria exatamente e, ponto por ponto, o primeiro, se não fosse esse pequeno desnível que faz com que 

  • o signo da simpatia resida na analogia, 
  • o da analogia na emulação, 
  • o da emulação na conveniência, 

que, por sua vez, para ser reconhecida, requer 

  • a marca da simpatia… 

A assinalação e o que ela designa são exatamente da mesma natureza; apenas a lei da distribuição a que obedecem é diferente; a repartição é a mesma.”

Os princípios organizadores desse espaço de empiricidades sob o pensamento moderno,
o de depois de 1825
‘Analogia’ e ‘Sucessão’
Características do pensamento moderno
o de depois de 1825

De sorte que se vêem surgir,
como princípios organizadores
desse espaço de empiricidades, 

  • a Analogia 
  • e a Sucessão

de uma organização a outra,
o liame, com efeito,
não pode mais ser
a identidade de um
ou vários elementos,
mas a identidade
da relação entre os elementos
(onde a visibilidade
não tem mais papel)
e da função que asseguram;
ademais, se porventura essas organizações se avizinham
por efeito de uma densidade singularmente grande de analogias, não é porque ocupem
localizações próximas
num espaço de classificação,
mas sim porque
foram formadas uma ao mesmo tempo que a outra e uma logo após a outra
no devir das sucessões.
Enquanto, no pensamento clássico,
a seqüência das cronologias
não fazia mais que percorrer
o espaço prévio e mais fundamental
de um quadro
que de antemão apresentava
todas as suas possibilidades,
doravante
as semelhanças contemporâneas
e observáveis simultaneamente
no espaço não serão mais que
as formas depositadas e fixadas de uma sucessão que procede
de analogia em analogia.
A ordem clássica
distribuía num espaço permanente
as identidades
e as diferenças não-quantitativas
que separavam e uniam as coisas:
era essa a ordem
que reinava soberanamente,
mas a cada vez
segundo formas e leis
ligeiramente diferentes,
sobre o discurso dos homens,
o quadro dos seres naturais
e a troca das riquezas.

A partir do século XIX,
a História
vai desenrolar
numa série temporal
as analogias
que aproximam umas das outras
as organizações distintas.

É essa História que,
progressivamente,
imporá suas leis

  • à análise da produção,
  • à dos seres organizados, enfim,
  • à dos grupos linguísticos.

A História dá lugar
às organizações analógicas,
assim como a Ordem
abria o caminho
das identidades
e das diferenças sucessivas.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo II – A prosa do mundo;
II. As assinalações
Michel Foucault 

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VII – Os limites da representação;
I. A idade da história
Michel Foucault 

os lugares contidos dentro do ‘Lugar de nascimento do que é empírico’:

  • o lugar ‘desde onde se fala
  • e o lugar ‘do falado‘;

consistentes com os blocos do ‘operar‘ e do ‘suporte ao operar‘ de Humberto Maturana

Esses dois lugares – o ‘desde onde se fala’ e o ‘do falado’ –
juntos delimitam o espaço onde se dá a articulação
do pensamento do homem com o impensado feita
no domínio do Pensamento e da Língua
e sua ligação com o domínio do Discurso e da Representação

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

O ‘Circuito das trocas’, ou ‘Mercado’
lugar onde transcorre uma operação sob o pensamento clássico

Lugar desde onde se fala

Lugar do falado

são sub-espaços do Lugar de nascimento do que é empírico o que implica que o pensamento está funcionando com o entendimento do pensamento moderno, o de depois de 1825, a coluna ao lado, portanto.

  • Lugar desde onde se fala não pode ser delineado sob o pensamento clássico pela falta da ideia e do elemento de imagem ‘homem’, aquele que fala, raiz e fundamento de toda positividade, e também da ideia do objeto resultado da articulação do pensamento com o impensado, feita pelo homem,;
  • e o Lugar do falado, analogamente, não pode ser delineado no LE da figura. 

todo o espaço  corresponde, no LE da figura, ao domínio todo em que ocorrem as operações sob o pensamento clássico, a saber, o domínio do Discurso e da Representação.

A leitura do que sejam Operações sob o entendimento no pensamento clássico pressupõe o ponto de inserção para análise no exato cruzamento entre o dado e o recebido na operação de troca, cuja condição de possibilidade está, desse modo, dada.

Lugar deste onde se fala:
ideias que formulam a proposição /
(sujeito e predicado do sujeito);
Lugar do falado:
ideias que dão suporte na experiência ao instanciamento da representação
no domínio e ambiente

Lugar do nascimento do que é empírico: espaço ocupado por:

  • Lugar desde onde se fala;
  • Lugar do falado

O Lugar de nascimento do que é empírico, como o nome sugere, está situado antes do circuito das trocas, e em seu interior ocorre a construção de representação nova.

Essa visão do que sejam operações corresponde à leitura de operações, ou visão desse fenômeno como desde um ponto de inserção anterior à troca

Lugar desde onde se fala

As ideias ou elementos de imagem que estão envolvidas na formulação da proposição estão contidas no espaço chamado de Lugar desde onde se fala:

  • sujeito: o homem na posição de raiz de toda positividade
  • predicado do sujeito
    • verbo: Forma de produção, o elemento central da operação de construção da representação;
    • atributo: a representação em construção, nas posições extremas da operação de construção.

Esse espaço coincide com o espaço chamado por Humberto Maturana de ‘operar’, o retângulo vermelho na figura ao lado, parte do Lugar de nascimento do que é empírico, mas no interior do domínio do Pensamento e da Língua.

Lugar do falado

As ideias ou elementos de imagem que estão envolvidos na sustentação da Forma de produção na experiência estão no lugar do falado:

  • elementos de suporte na experiência à Forma de produção, onde se encontram
    • processos, atividades, tasks

A operação de construção da representação escolhe os elementos de suporte na experiência à Forma de produção, que deve ser capaz de produzir quando implementada, uma instância da representação com o operar vislumbrado – ou o mais próximo disso possível. Humberto Maturana chama esse espaço de ‘suporte ao operar’, o retângulo amarelo na figura ao lado. 

O Lugar do falado é parte do Lugar de nascimento do que é empírico, mas suas ideias – ou elementos de imagem – fazem parte do domínio do Discurso e da Representação.

“É preciso, portanto,
tratar esse verbo
como um ser misto,

ao mesmo tempo
palavra entre as palavras,

preso às mesmas regras,
obedecendo como elas
às leis de regência
e de concordância;


e depois,


em recuo em relação a elas todas,

numa região que

  • não é
    aquela do falado

  • mas aquela 
    donde se fala.

Ele está na orla do discurso,
na juntura entre

  • aquilo que é dito

  • e aquilo que se diz,

exatamente lá onde os signos
estão em via de se tornar linguagem.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV – Falar;
tópico III. A teoria do verbo
por Michel Foucault

Há correspondências que precisam ser anotadas, entre elas:

  • no princípio dual de trabalho de David Ricardo
    • aquela atividade que está na origem do valor das coisas 
    • tem suas ideias – ou seus elementos de imagem no lugar desde onde se fala
  • no LD – lado direito da figura 2 de Humberto Maturana
    • os dois blocos do ‘Explicar com Reformular’ em que Maturana divide suas explicações
      • sobre o que acontecia com o ser vivo,
      • e o modo como ele o via no seu espaço de distinções
    • correspondem apropriadamente com o que Foucault chama respectivamente de 
      • Lugar desde onde se fala e 
      • Lugar do falado.

Processo e Mercado são os conceitos largamente utilizados;
e ao mesmo tempo não se ouve falar 

  • em Forma de produção
  • ou em Lugar de nascimento do que é empírico,
  • e menos ainda em Nexo da produção

como ideias – ou elementos de imagem – em modelos de operações e organizações

no pensamento clássico
aquém do objeto
antes de 1775

no pensamento moderno
diante do objeto
depois de 1825

espaço interior Triedro dos saberes
para além do objeto
reservado às Ciências humanas

Aquém do objeto:
Processo

Diante do objeto:
Forma de produção

Além do objeto
Nexo da operação

o elemento central em operações
no pensamento clássico
Processo
o elemento central em operações
no pensamento moderno
Forma de produção
o Nexo da produção,
o elemento central do modelo de organização no formato SSS
  • Elemento central:
    • Processo

entendido sob o primeiro conceito de verbo explicado por Michel Foucault, como elemento gerador de um sistema relativo de anterioridade ou simultaneidade das coisas entre si, que o mais que faz é indicar a coexistência de duas representações.

  • característica emergente: 
    • fluxo
  • metáfora 
    • transformação única
  • Elemento central:
    • Forma de produção

entendida sob o segundo conceito de verbo explicado por Michel Foucault, tratado como um ser misto, inicialmente palavra entre palavras, preso às mesmas regras às mesmas regras, obedecendo como elas às mesmas leis de regência e concordância, e depois, em recuo em relação a elas todas, numa região que não é aquela do falado, mas aquela donde se fala.

  • característica emergente:
    • permanência
  • metáfora
    • conversão ou duas transformações
  • Elemento central:
    • Nexo da produção

a formulação para além do objeto associa o sistema cujo resultado é o produto, aquilo que se quer obter, com o instrumento imprescindível para obtê-lo.

  • propriedades emergentes:
    • simetria, simbiose e sinergia

Em um pensamento mágico sobre a produção – nos moldes ‘varinha mágica de condão’ –  é possível desejar algo e, sem mais nada, vê-lo surgir à nossa frente depois do Plin!!! 

Num ambiente de produção real, porém, nada é produzido sem um instrumento com o qual instanciar esse objeto na realidade. A estrutura SSS é isso: a modelagem das operações de produção do objeto desejado juntamente com as operações de produção do objeto – distinto deste – laboratório piloto, ou fábrica, subindo um nível estrutural e impondo como elemento central o Nexo da produção

o significado/tratamento atribuído ao que seja um ‘Verbo’;
para o antes e para o depois da descontinuidade epistemológica

Ideias – ou elementos de imagem – centrais no LE e no LD da figura
Processo o elemento central no pensamento clássico
Forma de produção o elemento central no pensamento moderno, com as
designações primitivas e a linguagem de ação ou raiz

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

Aquém do objeto

Conceito de Verbo ‘Processo’
na configuração de pensamento
do período clássico, antes de 1775

Verbo como
Processo

“A única coisa que o verbo afirma
é a coexistência de duas representações:
por exemplo, 

  • a do verde
    e da árvore,

  • a do homem
    e da existência

    ou da morte; 

é por isso que
o tempo dos verbos

não indica
aquele [tempo]

em que as coisas existiram
no absoluto,

mas um sistema relativo
de anterioridade ou de simultaneidade
das coisas entre si.”

Diante e Além do objeto

Conceito de Verbo ‘Forma de produção’
na configuração de pensamento
do período moderno, depois de 1825

Verbo como
Forma de produção

“É preciso, portanto,
tratar esse verbo
como um ser misto,

ao mesmo tempo
palavra entre as palavras,

preso às mesmas regras,
obedecendo como elas
às leis de regência
e de concordância;


e depois,


em recuo em relação a elas todas,

  • numa região que não é
    aquela do falado

  • mas aquela
    donde se fala.

Ele está na orla do discurso,
na juntura entre

  • aquilo que é dito

  • e aquilo que se diz,

exatamente lá onde os signos
estão em via de se tornar linguagem.”

Dadas as grandes diferenças entre esses dois conceitos e tratamentos consequentes, para o que seja um ‘Verbo’, e a total consistência entre o segundo conceito/tratamento e ‘Forma de produção’

  • por que será que ‘Processo’ seja uma unanimidade nos textos sobre o assunto?

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV – Falar;
tópico III. A teoria do verbo
por Michel Foucault

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV – Falar;
tópico III. A teoria do verbo
por Michel Foucault

o significado/tratamento atribuído ao que seja um ‘Classificar’;
para o antes e para o depois da descontinuidade epistemológica

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

Aquém
do objeto

O conceito de ‘Classificar’
no pensamento clássico
o de antes de 1775

‘Classificar’
no pensamento clássico

Aquém do objeto,
isto é,
no pensamento filosófico Classico
o de antes de 1775

nessa faixa do espectro de modelos
que o pensamento de Michel Foucault permite desenhar

Classificar
é referir

  • o visível
  • a si mesmo,

encarregando um dos elementos
de representar os outros.”

Diante e Além
do objeto

O conceito de ‘Classificar’
no pensamento moderno
o de depois de 1825

‘Classificar’
no pensamento moderno

Diante, e Além do objeto, 
isto é, 
no pesamento filosófico moderno,
o de depois de 1825

nessa faixa do espectro de modelos 
que o pensamento de Michel Foucault permite desenhar

“Em um movimento
que faz revolver a análise

Classificar
é referir

  • o visível 
  • ao invisível 

– como a sua razão profunda -, 

e depois,
alçar de novo
dessa secreta arquitetura,
em direção aos seus
sinais manifestos,
que são dados
à superfície dos corpos.”

Dadas as grandes diferenças entre esses dois conceitos e tratamentos consequentes, por que será que ‘Processo’ seja uma unanimidade nos textos sobre o assunto?

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Cap. VII – Os limites da representação; tópico III. A organização dos seres

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Cap. VII – Os limites da representação; tópico III. A organização dos seres

pares de modelos constituintes das ciências do eixo epistemológico fundamental

  • da Vida(Biologia) [função-norma],
  • do Trabalho(Economia) [conflito-regra]
  • e da Linguagem(Filologia) [significação-sistema]

e o modelo constituinte padrão, comum a todas das ciências humanas; um modelo composto por uma combinação entre esses três pares de modelos constituintes das ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem

no pensamento clássico
antes de 1775
aquém do objeto

no pensamento moderno
depois de 1825
diante do objeto

no pensamento moderno
também depois de 1825
para além do objeto

não há modelos constituintes sob o pensamento clássico

O Triedro dos saberes: eixos e faces
espaço das ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem
O interior ao Triedro dos saberes
o espaço das Ciências humanas

Aquém do objeto

Não há modelos constituintes nesta faixa do espectro, já que nada é constituído na existência durante as operações;

Na configuração do pensamento pressupõe-se que todas as coisas
existem desde sempre e para sempre,
e integram o Universo em uma visão única.

Existem múltiplas ordens que podem ser arbitrariamente escolhidas para cada operação; e em uma mesma organização podem conviver ordens – como diz Foucault – ligeiramente diferentes. Tem-se inúmeras categorias para cada ordem escolhida, e muitas ordens possíveis de serem selecionadas.

Nada é constituído na existência como resultado das distinções feitas durante as operações nesta faixa do espectro.

Diante do objeto

A modelagem em cada área do saber é feita com um modelo constituinte específico e próprio de cada uma delas:

No que Foucault chama de ‘Região epistemológica Fundamental’ os Modelos constituintes são compostos por pares constituintes, próprios a cada região do saber ou área do conhecimento em que o modelo é feito:

  • Ciências da vida (Biologia):


    [função-norma]
    ;

  • Ciências do trabalho (Economia):


    [conflito-regra];

  • Ciências da Linguagem (Filologia):

    [significação-sistema].

Além do objeto

No campo das ciências humanas, o modelo constituinte de qualquer uma delas se unifica. Os Modelos constituintes são compostos por uma combinação dos três pares de modelos constituintes das ciências
da Vida
-(Biologia), do Trabalho-(Economia) e da Linguagem-(Filologia).

O Modelo constituinte  de cada uma das Ciências Humanas – é sempre uma combinação dos modelos constituintes das:

  • Ciências da vida  (Biologia):
    [função-norma];

    +
    Ciências do trabalho (Economia):
    [conflito-regra];

    +
    Ciências da Linguagem (Filologia):
    [significação-sistema].

Proposição: o bloco construtivo

  • padrão,
  • genérico
  • e fundamental

oferecido pela gramática da língua para construção de representações.

Esse bloco construtivo ‘proposição’ carrega valor para as representações, mas faz isso de ao menos dois modos diferentes e com duas visões distintas para o que sejam ‘operações’.

“Valer, para o pensamento clássico, é primeiramente valer alguma coisa, poder substituir essa coisa num processo de troca. A moeda só foi inventada, os preços só foram fixados e só se modificam na medida em que essa troca existe.

Ora, a troca é um fenômeno simples apenas na aparência.

Com efeito, só se troca numa permuta, quando cada um dos dois parceiros reconhece um valor para aquilo que o outro possui.

Num sentido, é preciso, pois, que as coisas permutáveis, com seu valor próprio, existam antecipadamente nas mãos de cada um, para que

  • a dupla cessão
  • e a dupla aquisição

finalmente se produzam.

Mas, por outro lado, o que cada um come e bebe, aquilo de que precisa para viver não tem valor enquanto não o cede; e aquilo de que não tem necessidade é igualmente desprovido de valor enquanto não for usado para adquirir alguma coisa de que necessite.

Em outras palavras, para que, numa troca, uma coisa possa representar outra,

  • é preciso que elas existam já carregadas de valor;
    • e, contudo, o valor só existe no interior da representação
      (atual ou possível), isto é,
    • no interior da troca ou da permutabilidade.

“A proposição é
para a linguagem
o que a representação é
para o pensamento
sua forma,
ao mesmo tempo
mais geral
e mais elementar
porquanto,
desde que a decomponhamos,
não encontremos mais o discurso
mas seus elementos
como tantos materiais dispersos

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Cap. IV – Falar;
tópico: III – A teoria do verbo
Michel Foucault

no pensamento clássico
antes de 1775

no pensamento moderno
depois de 1825

questão/pergunta

a proposição no pensamento clássico
ponto de aplicação da leitura de operações no momento da troca

a toda a essência da linguagem  encerrada – diretamente – na própria proposição;

junto com esse ‘encerramento’ vão as ideias – ou elementos de imagem – necessários para a formulação da proposição, que assim, não participam do modelo de operações.

a proposição no pensamento moderno ponto de aplicação da leitura de operações antes da troca

a descoberta da essência da linguagem  fora dela mesma, linguagem; a proposição formulada no modelo por suas ideias ou elementos de imagem presentes; inicialmente vazia, apenas um enunciado, é preenchida de valor a partir de duas fontes:

  • as designações primitivas;
  • a linguagem de ação ou raiz

ambas assinaladas na figura.

“Daí duas possibilidades simultâneas de leitura:

1 uma analisa o valor

  • no ato mesmo da troca,

no ponto de cruzamento
entre o dado e o recebido;

  • A primeira dessas duas leituras corresponde a uma análise que coloca e encerra toda a essência da linguagem no interior da
    • proposição;

3 no primeiro caso, com efeito, a linguagem encontra seu lugar de possibilidade numa atribuição assegurada pelo verbo – isto é, por esse elemento da linguagem em recuo relativamente a todas as palavras mas que as reporta umas às outras; o verbo, tornando possíveis todas as palavras da linguagem a partir de seu liame proposicional, corresponde à troca que funda, como um ato mais primitivo que os outros, o valor das coisas trocadas e o preço pelo qual são cedidas;

2 outra analisa-o

  • como anterior à troca 

e como condição primeira
para que esta possa ocorrer.

  • a outra, a uma análise que descobre essa mesma essência da linguagem
    do lado das
    • designações primitivas
    • linguagem de ação ou raiz;

4 a outra forma de análise, a linguagem está enraizada 

  • fora de si mesma e como que
    • na natureza, ou nas   
    • analogias das coisas;

a raiz, o primeiro grito que dera nascimento às palavras antes mesmo que a linguagem tivesse nascido, corresponde à formação imediata do valor,

  • antes da troca
  • e das medidas recíprocas da necessidade.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

Ideias – ou elementos de imagem – requeridos para a
Formulação da proposição, e valor carregado 

Ideias – ou elementos de imagem requeridos para formulação da proposição ausentes da estrutura do modelo de operação.

Valor carregado diretamente na proposição.

impossibilidade de formulação da proposição com ideias – ou elementos de imagem – requeridos, pela ausência do homem em sua duplicidade de papéis, e pela noção de objeto descrito por suas propriedades originais e constitutivas.

Proposição formulada com ideias ou elementos de imagem pertencentes à estrutura interna do modelo de operações;

Valor carregado pela proposição com origem fora da linguagem

  • designações primitivas

a busca por origem, condições de possibilidade e de generalidade dentro de limites, para a representação da empiricidade objeto no domínio e ambiente em que a operação acontece. 

  • linguagem de ação ou raiz

todo o conteúdo do Repositório de proposições explicativas da experiência formuladas de acordo com as regras da língua, à disposição da construção de novas representações.

Os tipos de sistemas que dão suporte a operações,
em função da configuração do pensamento:

  • no pensamento clássico: o sistema Input-Output, ou um sistema relativo de anterioridade ou simultaneidade das coisas entre si;
  • no pensamento moderno: um sistema construído no interior do Lugar de nascimento do que é empírico, lugar onde as empiricidades objeto das operações adquirem ‘o ser que lhes é próprio’.

no pensamento clássico
antes de 1775
verbo ‘Processo

no pensamento moderno
depois de 1825
verbo ‘Forma de produção

questão/pergunta

Operação clássica sob o conceito de Verbo ‘Processo’
na configuração de pensamento
do período clássico, antes de 1775

“A única coisa
que o verbo afirma

é a coexistência de duas representações:
por exemplo, 

  • a do verde
    e da árvore,

  • a do homem
    e da existência

    ou da morte; 

é por isso
que o tempo dos verbos

não indica
aquele [tempo]

em que as coisas existiram
no absoluto,

mas um sistema relativo
de anterioridade ou de simultaneidade
das coisas entre si.”

Operação moderna sob o conceito de
Verbo ‘Forma de produção’
na configuração de pensamento
do período moderno, depois de 1825

“É preciso, portanto,
tratar esse verbo
como um ser misto,

ao mesmo tempo
palavra entre as palavras,

preso às mesmas regras,
obedecendo como elas
às leis de regência
e de concordância;


e depois,


em recuo em relação a elas todas,

  • numa região que não é
    aquela do falado

  • mas aquela
    donde se fala.

Ele está na orla do discurso,
na juntura entre

  • aquilo que é dito

  • e aquilo que se diz,

exatamente lá onde os signos
estão em via de se tornar linguagem.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV – Falar;
tópico III. A teoria do verbo
por Michel Foucault

O tipo de sistema

O conceito acima é explícito em fornecer uma descrição do tipo de sistema para operações sob o pensamento clássico.

Trata-se de 

  • um sistema relativo
    de anterioridade ou de simultaneidade
    das coisas entre si; 

uma definição magistral para o que seja o sistema Input-Output.

asdf

Trata-se de um sistema relativo de anterioridade ou de simultaneidade das coisas entre si; uma definição magistral para o que seja o sistema Input-Output.

O tipo de leitura

asdf

Trata-se de um sistema relativo de anterioridade ou de simultaneidade das coisas entre si; uma definição magistral para o que seja o sistema Input-Output.

asdf

Trata-se de um sistema relativo de anterioridade ou de simultaneidade das coisas entre si; uma definição magistral para o que seja o sistema Input-Output.

o tempo nas operações, em função dos sistemas
em cada segmento do espectro de modelos

no pensamento clássico
antes de 1775
aquém do objeto

no pensamento moderno
depois de 1825
diante e para além do objeto

no pensamento moderno
também depois de 1825
diante e para além do objeto

formulação reversível
e somente 
instanciamento
da representação;
deus Chronos

formulação irreversível
e operação de construção
da representação 
deus Kairós

formulação reversível
 e operação instanciamento
da representação
deus Chronos

pensamento clássico, o de antes de 1775
tempo calendário no sistema Input-Output
operação de instanciamento de representação anteriormente formulada
pensamento moderno, o de depois de 1825
tempo absoluto sistema absoluto
no caminho da Construção da representação
pensamento moderno, o de depois de 1825
tempo relativo, sistema relativo ou absoluto,
no caminho do Instanciamento da representação

Aquém do objeto

Diante ou para além do objeto

Nota: a existência precede as distinções feitas na operação.

Tempo na formulação e no instanciamento da representação:

  • formulação reversível durante a formulação;
  • tempo calendário, ou tempo relativo no sentido de que
    • dada a inserção calendário de um evento (i) ou (f),
    • a posição calendário do outro evento (f) ou (i) pode ser calculada com as propriedades aparentes disponíveis antes e depois da operação;
  • irreversibilidades somente na etapa de instanciamento da representação

Não há nada que possa ser afirmado, posto, disposto e repartido no espaço do saber para eventuais conhecimentos e ciências possíveis e assim não se pode falar em ‘modo de ser fundamental’ do que quer que seja. 

Assim, no pensamento clássico, não é possível adotar esse conceito ‘modo de ser fundamental das empiricidades’ como elemento ordenador da história, que é compreendida como sucessão de fatos assim como se sucedem.

caminho da
Construção da representação
Nota: a existência se constitui com as distinções feitas na operação

Durante essa operação, a empiricidade objeto da operação, sim, muda seu ‘modo de ser fundamental’ nesse domínio e ambiente em decorrência da operação.

Tempo no caminho da Construção da representação, durante a formulação da representação:

  • formulação irreversível durante a formulação;
  • tempo absoluto no sentido de que a empiricidade objeto ‘assume o ser que lhe é próprio’ em decorrência da operação, e então:
    • dada a inserção calendário de um evento (i) ou (f)
    • não é possível o cálculo da inserção calendário do outro evento (f) ou (i) a partir dessa inserção calendário do evento anterior em virtude da não disponibilidade das propriedades antes/depois da operação;
  •  irreversibilidades ocorrem na formulação da operação de construção da representação.

A empiricidade objeto da operação tem um novo ‘modo de ser fundamental’, isto é, pode ser ‘afirmada, posta, disposta e repartida no espaço do saber para eventuais conhecimentos e ciências possíveis’.

Tomando o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades como elemento ordenador da história, durante esse tipo de operações, sim, faz-se história.

 caminho do
Instanciamento da representação

Nota: a existência volta a preceder as distinções feitas na operação.
 

Durante essa operação a empiricidade objeto não muda seu ‘modo de ser fundamental’ nesse domínio e ambiente em decorrência da operação.

Tempo  no caminho do Instanciamento da representação previamente existente no Repositório e dele recuperada para a posição de empiricidade objeto na presente operação de instanciamento:

  • formulação volta a ser reversível; (é possível descartar uma formulação de instanciamento e formular outra com novas escolhas, sem perdas;
  • tempo volta a ser tempo calendário, ou tempo relativo;
  • irreversibilidades no caminho do Instanciamento da representação ocorrem em decorrência do desencadeamento dos elementos de suporte na experiência à Forma de produção.

A empiricidade objeto da operação tem exatamente o mesmo ‘modo de ser fundamental’ com que foi recuperada do repositório, isto é, pode ser ‘afirmada, posta, disposta e repartida no espaço do saber para eventuais conhecimentos e ciências possíveis’ exatamente da mesma forma como havia sido acrescentada ao repositório.

Tomando o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades como elemento ordenador da História, durante esse tipo de operações não se faz história.

Modelagem de operações e organizações organizadas pelo par sujeito-objeto, com operações específicas e separadas para cada um desses pares, porém relacionadas:

 

  • um modelo para a operação e organização para o objeto esperado pelo Cliente (Produto);
  • e um modelo para a operação e organização  para o instrumento capaz de obter o Produto, bem como obter o objeto esperado pelo Acionista (Benefícios de toda espécie, Lucros)

Mapa geral das operações na disposição SSS

Modelagem para uma organização incluindo o objeto esperado de interesse do Cliente
e o instrumento capaz de obtê-lo, e também o objeto esperado de interesse do Acionista
identificando o nexo da produção

Argumento: a modelagem de operações
organizada pelo par sujeito-objeto

Construção da estrutura de operações na disposição SSS – Simétrica, Simbiótica e Sinérgica

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Cronologia básica da descontinuidade epistemológica ocorrida em nossa cultura ocidental entre os anos 1775-1825 segundo Michel Foucault.

  • fases e ponto de ruptura desse evento;
  • linha de tempo com as defasagens entre conquistas no pensamento e respectivo uso nas áreas técnicas;
  • alguns autores importantes de um e de outro lado desse evento;
  • ponto de entrada do homem em nossa cultura;
  • alguns autores citados como referências em modelos sociais, econômicos e políticos
Michel Foucault
1926-1984

“E foi realmente necessário 
um acontecimento fundamental
– um dos mais radicais, sem dúvida, 1
que ocorreram na cultura ocidental,
para que se desfizesse a positividade do saber clássico
e se constituísse uma positividade de que, por certo,
não saímos inteiramente.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VII – Os limites da representação;
tópico I. A idade da história

Cronologia da descontinuidade epistemológica de 1775-1825;
defasagens entre conquistas no pensamento filosófico e respectiva utilização prática

cronologia básica da descontinuidade epistemológica de 1775-1825

A descontinuidade epistemológica ocorrida entre 1775 e 1825, segundo o pensamento de Michel Foucault
uma linha de tempo mostrando os intervalos de tempo entre o desenvolvimento de conhecimento e sua aplicação prática

O ponto de surgimento do homem em nossa cultura

 “É somente na segunda fase que as palavras, as classes e as riquezas adquirirão um modo de ser que não é mais compatível com o da representação.

Em contra partida, o que se modifica muito cedo, desde as análises de Adam Smith, de A.-L. de Jussieu ou de Viq d’Azyr, na época de Jones ou de Anquetil-Duperron,

  • é a configuração das positividades: a maneira como, no interior de cada uma,
    • os elementos representativos funcionam uns em relação aos outros, 
    • a maneira como asseguram seu duplo papel de designação e de articulação, 
    • como chegam, pelo jogo das comparações, a estabelecer uma ordem. “

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas
Cap.VII – Os limites da representação
tópico I. A idade da história

Datas e fases da descontinuidade epistemológica ocorrida entre 1775 e 1825, e surgimento do homem no pensamento em nossa cultura segundo o pensamento de Michel Foucault.

Alguns autores fundamentos filosóficos do liberalismo, e autores chave do pensamento moderno posicionados em relação à descontinuidade epistemológica de 1775-1825

Algumas personagens importantes para entendimento da descontinuidade epistemológica de 1775-1825

Michel Foucault ao delinear sua arqueologia das ciências humanas, propósito do ‘As palavras e as coisas’, com certeza tomou conhecimento do trabalho desses autores.

  • autores clássicos:
    • Adam Smith,
    • John Locke, 
    • David Hume, 
    • J. J. Rousseau, 
    • Jeremy Bentham, 
    • e J. M. Keynes (este, expressamente classificado por Foucault como não moderno)
  • autores modernos:
    • David Ricardo
    • Sigmund Schlomo Freud 
    • entre muitos outros.

Michel Foucault menciona ainda em destaque, como artífices do pensamento moderno e fontes para o seu próprio pensamento:

  • Georges Cuvier, naturalista, 1769-1832
  • Franz Bopp, linguista, 1792-1867
  • David Ricardo, economista, 1772-1823

Exemplos de modelos de operações e de organizações sem a possibilidade de fundar as sínteses (do objeto das operações) no espaço da representação e com ponto de inserção da análise de operações no cruzamento entre o dado e o recebido na operação de troca

Funcionamento
do pensamento
funcionamento das operações no pensamento clássico
Modelo de
Operação de produção
relação do modelo de operações de produção de E. S. Buffa
e o sistema Input-Output
do LE da figura.
Modelo da 
Organização de produção
Um modelo de organização sob o pensamento clássico, destacando a utilização de múltiplas ordens, ou
múltiplos sistemas de categorias
Modelo de operações
e de organização
Modelo FEPSC(SIPOC), Six Sigma
Modelo de  Operação
contábil-financeira
O modelo de operação
no sistema contábil-financeiro
Modelo da  Organização
ponto de vista financeiro
a organização no sistema contábil-financeiro

Exemplos de modelos de operações e de organizações no pensamento moderno, e assim  com a possibilidade de fundar as sínteses (do objeto das operações) no espaço da representação e com ponto de inserção da análise de operações antes do cruzamento entre o dado e o recebido na operação de troca

Funcionamento
de operação do pensamento
O funcionamento das operações no pensamento moderno
Modelo de
Operação de produção
relação entre o modelo descritivo da produção do Kanban e ‘essa maneira moderna de conhecer empiricidades’
Modelo da 
Organização de produção
o modelo de organização ‘Mapa da atividade semicondutores’, da Reengenharia, o modelo de operações do Kanban e o modelo moderno de operações
O modelo descritivo da produção do Kanban operação de
instanciamento de representação
O mapa da atividade semicondutores da Texas Instruments: modelo de organização
do movimento Reengenharia

O espaço interior do Triedro dos saberes – habitat das ciências humanas, com modelos situados no espectro de modelos no segmento para além do objeto

Assim, estes três pares,

  • função e norma,
  • conflito e regra,
  • significação e sistema,

cobrem, por completo, o domínio inteiro do conhecimento do homem. 

Mas, qualquer que seja a natureza da análise e o domínio a que ela se aplica, tem-se um critério formal para saber o que é

  • do nível da psicologia,
  • da sociologia
  • ou da análise das linguagens

é a escolha do modelo fundamental e a posição dos modelos secundários que permitem saber em que momento

  • se “psicologiza” ou se “sociologiza” no estudo das literaturas e dos mitos, em que momento se faz, em psicologia, decifração de textos ou análise sociológica. 

Mas essa superposição de modelos não é um defeito de método. 

Só há defeito se os modelos não forem ordenados e explicitamente articulados uns com os outros.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo X  – As ciências humanas;
 III. Os três modelos
Michel Foucault 

O Triedro dos saberes: eixos e faces
espaço das ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem
O interior ao Triedro dos saberes
o espaço das Ciências humanas

Aquém do objeto

Não há modelos constituintes nesta faixa do espectro, já que nada é constituído na existência durante as operações;

  • o ponto de inserção na análise do fenômeno ‘operações está no cruzamento entre o que é dado e o que é recebido na operação de troca.

Na configuração do pensamento pressupõe-se que todas as coisas
existem desde sempre e para sempre,
e integram o Universo em uma visão única.

Existem múltiplas ordens que podem ser arbitrariamente escolhidas para cada operação; e em uma mesma organização podem conviver ordens – como diz Foucault – ligeiramente diferentes. Tem-se inúmeras categorias para cada ordem escolhida, e muitas ordens possíveis de serem selecionadas.

Nada é constituído na existência como resultado das distinções feitas durante as operações nesta faixa do espectro.

Diante do objeto

No eixo epistemológico fundamental – ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem, a modelagem em cada área do saber pode ser feita com um modelo constituinte específico e próprio de cada uma delas:

  • em todas, o ponto de inserção na análise do fenômeno ‘operações’ está antes do cruzamento entre o dado e o recebido, e portanto antes da existência destes.

No que Foucault chama de ‘Região epistemológica Fundamental’ os Modelos constituintes são compostos por pares constituintes, próprios a cada região do saber ou área do conhecimento em que o modelo é feito:

  • Ciências da vida (Biologia):


    função-norma
    ;

  • Ciências do trabalho (Economia):


    conflito-regra;

  • Ciências da Linguagem (Filologia):

    significação-sistema.

Além do objeto

No campo das ciências humanas, o modelo constituinte de qualquer uma delas se unifica. 

Os Modelos constituintes são compostos por uma combinação dos três pares de modelos constituintes das ciências

  • da Vida-(Biologia),
  • do Trabalho-(Economia)
  • e da Linguagem-(Filologia).

O Modelo constituinte  de cada uma das Ciências Humanas – é uma combinação – ponderada pelo projetista de modelos.

O modelo composto é uma combinação dos três pares de modelos constituintes: 

  • Ciências da vida  (Biologia):
    função-norma;

    +
    Ciências do trabalho (Economia):

    conflito-regra;
    +
    Ciências da Linguagem (Filologia):
    significação-sistema.

Sob ciências humanas como:

  • economia política;
  • sociologia,
  • psicologia e psicanálise

estão modelos compostos, que são combinações ponderadas dos três pares de modelos constituintes das ciências integrantes do eixo epistemológico fundamental.

A descrição feita por Michel Foucault de duas possibilidades
de posicionamento do pensamento com relação a valor

“Valor, para o pensamento clássico, é primeiramente valer alguma coisa, poder substituir essa coisa num processo de troca. A moeda só foi inventada, os preços só foram fixados e só se modificam na medida em que essa troca existe.

Ora, a troca é um fenômeno simples apenas na aparência.

Com efeito, só se troca numa permuta, quando cada um dos dois parceiros reconhece um valor para aquilo que o outro possui.

Num sentido, é preciso, pois, que as coisas permutáveis, com seu valor próprio, existam antecipadamente nas mãos de cada um, para que a dupla cessão e a dupla aquisição finalmente se produzam.

Mas, por outro lado, o que cada um come e bebe, aquilo de que precisa para viver não tem valor enquanto não o cede; e aquilo de que não tem necessidade é igualmente desprovido de valor enquanto não for usado para adquirir alguma coisa de que necessite.

Em outras palavras, para que, numa troca, uma coisa possa representar outra, é preciso que elas existam já carregadas de valor; e, contudo, o valor só existe no interior da representação (atual ou possível), isto é, no interior da troca ou da permutabilidade.

Daí duas possibilidades simultâneas de leitura:

  1. uma analisa o valor no ato mesmo da troca, no ponto de cruzamento entre o dado e o recebido;
  2. outra analisa-o como anterior à troca e como condição primeira para que esta ossa ocorrer.

Os dois pontos de partida distintos adotados pelo pensamento para análise de valor

1. a primeira possibilidade de leitura

A análise de valor no ato mesmo da troca,
no ponto de cruzamento entre o dado e o recebido

2. a segunda possibilidade de leitura

A análise de valor como anterior à troca
e como condição primeira para que esta possa ocorrer.

A primeira dessas duas leituras corresponde a uma análise que coloca e encerra toda a essência da linguagem no interior da proposição;

  • no [neste] primeiro caso, com efeito, a linguagem encontra seu lugar de possibilidade numa atribuição assegurada pelo verbo – isto é, por esse elemento da linguagem em recuo relativamente a todas as palavras mas que as reporta umas às outras; o verbo, tomando possíveis todas as palavras da linguagem a partir de seu liame proposicional, corresponde à troca que funda, como um ato mais primitivo que os outros, o valor das coisas trocadas e o preço pelo qual são cedidas;

a outra, [corresponde] a uma análise que descobre essa mesma essência da linguagem do lado das designações primitivas – linguagem de ação ou raiz(*);

  • na outra [nesta] forma de análise, a linguagem está enraizada fora de si mesma e como que na natureza ou nas analogias das coisas; a raiz, o primeiro grito que dera nascimento às palavras antes mesmo que a linguagem tivesse nascido, corresponde à formação imediata do valor, antes da troca e das medidas recíprocas da necessidade.

Propriedades das operações e organizações modeladas com a paleta de ideias ou elementos de imagem do pensamento moderno, depois de 1825, e no caminho do Instanciamento da representação

Propriedades das operações e organizações modeladas com a paleta de ideias ou elementos de imagem do pensamento clássico, antes de 1775

Propriedades das operações e organizações modeladas com a paleta de ideias ou elementos de imagem do pensamento moderno, depois de 1825, e no caminho da Construção da representação

5. História do nascimento do livro ‘As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas’, contada por Michel Foucault

Uma história do nascimento do livro 'As palavras e as coisas',
contada pelo próprio autor, Michel Foucault, no Prefácio,
inclusive o relato das dificuldades enfrentadas.

1 - A ideia que deu origem ao livro
'As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas

No Prefácio do ‘As palavras e as coisas’, Michel Foucault faz como que um quadro sinóptico do livro inteiro mencionando conceitos importantes; a história do nascimento do ‘As palavras e as coisas’ contada por Foucault no Prefácio começa com uma exposição sobre o que ele chama de ‘familiaridades’ do pensamento, diz ele que “do nosso: daquele que tem a nossa idade e a nossa geografia” que seriam abaladas pelo mágico texto de uma certa enciclopédia chinesa.

Fizemos uma animação de 7:27m na qual na mesma figura representamos esse pensamento ao qual Foucault se refere como sendo o nosso, aquele com a nossa idade e geografia, e um outro pensamento com o qual também estamos familiarizados até pela circunstância de uma contaminação de entendimentos historicamente distintos.

A animação mostra ao mesmo tempo em que o texto prossegue as diferenças, estruturalmente o que se ganha o perde com uma ou outra dessas configurações.

O texto dessa história do nascimento desse livro começa alertando para os perigos da desordem – para além daquela do incongruente e da aproximação do que não convém -, a desordem da utilização simultânea de múltiplas ordens parecidas mas a tal ponto diferentes que torna-se impossível encontrar-lhes um espaço de acolhimento, definir por baixo de umas e outras, um lugar comum. (*)

Há no relato completo dessa história do Prefácio:(**)

  • o conceito de ordem: duas alternativas distintas;
  • uma série de comentários sobre os referenciais do pensamento – Utopia e Heterotopia – em dois casos diferentes de configurações do pensamento;
  • as duas sintaxes envolvidas nas configurações do pensamento;
    • a que permite a construção das frases
    • e a que autoriza a manter juntas, ao lado e em frente umas das outras, as palavras e as coisas;

O entendimento desses conceitos abordados na historia do nascimento do livro no Prefácio depende da compreensão das duas leituras possíveis para o fenômeno ‘operações’ e respectivas análises de valor, e a influência delas nos dois princípios para trabalho coexistentes entre nós.

(*) na animação que fizemos para navegar entre o texto de Foucault no Prefácio e as formulações que temos de modelos de operações e de organizações, há um exemplo de modelo de organização bastante representativo dessa utilização de múltiplas ordens parecidas.

(**) Nessa pequena história do nascimento do ‘As palavras e as coisas’ Foucault se utiliza dos conceitos de ordem e de sintaxes. Mas no livro estão ainda os conceitos de Verbo, de Classificar, História, os Espaços Gerais do Saber, respectivamente para as configurações do pensamento – aquele com o qual queiramos ou não pensamos, e o anterior a este. Veja esses conceitos duplos aqui.

1. Plataforma adotada para exposição de ideias

A plataforma visual adotada para exposição das imagens feitas para ilustrar os conceitos

A Figura 2 - Diagrama ontológico ou O explicar e a experiência, de Maturana
esquadrinhamento da figura com comentários e propostas de alterações
usando o pensamento de Michel Foucault

a plataforma adotada para dar suporte às figuras ou imagens correspondentes aos conceitos encontrados no livro ‘As palavras e as coisas’ será

  • a Figura 2 – Diagrama ontológico; do tópico Reflexões epistemológicas, do livro Cognição, Ciência e Vida cotidiana; 

ou ainda essencialmente a mesma figura, com as observações sobre diferenças

  • a Figura 2 – O Explicar e a Experiência; do Cap. Linguagem, Emoções e Ética nos Afazeres Políticos, do livro Emoções e Linguagem na Educação e na Política;

ambos esses dois livros de Humberto Maturana, 

Vamos utilizar essa figura – com as alterações –  como plataforma para o trânsito de e para (ida e volta): 

Texto ↔ Imagem ↔ Ocorrências espacio-temporais 

seguindo a orientação de Flusser . 

E fizemos alterações e complementações nela, o que pode ser visto em outra animação neste trabalho.

0. Influências e inspirações

0. Influências e inspirações

1 a influência de Vilém Flusser no livro ‘Filosofia da caixa preta’: 

uso das funções reversíveis Imaginação e Conceituação para navegar, ida e volta, entre 

textos ↔ imagens ↔ e ocorrências espacio-temporais; 

e ainda, não menos importante

    • as imagens tradicionais, as imagens técnicas, as classes de abstrações que usamos cotidianamente;
Vilém-Flusser-Portrait-008
Vilém Flusser
1920-1991

2 as sugestões de Humberto Maturana nos livros: Cognição, Ciência e Vida cotidiana; Emoções e Linguagem na Educação e na Política; ‘De máquinas e de seres vivos’:

objeções e propostas de mudança feitas por Maturana ao fazer dos pesquisadores em IA do MIT do final dos anos ’50, aceitação de algumas das críticas feitas, e aparentemente, uma alteração de rota;

Humberto Maturana
1928-

3 a influência especialmente muito forte de Michel Foucault no livro ‘As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas’:

a descoberta de duas pedras de tropeço durante seu trabalho nesse livro, a saber:

    • uma impossibilidade (ainda em nossos dias) de fundar as sínteses no espaço da representação, presente no nosso pensamento cotidiano;
    • e uma obrigação de abrir o campo transcendental da subjetividade constituindo, para além do objeto, os quase-transcendentais Vida(Biologia), Trabalho(Economia) e Linguagem(Filologia).
Michel Foucault
1926-1984

9. a proposição: dois tipos diferentes quanto à origem do valor que carregam

9. a proposição: dois tipos diferentes quanto à origem interna ou externa à linguagem, do valor que carregam

O fenômeno ‘operações’ (em qualquer área): visões com duas abrangências muito diferentes dependendo da leitura que fazemos.

As duas possibilidades de inserção do ponto de início da leitura do fenômeno ‘operações’ – de qualquer tipo – e a análise das diferentes origens do valor carregado pelas proposições para as representações em função da inserção do ponto de início de leitura de ‘operações’; 

Duas visões, duas leituras do fenômeno ‘operações’:
sob o pensamento clássico, o de antes de 1775; (seta amarela)
sob o pensamento moderno, o de depois de 1825 (seta vermelha)
com duas amplitudes – duas abrangências muito diferentes

Note-se que as condições para a ocorrência da troca – a existência simultânea dos dois objetos de troca, o que é dado e o que é recebido – são satisfeitas em duas situações:

  • 1. no pensamento clássico pelo posicionamento do ponto de início de leitura sob essa condição, quer dizer, a existência prévia do que é dado e do que é recebido;
  • 2. no pensamento moderno, pela satisfação dessa pré-condição no início do Instanciamento da representação, porém com a condição da execução anterior da Construção da representação, também incluída no escopo da operação. 

Nos pontos marcados por setas amarelas para baixo (1) e (2) as pré-condições para a ocorrência da troca são dadas, qualquer que seja a estrutura de pensamento – clássico ou moderno – segundo o pensamento de Michel Foucault.

O que não muda entre essas duas possibilidades

A proposição como bloco construtivo padrão fundamental e genérico para construção de representações e suas duas possibilidades de carregamento de valor, quanto às respectivas origens

A proposição é para a linguagem
o que a representação é
para o pensamento:
sua forma, ao mesmo tempo
mais geral e mais elementar,
porquanto, desde que a decomponhamos, não reencontraremos mais o discurso,
mas seus elementos
como tantos materiais dispersos.

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV  – Falar;
tópico III – Teoria do verbo
Michel Foucault 

(…) Em outras palavras,
para que, numa troca,
uma coisa possa representar outra,
é preciso que elas existam
já carregadas de valor;
e, contudo,
o valor só existe
no interior da representação

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

O que sim muda entre essas duas possibilidades

A origem do valor carregado pelo veículo de carregamento de valor na representação: a proposição, sempre, porém em linguagens essencialmente diferentes e representações com origens de valor distintas.

“Valer, para o pensamento clássico,
é primeiramente valer alguma coisa,
poder substituir essa coisa num processo de troca.

A moeda só foi inventada,
os preços só foram fixados e só se modificam
na medida em que essa troca existe.

Ora, a troca é um fenômeno simples
apenas na aparência.

Com efeito, só se troca numa permuta,
quando cada um dos dois parceiros
reconhece um valor
para aquilo que o outro possui.

Num sentido, é preciso, pois,
que as coisas permutáveis,
com seu valor próprio,
existam antecipadamente nas mãos de cada um,
para que a dupla cessão e a dupla aquisição
finalmente se produzam.

Mas, por outro lado,

  • o que cada um come e bebe,
    aquilo de que precisa para viver
    não tem valor
    enquanto não o cede;
  • e aquilo de que não tem necessidade
    é igualmente desprovido de valor
    enquanto não for usado
    para adquirir alguma coisa de que necessite.

Em outras palavras,
para que, numa troca,
uma coisa possa representar outra,
é preciso que elas existam
já carregadas de valor;
e, contudo,
o valor só existe
no interior da representação

  • (atual [troca imediata]
  • ou possível [permutabilidade]),

isto é, no interior

  1. da troca
    [representação existente]
  2. ou da permutabilidade
    [representação possível]
    .

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

O funcionamento da troca em cada uma das duas possibilidades de leitura do fenômeno ‘operação’: no ato mesmo da troca; ou anterior à troca, na criação das condições de troca

“Daí duas possibilidades simultâneas de leitura:

  1. leitura já dadas as condições de troca;
  2. leitura na permutabilidade, isto é na criação de condições de troca

1 uma analisa o valor
no ato mesmo da troca,
no ponto de cruzamento
entre o dado e o recebido;

  • A primeira dessas duas leituras corresponde a uma análise que coloca e encerra
    • toda a essência da linguagem no interior da proposição;

3 no primeiro caso, com efeito, a linguagem encontra seu lugar de possibilidade numa atribuição assegurada pelo verbo – isto é, por esse elemento da linguagem em recuo relativamente a todas as palavras mas que as reporta umas às outras; o verbo, tornando possíveis todas as palavras da linguagem a partir de seu liame proposicional, corresponde à troca que funda, como um ato mais primitivo que os outros, o valor das coisas trocadas e o preço pelo qual são cedidas;

2 outra analisa-o
como anterior à troca
e como condição primeira
para que esta possa ocorrer.

  • a outra, a uma análise que descobre essa mesma essência da linguagem do lado das
    • designações primitivas
    • linguagem de ação ou raiz;

4 a outra forma de análise, a linguagem está enraizada 

fora de si mesma e como que

    • na natureza, ou nas   
    • analogias das coisas;

a raiz, o primeiro grito que dera nascimento às palavras antes mesmo que a linguagem tivesse nascido, corresponde à formação imediata do valor, antes da troca e das medidas recíprocas da necessidade.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VI – Trocar;
V. A formação do valor
Michel Foucault 

Esta segunda leitura para ‘operações’
– que orienta a análise de valor
desde antes do momento da troca -,
não é possível sem a presença do homem
na estrutura dos modelos.

Isso fica bastante claro com a descrição da forma de reflexão que se instaura em nossa cultura depois da descontinuidade epistemológica de 1775-1825

Esses dois pontos de inserção da leitura da operação de troca
mostrados nos modelos de operações

Colocando o ponto de inserção de leitura do fenômeno ‘operações’ antes da existência dos objetos envolvidos na troca, ocorre uma portentosa ampliação no escopo da operação – de qualquer natureza -, incorporando toda a etapa de construção de representação nova. Veja isso aqui.

8. Os dois conceitos para o tempo, em função do segmento do espectro de modelos e do tipo de operação

8. Os dois conceitos para o tempo, em função do segmento do espectro de modelos e do tipo de operação em curso

Aquém do objeto

formulação sim reversível
e
instanciamento da representação
deus Chronos

pensamento clássico, o de antes de 1775
tempo calendário no sistema Input-Output
operação de instanciamento de representação anteriormente formulada

Diante do objeto

formulação não reversível
e construção da representação nova
deus Kairós 

pensamento moderno, o de depois de 1825
tempo absoluto sistema absoluto
no caminho da Construção da representação

também Diante do objeto

formulação sim reversível
 e instanciamento da representação
deus Chronos

pensamento moderno, o de depois de 1825
tempo relativo, sistema relativo ou absoluto,
no caminho do Instanciamento da representação

Aquém do objeto

qualquer operação

Nota: a existência precede as distinções feitas na operação.

Tempo na formulação e no instanciamento da representação:

  • formulação reversível durante a formulação;
  • tempo calendário, ou tempo relativo no sentido de que
    • dada a inserção calendário de um evento (i) ou (f),
    • a posição calendário do outro evento (f) ou (i) pode ser calculada com as propriedades aparentes disponíveis antes e depois da operação;
  • irreversibilidades somente na etapa de instanciamento da representação

Não há nada que possa ser afirmado, posto, disposto e repartido no espaço do saber para eventuais conhecimentos e ciências possíveis e assim não se pode falar em ‘modo de ser fundamental’ do que quer que seja. 

Assim, no pensamento clássico, não é possível adotar esse conceito ‘modo de ser fundamental das empiricidades’ como elemento ordenador da história, que é compreendida como sucessão de fatos assim como se sucedem.

Diante do objeto

caminho da Construção da representação
Nota: a existência se constitui com as distinções feitas na operação

Durante essa operação a empiricidade objeto sim, muda seu ‘modo de ser fundamental’ nesse domínio e ambiente em decorrência da operação.

Tempo no caminho da Construção da representação, durante a formulação da representação:

  • formulação irreversível durante a formulação;
  • tempo absoluto no sentido de que
    • dada a inserção calendário de um evento (i) ou (f)
    • não é possível o cálculo da inserção calendário de outro evento (f) ou (i) a partir da inserção calendário do evento anterior em virtude da não disponibilidade das propriedades antes/depois da operação;
  •  irreversibilidades tanto na formulação da operação quanto no seu instanciamento da representação.

A empiricidade objeto da operação tem um novo ‘modo de ser fundamental’, isto é, pode ser ‘afirmada, posta, disposta e repartida no espaço do saber para eventuais conhecimentos e ciências possíveis’.

Tomando o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades como elemento ordenador da história, durante esse tipo de operações sim, faz-se história.

 também Diante do objeto

caminho do Instanciamento da representação
Nota: a existência volta a preceder as distinções feitas na operação.
 

Durante essa operação a empiricidade objeto não muda seu ‘modo de ser fundamental’ nesse domínio e ambiente em decorrência da operação.

Tempo  no caminho do Instanciamento da representação na formulação da operação de instanciamento e na própria operação de instanciamento de representação anteriormente existente:

  • formulação volta a ser reversível;
  • tempo volta a ser tempo calendário, ou tempo relativo;
  • irreversibilidades no caminho do Instanciamento da representação ocorrem em decorrência do desencadeamento dos elementos de suporte na experiência à Forma de produção.

A empiricidade objeto da operação tem exatamente o mesmo ‘modo de ser fundamental’ com que foi recuperada do repositório, isto é, pode ser ‘afirmada, posta, disposta e repartida no espaço do saber para eventuais conhecimentos e ciências possíveis’ exatamente da mesma forma como havia sido acrescentada ao repositório.

Tomando o ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades como elemento ordenador da história, durante esse tipo de operações não se faz história.

[wpforo]

espaço para discussão de conceitos

icone-MFoucault-01
Michel Foucault 1926-1984

A percepção da contaminação do pensamento com o qual pensamos, pela impossibilidade de fundar as sínteses na representação

“Eis que nos adiantamos bem para além
do acontecimento histórico que se impunha situar
– bem para além das margens cronológicas
dessa ruptura que divide, em sua profundidade,
a epistémê do mundo ocidental
e isola para nós o começo
de certa maneira moderna de conhecer as empiricidades.

É que o pensamento que nos é contemporâneo
e com o qual, queiramos ou não, pensamos,
se acha ainda muito dominado
pela impossibilidade,
trazida à luz por volta do fim do século XVIII,
de fundar as sínteses no espaço da representação
e pela obrigação
correlativa, simultânea,

mas logo dividida contra si mesma,
de abrir o campo transcendental da subjetividade
e de constituir inversamente,
para além do objeto,
esses “quase-transcendentais” que são para nós
a Vida, o Trabalho, a Linguagem.”

A nova forma de reflexão se instaura no pensamento em nossa cultura, o motor constituinte “dessa maneira moderna de conhecer empiricidades”

“Instaura-se um tipo de reflexão
bastante afastado do cartesianismo
e da análise kantiana,
em que está em questão,
pela primeira vez,
o ser do homem,
nessa dimensão segundo a qual
o pensamento
se dirige ao impensado
e com ele se articula.”

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Cap. VIII – Trabalho, Vida e Linguagem;
tópico I. As novas empiricidades

As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Cap. IX – O homem e seus duplos ;
tópico V – O “cogito” e o impensado.

  • a impossibilidade de fundar as sínteses [da empiricidade objeto da operação] no espaço da representação leva o pensamento para a epistemé clássica.
  • essa impossibilidade de fundar as sínteses implica na seleção da visão de ‘operações’ e análise de valor no exato ponto de cruzamento entre o dado e o recebido, e para a primeira possibilidade de análise de valor. 
  • a possibilidade de fundar as sínteses [da empiricidade objeto da operação] no espaço da representação leva o pensamento para a epistemé moderna.
  • essa possibilidade de fundar as sínteses no espaço da representação implica em uma visão de ‘operações’ e análise de valor antes do ponto de cruzamento acima, o que leva o modelo para a segunda possibilidade de análise de valor.
  • essa forma de reflexão que se instaura no pensamento em nossa cultura exige duas coisas: 
    • o ‘ser do homem’;
    • o impensado e sua contrapartida no espaço da representação

a percepção  dessa contaminação, dominação mesmo,
do pensamento com o qual ‘queiramos ou não‘ pensamos,
– hoje em dia, e aqui e agora –
por configurações de pensamento
com a possibilidade, e também
com impossibilidade
de fundar as sínteses – da empiricidade objeto – 
no espaço da representação
muda completamente os domínios e os lugares onde ocorrem as operações,
 as paletas de ideias ou elementos de imagem, assim como as estruturas e os relacionamentos entre eles.

A primeira pedra de tropeço
no caminho de Michel Foucault
comparações feitas por Foucault de diferentes configurações de pensamento
Uma operação, de pensamento, de produção, etc. com a paleta de ideias e a estrutura do pensamento moderno, de depois da descontinuidade epistemológica ocorrida no período 1775-1825, segundo Michel Foucault

Há diferentes modelos
que formulamos para 
visões de ocorrências 
no espaço-tempo x, y, z e t.

Ao suspeitar
da contaminação do pensamento
– do nosso, daquele com o qual queiramos ou não pensamos –
por essa impossibilidade de fundar as sínteses no espaço da representação, ele manifesta sua percepção de que de fato isso acontece em volta de nós e conosco.

Esses modelos,
diferentes em seus fundamentos,
são usados juntos
e/ou simultaneamente
no mesmo domínio e ambiente 
em um pensamento
contaminado
por duas epistemologias,
ou por duas maneiras
de conhecer
aquilo que dizemos
que conhecemos.

Existem modelos,
todos em uso atualmente,
que podem ser agrupados
em duas famílias:

  • aqueles com a possibilidade
  • e aqueles com a impossibilidade 

 de fundar as sínteses
 – da empiricidade objeto da operação-
no espaço da representação.

Essa a distinção entre modelos
  com e modelos sem essa possibilidade
de fundar as sínteses
[da empiricidade objeto da operação]
no espaço da representação,
que Michel Foucault faz sugere que analisemos os modelos de operações e de organizações existentes, isto é, nos modelos que usamos hoje, em busca de características de características, ou características de segunda ordem, pelas quais podem ser associados com o pensamento antes, depois da descontinuidade epistemológica de 1775-1825, oferecendo os necessários elementos para identificação.

A figura na coluna do meio acima mostra a configuração do pensamento (o clássico,  de antes de 1775), com a impossibilidade de fundar as sínteses (da(s) empiricidade(s) objeto da operação) no espaço da representação.

Clicando nessa figura, a animação mostrará as alterações em toda a configuração do pensamento, para levantar essa impossibilidade.

A alteração se passa no lado direito da figura. 

A primeira coisa que muda é o tipo de reflexão que se instaura. 

Como decorrência, muda toda a paleta de ideias, ou elementos de imagem; 

Muda ainda o perfil do pensamento em cada configuração: 

  • o referencial
      • a ordem pela ordem
      • dá lugar à utopia do não articulado;
  • os princípios organizadores
      • que eram Caráter e Similitude
      • passam a ser Analogia e Sucessão;
  • e os métodos,
      • que eram identidade e semelhança
      • passam a ser Análise e Síntese.

Lista de posts

inspiração & roteiro
Samuel R. de Mello

0. Influências e inspirações

0. Influências e inspirações 1 a influência de Vilém Flusser no livro ‘Filosofia da caixa preta’:  uso das funções reversíveis Imaginação e Conceituação para navegar,

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dez (10) pontos para contextualização entre Prefácio e texto do livro
'As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas'

1. A Forma de Reflexão que se instaura em nossa cultura
2. Proposição: o bloco padrão genérico e fundamental
para construção de representações
3. Princípios organizadores do pensamento de depois da descontinuidade epistemológica de 1775-1825
4. O Conceito de verbo no pensamento clássico,
o de antes da descontinuidade epistemológica de 1775-1825
5. O conceito de verbo no pensamento moderno, o de depois da descontinuidade epistemológica de 1775-1825
6. As duas sintaxes mencionadas por Foucault no Prefácio
6.1 A sintaxe que autoriza a construção das frases
6.2 A sintaxe que autoriza manter juntas
as palavras e as coisas
7. O princípio monolítico de trabalho de Adam Smith,
de 1776
8. O princípio dual de trabalho de David Ricardo,
de 1817
8.1 A importância de David Ricardo,

Nosso roteiro (Michel Foucault) e nossa inspiração (Humberto Maturana)

Fale conosco

O sistema SIPOC/FEPSC

O ontologia do sistema SIPOC/FEPSC

- História, modo de ser fundamental das empiricidades,
. o Circuito das trocas e o Lugar de nascimento do que é empírico
. Pensamento conservador e pensamento progressista

Posição relativa do par sujeito-objeto e o modelo de operações

Aquém 

história como sucessão de fatos
tais como se sucederam

História como sucessão de fatos tais como se sucederam

Diante e Além

história como alterações no ‘modo de ser fundamental’ das empiricidades

História como mudança no 'modo de ser fundamental'

Duas possibilidades de leitura de operações;
duas origens de valor (interna e externa na linguagem) para representações

Duas visões, duas leituras do fenômeno 'operações':
sob o pensamento clássico, o de antes de 1775; (seta amarela)
sob o pensamento moderno, o de depois de 1825 (seta vermelha)
com duas amplitudes - duas abrangências muito diferentes

Ciência e Tecnologia dependem da Filosofia e são funções das ferramentas de pensamento de que dispõe a configuração do pensamento utilizada em sua geração.

Os três movimentos do pensamento segundo Vilém Flusser

Usando o pensamento de Vilém Flusser:

  • Pensamento é um transformador do duvidoso em língua;
  • Filosofia, ou Reflexão, é texto produzido pelo pensamento ao voltar-se contra si mesmo para corrigir-se e renovar-se.
  • ciência, como o resultado de um movimento do pensamento em direção ao mundo, para compreendê-lo, é texto filosófico aplicado. 
  • e tecnologia, como resultado de um movimento do pensamento em direção ao mundo para modificá-lo, é texto científico aplicado; 

Descontinuidades epistemológicas refletem conquistas humanas no pensamento e são aprimoramentos na maneira que usamos para conhecer.  Há portanto uma relação entre, de um lado, o modo como colocamos em marcha nosso desejo de transformar o duvidoso em língua a cada nível, e de outro lado, a filosofia que temos, e a Ciência que temos, ou a tecnologia de que dispomos. Filosofia, Ciência e Tecnologia são funções do como como vemos o mundo e as coisas.

Michel Foucault (*) descreve uma descontinuidade epistemológica (uma alteração no modo como nos voltamos para o mundo para conhecer o que dizemos que conhecemos), e aponta com toda clareza diferentes jogos de ferramentas de pensamento ou estruturas conceituais, características de uma e de outra dessas epistemologias, de um e de outro lado desse evento. E aponta um período em nossa cultura ocidental, em que o pensamento esteve dominado por uma característica do período anterior.

A solução de questões trazidas à luz por essa nova maneira de conhecer (a nova epistemologia) não poderão ser resolvidas se correspondentes ciência e tecnologia não forem desenvolvidas também.

Pensamento conservador e progressista

Acompanhando o trabalho arqueológico de Michel Foucault em direção a essa classe especial de saberes, a esse conjunto de discursos chamado de ciências humanas, vê-se que em certo período consolidou-se um tipo de pensamento em cuja configuração a etapa de construção de novas representações foi incorporada. Antes disso, essa etapa de construção da representação nova ficava fora do escopo do pensamento, e depois disso essa etapa permaneceu definitivamente incorporada.

Para a configuração de pensamento que deixa fora do seu escopo a etapa de construção de novas representações a alternativa é conviver com tudo o que existe desde sempre e para sempre, tomando as coisas como pré-existentes e pertencentes ao Universo. Esse modo de pensar tem características de conservadorismo, enquanto aquela outra configuração do pensamento que inclui em seu escopo a geração de novas representações, as características de progressismo.

Neste trabalho algumas – bastantes – características de uma e de outra dessas duas características de configurações do pensamento foram apresentadas o que de certa forma pode ser usado para qualificar com algo mais do que a qualidade ‘conservador’ um pensamento de direita; e com a qualidade ‘progressista’ um pensamento de esquerda, delineando com mais precisão uma e outra dessas configurações.

(*) As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VIII- Trabalho, Vida e Linguagem; tópico I. As novas empiricidades

Panorama visto desde meu posto de observação

É real hoje, aqui, agora, e entre nós, a percepção – feita por Foucault – do domínio/contaminação do pensamento – ‘com o qual queiramos ou não pensamos‘ – pela impossibilidade de fundar as sínteses (do pensamento sobre a empiricidade objeto da operação) no espaço da representação(*).

Esse tipo de pensamento dominante, aquele com a impossibilidade de fundar as sínteses, é ao mesmo tempo o tipo de pensamento que não inclui a operação de construção de novas representações. E a estrutura das operações sem essa etapa reforça essa impossibilidade. Nesse contexto modelos com e modelos sem essa impossibilidade são tratados como se variações sobre o mesmo tema fossem, e não produções do pensamento completamente diferentes.

Estamos projetando e usando hoje, modelos para operações e organizações, de produção e outras, com o pensamento de exatos dois séculos atrás.

Para que isso possa ser percebido pelo projetista de modelos em diversas áreas é necessário o rompimento das condições em que se dá essa contaminação e esse domínio de uma das configurações de pensamento sobre a outra, obliterando justamente aquela que corresponde a uma conquista humana no pensamento. Para que isso aconteça é necessário que seja atendido um requisito: a construção de um critério para identificação e comparação de modelos, e sua aplicação no caso presente.

Daqui de onde vejo as coisas, é unânime a visão das coisas em termos de processo. Ninguém fala de nada além de processos: mapeia-se processos, otimiza-se processos, etc. etc. o que quer que seja, mas sempre processos. Sem que nos demos conta de como sejam as diferentes estruturas das operações em que tais ‘processos’ ocupam posição operacional. 

Michel Foucault pode fornecer os elementos necessários para a construção desse critério. Nossa intenção aqui é destacar em Foucault o que pode ser usado para o estabelecimento de uma relação pensamento – e sua aplicação na modelagem de operações em organizações. 

(*) As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VIII- Trabalho, Vida e Linguagem; tópico I. As novas empiricidades

Cronologia do evento fundador da nossa modernidade no pensamento;
linha de tempo com os períodos de contaminação do pensamento
por configurações diferentes.

uma cronologia da descontinuidade epistemológica de 1775-1825
o evento fundador da nossa modernidade no pensamento
Linha de tempo das conquistas humanas no pensamento e respectiva utilização prática

Acoplamentos estruturais do sistema descrito no LD - o Explicar com Reformular: os internos e aqueles com o ambiente externo

Diante e para Além do objeto

Acoplamento estrutural interno:
condições de possibilidade
Acoplamento estrutural interno:
pontos de acoplamento
Acoplamento estrutural externo:
parcial quando há diferenças nas estruturas
  • os domínios do Operar – retângulo vermelho; e do Suporte ao operar – domínio amarelo, que compõem o ‘Lugar de nascimento do que é empírico’ parte do ‘Explicar com ‘Reformular’ a empiricidade objeto, durante o caminho da Construção da representação, são exemplo do primeiro acoplamento interno. Acoplamento semelhante ocorre durante o caminho do Instanciamento da representação.(*)

     

  • há ainda acoplamentos externos ‘por cima’, lateralmente, e por baixo da estrutura no LD da figura nos dois caminhos o da Construção e o do Instanciamento. O acoplamento externo ‘por cima’ depende da estrutura com a qual se dará acopamento, e pode ser parcial.

Playground para projetistas de modelos: uma coleção de modelos de diversos tipos, para aplicação dos conceitos apresentados

Uma coleção com mais de duas dúzias de modelos, (*) para descobrir com que tipo de pensamento foram feitos:

  • se COM a possibilidade de fundar as sínteses do pensamento no espaço da representação; ou
  • ou se SEM a possibilidade de fundar as sínteses do pensamento no espaço da representação

(*) Proposta de metodologia para o planejamento e implantação de manufatura integrada por computador
de Bremer, C. F. USP SC fev 1995; entre outras fontes

Estruturas dos modelos, resultantes da utilização do referencial,dos princípios organizadores e dos métodos usados pelo pensamento, por segmento de modelos 

Aquém do objeto

Modelo de operações de Buffa e modelo de uma organização adaptado de Mauro Zilbovicius

Diante do objeto

Modelo de operações do Kanban e modelo de organização da Reengenharia

Além do objeto

Modelo de uma ciência humana Análise da produção como exemplo de qualquer outro modelo de ciência humana
Estrutura matricial – Quadro de categorias clássico. Utilização de várias ordens ligeiramente diferentes em um mesmo modelo de operações.
Estrutura hierárquica característica do objeto análogo composto substitutivo ao vislumbrado. Utilização de uma única ordem ao longo do modelo.
Mesmas características dos modelos para o segmento Diante do objeto, mas aqui, com um modelo constituinte combinação dos três pares constituintes das ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem.

O modelo 5W2H, de um lado, e de outro, o modelo de operações do Kanban
e o modelo proposto no LD da Figura 2: usos diferentes para as mesmas ideias
ou elementos de imagem envolvidos na formulação da proposição

Aquém do objeto

Diante e Além do objeto

Modelo Provision Workbench, da Proforma
Modelo de operações de produção do Kanban
Modelo proposto para 'uma certa maneira de conhecer empiricidades'

O exame dessas três figuras mostra que ideias, elementos de imagem, homônimos, podem ser usados de modo diferente em modelos feitos sob estruturas conceituais diferentes.

No modelo 5W e 2H no lado esquerdo acima, o destaque dado pelo losango em vermelho é nosso. Não estava na figura original. A figura é organizada por um sistema de categorias composto pelas 7 perguntas 5W2H. 

O modelo da produção do Kanban é sim-discriminativo com relação ao elemento componente do objeto da operação de produção, e é formulado como uma proposição instanciativa de um objeto previamente projetado, e portanto cuja representação foi anteriormente construída

O modelo de operações de construção de representação para empiricidade objeto (LD da figura) é feito calcado no Princípio Dual de Trabalho de David Ricardo; está evidenciada a formulação no formato de uma proposição. A origem de valor adotada está nas designações primitivas ( conjunto de operações de busca por origem, condições de possibilidade e de generalidade dentro de limites) e da linguagem de uso (o Repositório)

O pensamento de outros grandes pensadores:
John Dewey e seus dois modos de ver o mundo;
Ilya Prigogine e o conceito de caos para a ciência moderna

Diante do objeto

Ver [homem e experiência] e [natureza] vistos juntos
Os conceitos de caos, na ciência moderna;
e de Arte como a formulação com leis e eventos

As duas animações acima – a nosso ver – apenas mostram que tanto John Dewey na sua visão [homem] [experiência] e [natureza] juntos; quanto Ilya Prigogine  na sua visão do que seja caos na ciência moderna, estão pensando com uma configuração de pensamento COM a possibilidade de fundar as sínteses no espaço da representação, o que não era comum para a ciência clássica, toda reversível.

Sistema Formulador

Aquém do objeto

Modelo relacional de dados do Microsoft Project 4.0

Diante do objeto

Módulo central do Sistema Formulador

O Sistema Formulador:

É um ante-projeto de um sistema para gestão de projetos com estrutura conceitual consistente com o pensamento moderno. 
O módulo principal do sistema é uma unidade lógica que relaciona entidades envolvidas na proposição enunciadora de operações, mantidas em banco de dados, e gera sistematicamente o modelo de operações. O Microsoft Project, então, importa o modelo gerado como se fosse próprio, e a gestão continua, agora com um modelo gramaticalmente correto e criteriosamente estruturado.

Este é um ante-projeto de um sistema de gestão COM a possibilidade de fundar as sínteses do pensamento no espaço da representação; esse sistema pode evoluir para um sistema visual de gestão e outros aplicativos.

Destaque para dois modelos existentes:
1) LE, o SIPOC (FEPSC) do SixSigma; 2) LD e o Visão da PHD, da PHD Brasil
e no centro, as diferenças entre eles

Aquém do objeto

O diagrama FEPSC (SIPOC) mostrando a estrutura

diferenças

Comparação

Diante do objeto

A Visão da PHD

Comparação do modelo SIPOC ou FEPSC – SixSigma(*) com o modelo Visão da PHD(**) do ponto de vista das estruturas respectivas.
A animação central mostra o que falta – estruturalmente – ao SixSigma para ter a estrutura do modelo da direita.

(*) Gestão integrada de processos e da tecnologia da informação; capítulo Identificação, análise e melhoria de processos críticos Figura 3.1 Representação da FEPSC, de Roberto Gilioli Rotondaro
Coordenadores: Fernando José Barbin Laurindo e Roberto Gilioli Rotondaro, Editora Atlas, jan/2006
(**) A Visão da PHD, da empresa PHD Brasil

O mapa de operações de produção do Kanban;
e o mapa da organização segundo a Reengenharia

Diante do objeto

Modelo de operações
do Kanban

Modelo de operações do Kanban

Mapa da organização
segundo a Reengenharia

Mapa da Reengenharia (modificado) e comentado

Temos à esquerda, o modelo do Kanban com a referência (*) abaixo. e á direita, a Figura 7.1 do livro Reengenharia, referência (**) abaixo. São organizados sobre a proposição, e pertencem à configuração do pensamento moderno.  Você pode certificar-se  da veracidade dessas duas afirmativas neste ponto (17).

(*) Artigo ‘A comparison of Kanban and MRP concepts for the control of Repetitive Manufacturing Systems’ de:
James W. Rice da Western Kentucky University e Takeo Yoshikawa da Yolohama National University
(**) Reengenharia – revolucionando a empresa: em função dos clientes, da concorrência e das grandes mudanças da gerência 
de Michael Hammer e James Champy

Exemplos de modelos existentes, e muito usados,
nas diferentes estruturas conceituais

Aquém do objeto

Diante do objeto

Modelos de: operação de produção; e organização típica
Modelos de: operação contábil/financeira e modelo de organização
Modelos de: operação de produção do Kanban; e modelo de organização da Reengenharia

Exemplos de modelos muito conhecidos para operações e para as organizações

  • operação: Operações de produção, de Elwood S. Buffa;
  • organização: adaptação de Organização típica.
  • operação: operação contábil financeira débito e crédito;
  • organização: Ativo, Passivo e Resultados.
  • operação: modelo do Kanban;
  • organização: mapa da reengenharia.

A proposição como o bloco construtivo padrão  (Lego)
fundamental para a construção de representações

Aquém do objeto

Proposição ausente
do sistema Input-Output

Diante do objeto

A proposição no caminho
da Construção da representação

Além do objeto

A proposição no caminho
do Instanciamento da Representação

‘A proposição é, para a linguagem,
o que a representação é para o pensamento:
sua forma ao mesmo tempo mais geral e mais elementar porquanto, desde que a decomponhamos, não encontraremos mais o discurso, mas seus elementos como tantos materiais dispersos.’(*)

“A língua é
a mais complexa,
a mais milagrosa,
a mais estranha,
a mais gigantesca e variada
invenção humana.” (**)

(*) As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV – Falar; tópico III. Teoria do verbo

 


(**) Frases de Millor Fernandes

Os dois conceitos para o que seja um verbo:
verbo Processo, e verbo Forma de produção

Aquém do objeto
verbo ‘Processo

Verbo tratado como Processo

Diante e Além do objeto
verbo ‘Forma de produção’

Verbo tratado como Forma de produção

“A única coisa que o verbo afirma
é a coexistência de duas representações; 
por exemplo
a do verde e da árvore,
a do homem e da existência ou da morte. 

É por isso que o tempo dos verbos
não indica aquele em que
as coisas aconteceram no absoluto, 
mas um sistema relativo  
de anterioridade
ou simultaneidade 
das coisas entre si.”
(*)

“O limiar da linguagem
está onde surge o verbo.
É preciso portanto 
tratar esse verbo como um ser misto, 
ao mesmo tempo palavra entre palavras,
preso às mesmas regras 
de regência
e de concordância;
e depois, em recuo em relação a elas todas, 
numa região que não é aquela do falado 
mas aquela donde se fala.
Ele está na orla do discurso, na juntura entre 
aquilo que é dito e aquilo que se diz; 
exatamente lá onde os signos 
estão em via de se tornar linguagem.
(*)

(*) As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV – Falar; tópico III. Teoria do verbo

Os dois conceitos para o que seja 'Classificar'

Aquém do objeto

Classificar como uma referência
do visível a si mesmo

Diante e Além do objeto

Classificar como uma referência
do visível ao invisível

Classificar é referir
o visível a si mesmo,
encarregando um dos elementos
de representar os outros.(*)

Classificar é referir
o visível ao invisível
– como a sua razão profunda –
e depois, alçar de novo dessa secreta arquitetura, em direção aos seus sinais manifestos, que são dados
à superfície dos corpos.
(*)


(*) As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
cap. VII – Os limites da representação;
tópico III. A organização dos seres; sub-item 3

Os dois princípios filosóficos para o que seja de trabalho

Aquém do objeto
Adam Smith, de 1776(*)

Princípio monolítico de trabalho
de Adam Smith, de 1776

Diante e Além do objeto
David Ricardo, de 1817(**)

Princípio dual de trabalho
de David Ricardo, de 1817


As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas; 
(*) Capítulo VII – Os limites da representação;
tópico II. A medida do trabalho;


As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
(**) Capítulo VIII- Trabalho, Vida e Linguagem;
tópico II. Ricardo

Elementos centrais em cada formulação por segmento do espectro

Aquém do objeto
PROCESSO

Diante do objeto
Forma de produção

Além do objeto
NEXO DA PRODUÇÃO

Processo: elemento central
no modelo de operação clássico
Forma de produção: elemento central
no modelo de operações moderno
Nexo da produção: resultante da visão
SSS da organização

Em um pensamento mágico sobre a produção – nos moldes ‘varinha mágica de condão’ –  é possível desejar algo e, sem mais qualquer providência, vê-lo surgir à nossa frente depois do Plin!!! 

Num ambiente de produção real, porém, nada é produzido sem um instrumento (laboratório piloto, fábrica) com o qual instanciar esse objeto na realidade. A estrutura SSS é isso: a modelagem das operações de produção do objeto desejado juntamente com as operações de produção do objeto – distinto deste – laboratório piloto, ou fábrica, subindo um nível estrutural e impondo como elemento central o Nexo da produção

(*) As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo IV – Falar; tópico II. Gramática geral
Capítulo VIII – Trabalho, Vida e Linguagem; I. As novas empiricidades

Espaços Gerais do Saber
em cada segmento do espectro

Aquém do objeto

Diante do objeto

Além do objeto

Espaço Geral do Saber Clássico
Espaço Geral do Saber no pensamento Moderno
Espaço interior do Triedro do Saber

As mudanças nas configurações do pensamento promoveram reposicionamentos das positividades umas em relação às outras, resultando em três espaços gerais do saber.(*)

(*) As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo III – Representar; tópico VI. Mathésis e Taxinomia;
Capítulo X – As ciências humanas; tópico I – O triedro dos saberes; 
de Michel Foucault

O tempo em cada uma das faixas do espectro;
e para as diferentes etapas das operações indicadas

Aquém
do objeto
qualquer operação

Diante 
do objeto
caminho da Construção 

Diante 
do objeto
caminho da Instanciamento

Tempo no LE, em qualquer operação no sistema Input-Output, sob o deus Chronos
Tempo LD, operação no caminho da Construção da representação,
sob o deus Kairós
Tempo LD, operação no caminho do Instanciamento da representação,
novamente sob o deus Chronos

Tempo, em cada um dos segmentos do espectro, muda:

  • aquém do objeto, na estrutura input-output sob o pensamento clássico, temos um tempo relativo, ou um tempo calendário, cujo deus é Chronos;
  • diante do objeto mas no caminho da Construção da representação, sob o pensamento filosófico moderno, temos um tempo absoluto, um tempo não-calendário, cujo deus é Kairós;
  • e ainda diante, e também além do objeto, tempos um tempo que volta a ser relativo, calendário, e a soberania volta a ser a de Chronos.

O espaço dado ao homem - 'naquilo que ele tem de empírico' -
na estrutura dos modelos

Aquém do objeto

Diante e Além do objeto

Sistema clássico de pensamento:
sem espaço em sua estrutura
para os dois papéis do homem.
Os dois papéis do homem
presentes e operativos na estrutura
d'essa maneira moderna de conhecer empiricidades'

Antes do fim do século XVIII,
o homem não existia. (…)
Sem dúvida,
as ciências naturais trataram do homem
como de uma espécie ou de um gênero.”

As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas;
Cap. IX – O homem e seus duplos; tópico II. O lugar do rei

‘Na medida, porém, em que as coisas giram sobre si mesmas, reclamando para seu devir não mais que o princípio de sua inteligibilidade e abandonando o espaço da representação, o homem, por seu turno, entra e pela primeira vez,
no campo do saber ocidental’ (*)

“O modo de ser do homem, tal como se constituiu no pensamento moderno, permite-lhe desempenhar dois papéis: está, ao mesmo tempo, 

  • no fundamento de todas as positividades,
  • presente, de uma forma
    que não se pode sequer dizer privilegiada,
    no elemento das coisas empíricas.” (**)

 (*) As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas; 
Prefácio

(**) As palavras e as coisas:
uma arqueologia das ciências humanas;  
Capítulo X – As ciências humanas;
I. O triedro dos saberes

Desenvolvimento das operações
por segmento do espectro de modelos

Aquém do objeto

Diante do objeto

Além do objeto

  • no sistema Input-Output; usando uma ordem arbitrariamente escolhida;
  • e com propriedades não-originais e não-constitutivas das coisas, as chamadas ‘aparências’;
  • No sistema correspondente ao que Foucault chama de ‘essa maneira moderna de conhecer empiricidades’, que tem como elemento construtivo padrão fundamental a proposição, da qual herda as categorias de ideias ou elementos de imagem de primeiro nível;
  • e com propriedades sim-originais e sim-constitutivas daquilo que se constitui na existência em decorrência das operações.
  • No sistema formulado no campo das ciências humanas, com modelos constituintes compostos por uma combinação dos modelos constituintes das ciências que integram a região epistemológica fundamental, as ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem.
  • Nexo da operação.

Veja mais detalhes nas animações que podem ser encontradas nas páginas de detalhe deste tópico.

Funcionamento do pensamento
em cada um dos segmentos desse espectro

Antes do objeto

Diante do objeto

Além do objeto

Operação no sistema Input-Output
sobre representações pré-existentes
Operação de construção de representação não existente no repositório
Operação de instanciamento de representação pré-existente no repositório

Paletas com o conjunto completo de ideias ou elementos de imagem necessários para a formulação das respectivas imagens das ocorrências no espaço-tempo x, y, z e t ; incluindo relacionamentos entre esses elementos de imagem.(*)

(*) As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo VIII – Trabalho, Vida e Linguagem;
tópico I. As novas empiricidades, de Michel Foucault

Estruturas de conceitos em cada ambiente de formulação identificado pela possibilidade ou pela impossibilidade de fundar as sínteses no espaço da representação

Posição em relação ao par sujeito-objeto

Estrutura conceitual
para o pensamento clássico
Estrutura conceitual
para o pensamento moderno

Referencial:

  • Ordem pela ordem;

Princípios organizadores: 

  • Caráter e similitude;

Métodos:

  • Identidade e semelhança

Referencial:

  • Utopia;

Princípios organizadores: 

  • Analogia e Sucessão;

Métodos:

  • Análise e Síntese

‘Assim, estes três pares,
função-norma,
conflito-regra,
significação-sistema,

cobrem, por completo,
o domínio inteiro
do conhecimento do homem.'(*)

São essas as ferramentas de que se arma o pensamento – em cada segmento do espectro de modelos, para produzir as imagens que servem de mapas, para orientação na construção das representações.

(*) As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo X – As ciências humanas; tópico III. Os três modelos

Imaginação e Conceituação - funções humanas reversíveis:
Imagens tradicionais e Técnicas

Imagens tradicionais

Imagens técnicas

Classes de abstrações

As imagens tradicionais
Imagens técnicas, as imagens produzidas por aparelhos (computadores)
Classes de abstrações
  • Imaginação e Conceituação, funções humanas reversíveis que todos temos para codificar e decodificar imagens tradicionais e textos;
    • idolatria é o uso continuado de imagens que, quando decodificadas, não mais nos levam à visão da ocorrência no espaço-tempo x, y, z e t, isto é, imagens que não mais nos servem de guias para o mundo, mas de biombos;
    • textolatria é o uso continuado de textos que, quando decodificados, não mais nos levam às imagens que fizemos para as ocorrências no espaço-tempo x, y, z e t
  • e as Imagens técnicas, especiais, aquelas imagens produzidas por aparelhos (computadores em destaque); as Imagens técnicas exigem, para seu entendimento, uma Conceituação especial.(*)

(*) Filosofia da caixa preta: ensaios para uma futura filosofia da fotografia;
Capítulos I – A imagem; e II – A imagem técnica,
de Vilém Flusser 

Modelos constituintes de modelos
em cada uma das faixas desse espectro

Posição relativa modelo de operações - sujeito-objeto

Aquém

não há modelos constituintes nesse segmento do espectro, já que, pelos pressupostos adotados (Universo, realidade única) nada é constituído na existência em decorrência das operações feitas

Diante

modelo constituinte composto pelo par constituinte correspondente ao campo em que o modelo é formulado, tomados isoladamente em cada área: 

  • Vida (Biologia) –
    [função-norma]; 
  • Trabalho (Economia) –
    [conflito-regra]; 
  • Linguagem (Filologia)- [significação-sistema]

para Além

campo das Ciências Humanas com modelos constituintes formados por uma combinação dos três pares constituintes das ciências da Vida, do Trabalho e da Linguagem, tomados todos em conjunto em cada modelo, dada ênfase a uma das áreas das ciências da região epistemológica fundamental

(*) As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas;
Capítulo X – As ciências humanas; tópico III. Os três modelos

 

O espectro de modelos, segundo essa possibilidade de sim-fundar, ou não-fundar, as sínteses no espaço da representação: Aquém, Diante e para Além do objeto - os segmentos do espectro de modelos de visões de ocorrências no espaço-tempo x, y, z e t

O modo como Foucault descreve o problema que encontrou em seu trabalho pode ser mapeado em um espectro de modelos agrupados segundo os dois fatores por ele percebidos:  fator 1, com duas regiões quanto à fundação das sínteses na representação e com três regiões quanto à posição relativa ao objeto e ao sujeito: 
Aquém, Diante e para Além do objeto. 

Fundação das sínteses no espaço da representação

Impossibilidade

Possibilidade

Aquém

do objeto
(e do sujeito)

Diante

do objeto
(e do sujeito)

para Além

do objeto
(e do sujeito)

Fator 1 – o domínio/contaminação do pensamento com o uso simultâneo de configurações de pensamento 

  • com a  impossibilidade 
  • e também com a possibilidade,

de fundar as sínteses da representação da empiricidade objeto, no espaço da representação’; com duas regiões em um espectro de modelos:

Fator 2 – dar conta da obrigação correlativa (…) de abrir o campo transcendental da subjetividade constituindo, para além do objeto, os “quase-transcendentais”

com as seguintes regiões no espectro de modelos:

 1. região do espectro: ‘Aquém do objeto’ (na impossibilidade);

 2. região do espectro: ‘Diante do objeto’ (na possibilidade)

    • da Vida, (Biologia) par constituinte função-norma
    • do Trabalho, (Economia) par conflito-regra
    • e da Linguagem. (Filologia) par significação-sistema

 3. região do espectro: ‘para Além do objeto’, (na possibilidade) e no campo das ciências humanas, no espaço interior do triedro dos saberes.

outra região no espectro de modelos, com modelo constituinte único composto dos três pares constituintes das três regiões epistemológicas fundamentais

- A pedra de tropeço no caminho de Michel Foucault e
- Os caminhos (e alterações de rota) de Maturana

Michel Foucault
1926-1984

“É que o pensamento que nos é contemporâneo e com o qual, queiramos ou não, pensamos, se acha ainda muito dominado 

  • pela impossibilidade, trazida à luz por volta do fim do século XVIII, de fundar as sínteses [da empiricidade objeto do pensamento] no espaço da representação;
  • e pela obrigação correlativa, simultânea, mas logo dividida contra si mesma,
    de abrir o 
    campo transcendental da subjetividade e de constituir inversamente, para além do objeto, esses “quase-transcendentais” que são para nós a Vida, o Trabalho, e a Linguagem.”  (*)
Humberto Maturana
1928-

“Substituir 

  • a noção de input-output 
  • pela de acoplamento estrutural 

foi um passo importante na boa direção por evitar a armadilha da linguagem clássica de fazer do organismo um sistema de processamento de informação.
(…) Contudo é uma formulação fraca por não propor uma alternativa construtiva e deixar a interação na bruma de uma simples perturbação. (…) Frequentemente se tem feito a crítica de que a autopoiese leva a uma posição solipsista. (**)

(*) As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas; capítulo VIII – Trabalho, Vida e Linguagem; tópico: I. As novas empiricidades
(**) De máquinas e de seres vivos: autopoiese – a organização do vivo; Prefácio à segunda edição; tópico Além da autopoiese; sub-tópico: Enacção e cognição, de Francisco José Garcia Varela

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Modelo descritivo da produção clássico

Paleta de ideias ou elementos de imagem
presentes na configuração de pensamento clássico